Tempos estes…

Muitas vezes gastamos aqui o nosso tempo, eu incluído, não quero obviamente excluir a minha quota-parte, limitando a discussão a questões académico-filosóficas sobre o papel do Estado. Se a saúde ou educação devem ser mais ou menos universais, com modelos de financiamento tendencialmente público ou privado, o maior ou menor alcance da segurança social, ou grau de intervenção do Estado na economia, são questões que têm a sua importância, sem dúvida alguma, sou dos que acreditam que quanto menor o Estado, menos possível será aprisiona-lo em prol de interesses. Outros terão opiniões divergentes, mas convém não ficarmos entrincheirados na defesa das nossas posições, porque isso acaba por nos tornar a todos uns perfeitos idiotas úteis, que servem como luva a obscuras práticas que muito beneficiam uma certa classe de parasitas.

Há algumas semanas discutiu-se a contratação da sobrinha de Carlos César, presidente do PS, pela CML. O caso seria mais ou menos irrelevante, enfim, apenas mais um triste exemplo de práticas menos claras, não se desse o caso da esposa do político, o filho do político, a nora do político, o irmão do político, a cunhada do político, desempenharem, todos eles, cargos remunerados de nomeação política. Não pretendo de forma alguma afirmar que é caso único e nenhuma outra família tem tantos membros colocados aqui ou ali, porque estaria a mentir. E muito menos dizer que a prática é um exclusivo do PS, porque antes fosse, mas infelizmente não é. O nepotismo é evidentemente criticável e até democraticamente insuportável. Bem recentemente a França deu uma lição, relegando Fillon que era o principal favorito na vitória nas presidenciais, por ter empregado a família, para uma derrota humilhante, transformado até uma eleição numa vassourada à classe política em geral, venha daí o que vier no futuro…
Sem querer obviamente associar os factos em concreto, porque nada têm a ver, nos últimos dias o país deu conta que se investiu em comunicações que não funcionam, helicópteros que não voam. Uma gota de água no que tem sido o desperdício de dinheiro dos contribuintes ao longo dos anos, só que vez o elevado número de vítimas, trouxe o assunto à ribalta, ao contrário do desinteresse quase generalizado que costuma imperar no país dos brandos costumes. Muito de vez em quando alguém lá vai tendo problemas com a Justiça, normalmente não muito graves, nada que a classe no seu todo não resolva, ou não gastasse o Estado uma fortuna em advogados para os mais diversos fins, acabando ironicamente o Estado por ser o principal condenado a pagar chorudas indemnizações nos Tribunais portugueses.
Nos últimos 40 anos a ética republicana não passou da criação de castas de privilégios e privilegiados, onde os beneficiários têm sido políticos, família e amigos, sob o pretexto de serviço público, que ao público pouco tem servido, generosa e principescamente pago pelos que efectivamente trabalham, funcionários públicos incluídos. Até quando?

Comments

  1. Rui Naldinho says:

    Caro António
    Subscrevo seu artigo, com excepção da parte:

    “sou dos que acreditam que quanto menor o Estado, menos possível será aprisiona-lo em prol de interesses.”
    E discordo dessa parte apenas porque a História nos tem demonstrado que nada disso é assim. Pelo contrário. Em todas as Nações, EUA incluído, o argumento do menos Estado, só é utilizado num sentido. Ou quando interessa para alguns assuntos.
    Por ex: os EUA estão a fornecer armas a toda a força a alguns países, através das suas indústrias, onde o Estado é o financiador.
    O famoso SIRESP que é uma parceria entre o Estado e o sector privado, através do extinto BPN, negociado por Daniel Sanches na altura Ministro de Santana Lopes, que depois foi trabalhar para a SLN, este ficou com a parte de leão, é um bom exemplo de como o liberalismo na Europa e em particular em Portugal, é uma treta. O Estado quis libertar-se dessa tarefa, e comprou uma valente “merda”!
    Mas Portugal está cheio de exemplos de empresas privadas que lhe foram cair às mãos, falidas. Então bancos é um fartote.
    Por outro lado, o argumento de que no sector privado se vão buscar os melhores é outra mentira. Um patrão vai buscar alguém que é excelente, se esse alguém for da sua cor política.
    Francisco Louçã foi e é um excelente académico. Foi, tal como Manuela Ferreira Leite e Eduardo Catroga o melhor aluno do seu curso de economia. Que eu saiba os outros dois correram algumas das grandes empresas do chamado PSI 20. Louçã nunca foi convidado para nada. Qual a razão? Competência?
    Não. O problema é Louçã ter ideias políticas contrárias aos interesses de muita dessa gente, que domina o mundo financeiro. Ainda agora se viu quando foi convidado para o BdP. E sem remuneração fixa.
    Ferro Rodrigues foi colega de curso de António Borges. O socialista, foi um aluno excelente, bem melhor do que Borges. Isto dito pelo próprio António Borges. Mas o falecido dirigente do PSD andou sempre na ribalta do mundo da Finança, ao contrário de Ferro Rodrigues, cujo melhor emprego que arranjou foi o de Presidente da Assembleia da República.
    Ora António, é aqui que divergimos. Com excepção daqueles empregos muito tecnológicos ou científicos, onde o patrão aí não tem alternativa, porque pode só haver esse, pelo menos numa primeira fase, este irá sempre buscar alguém que lhe dê absoluta confiança política, e que não se oponha aos seus desígnios mesmo que desonestos.
    Imagine o Louçã como CEO da Jerónimo Martins a ver o Soares dos Santos a canalizar os lucros para um off sobre. O que lhe diria Louçã, se quisesse ser coerente com tudo aquilo que sempre defendeu.
    Portanto há gente que não interessa ao mercado, apenas porque ser-se sério é um atropelo ao liberalismo.
    O caso de Carlos César é apenas um dos milhares de casos que ocorreram nos últimos quarenta anos.
    Mas vi a Mariana Ribeiro Ferreira, filha do Jornalista António Ribeiro Ferreira, deputada municipal do CDS por Cascais, a ser contratada para presidir à Segurança Social, um lugar de chefia, depois de ter ficado mal na CRESAP, e não me recordo de tanto alarido.

    • A primeira parte ressalvei que era uma posição mais pessoal, logo com menos interesse para o post. Ainda assim considero perfeitamente justificável que Louçã tenha dificuldades no mundo empresarial, eu não o contratava para determinadas funções, o que não quer dizer que o critério de recrutamento seja político. Eduardo Ferro Rodrigues não sei exactamente as razões, mas gente do PS no mundo empresarial não falta…
      Nem as empresas contratam fora de determinado perfil para alguns lugares, nem as pessoas com determinadas convicções aceitam cargos que as coloquem em causa. Mas isto não quer dizer que o Estado tenha aqui qualquer papel a corrigir, ou que seja uma falha de mercado. Era o que mais faltava usarem dinheiro de impostos para tal…
      Obviamente os Estados Unidos no que concerne à indústria de armamento são um péssimo exemplo a seguir. Em matéria de política externa idem. Quando não entram em guerras, patrocinam as mesmas…
      Tive o cuidado de escrever que não era um exclusivo do PS, se atiraram este caso do Carlos César para a opinião pública, ainda bem, que a seguir venha o contra-ataque do PS ao PSD e CDS, porque casos não hão-de faltar. Até que seja insuportável um político com estas práticas ir a votos. Não sei o que vai acontecer em França, mas provavelmente o nepotismo generalizado que existia, terminou. Isso já é um avanço…

  2. É impossível não estar ainda de luto! por isso me espantam e me perturbam os sorrisos do nosso PM nas reuniões do Conselho Europeu, espanta-me a injeção despudorada publicidade e de futebol nas estações (em especial a pública) com os relvados verdinhos e bem regadios com água que tanta falta fazia noutros pontos do país. Tem de haver ética: a infelicidade não se celebra! Espanta-me a ligeireza com que, como Pilatos todos lavam suas mãos e a “culpa morre solteira”. A verdadeira solidariedade não é dar mais ” arroz feijão e pão” e voltarmos à nossa rotina e sorriso pepsodente, de consciência descansada “até à próxima catástrofe”, mas ter atitudes consequentes para fazer alguma coisa: desligue o ar condicionado, ande de bicicleta, lute por ciclovias, poupe água, desligue a televisão cada vez que vê futebol (Escola de crime, corrupção tráfico de influências, causa do (es)quecimento global. Mas não faltarão aqueles que me acham provinciano de ideias pequenas sem verem quão grande é a verborreia inútil em torno de uma questão que exige consenso nacional. Além disso, seja parcimonioso e cumpra o código da Estrada: não use a buzina do seu automóvel num prazer infantil de fazer barulho! Respeite os outros!

  3. Ferpin says:

    A única forma de menos estado significar menos corrupção é acabar com segurança social, saude publica, educação publica, etc.
    E esse mesmo estado não cobrar quaisquer impostos para serem comprados esses serviços a privados. Não, é mesmo acabar com isso. O estado ter exercito, policia, fisco e mais nada.
    É isso que você quer? Em 2017?

    • Paulo Marques says:

      É. Acabar com o estado e ficar dependente das bonomias de monopólios e oligopólios, porque o capitalismo nunca se engana.

      • ferpin says:

        Conclusão a tirar das palavras de Oliveira Costa do BPN em tribunal: Se em vez do siresp fosse o estado a contratar diretamente os equipamentos, incluindo o custo no orçamento tinha gasto 80 milhões em vez de 580. Como se vê, só vantagens em privatizar as coisas, pelo menos para os gajos da SLN, BPN, BES, e seus funcionários fieis, quase todos no PSD.
        ( O O.COsta declarou em tribunal, quando o atacram por causa da negociata do siresp que, atenção, não foi uma roubalheira, ainda se gastaram oitenta e tal milhões de euros)

  4. Paulo Marques says:

    Pois, a senhora invés de cumprir as regras e encontrar um emprego por concurso público devia ter emigrado para ter a certeza que estava tudo bem.
    Só o António para me fazer vir defender o Carlos César, personagem que não gosto por aí além, mas também não conheço muito.

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