O ataque aos independentes

Subitamente, donde menos se esperava, os independentes são alvo de ataque sistemático, pois passaram a ser um enorme perigo para certas organizações políticas estáticas, retrógradas, paradas no tempo, incapazes de pensar o mundo e contribuir para aquilo que é mais nobre na política que é mudar o mundo.

Os independentes passaram a ser um enorme problema, algo a combater, mesmo por aqueles que em tempos afirmavam a sua independência e respetivas virtudes. Esquecem que ser independente é uma forma de estar na vida, com convicções, claro, com opinião assertiva, claro, com ideias políticas e alinhamentos políticos, claro, sabendo bem onde se está e o que se é, claro, mas sendo livre na forma de pensar e na capacidade de o fazer.

Os independentes são um enorme perigo porque não há nada mais revolucionário do que pensar de forma livre. Francisco Sá Carneiro, um homem que tinha a vertigem do risco e viveu antes do tempo, tinha uma definição fantástica de independência. Dizia ele: “Saber estar e romper a tempo, correr os riscos da adesão e da renúncia, eis a política que vale a pena”. É sintomático que muitos, demasiados, daqueles que agora descobriram que não gostam de independentes, que têm nojo dessa forma de estar, sejam de esquerda. É sintomático, muito revelador e muito triste.

Confundir independência com falta de ideias, com ausência de raciocínio, ou até com a capacidade de gerar alinhamentos políticos vários é absolutamente insultuoso. Ser independente não é ser apolítico, assético ou ser incapaz de um posicionamento político bem marcado. Antes pelo contrário, ser independente é ter um posicionamento político bem definido, é saber muito bem naquilo em que se acredita e o que se defende como caminho para o futuro; um caminho em que se consolida a liberdade concreta, a igualdade e a melhoria da qualidade de vida de todos os portugueses. Ser independente é colocar a primazia de todo o seu esforço na esperança de poder construir o país que todos desejamos, sem nunca contemporizar com estratégias partidárias, de pequenos grupos, mesquinhas e sem dimensão civilizacional. Ser independente é colocar em primeiro lugar os factos, a realidade, e não aquilo que queremos que a realidade seja. É pensar de forma livre, procurando as melhores soluções. É ser capaz de juntar pessoas de todas as orientações políticas e mobilizá-las para uma tarefa comum, procurando interessá-las justamente através daquilo que as une e que é infinitamente maior do que aquilo que as separa.

O que me deixa muito preocupado é o facto de agora a independência ser um grande problema. Talvez aqueles que vivem de pequenos grupos e que pensam que podem falar em nome dos outros tenham percebido que a independência é o vírus que os destruirá. Talvez aqueles que habituados à pasmaceira dos partidos, que já nem gabinetes de estudos dignos desse nome conseguem organizar, estejam muito preocupados com dinâmicas independentes com capacidade de mobilização de cidadãos de várias áreas, competências e orientações políticas. Talvez tudo isto seja só essas pessoas a reagir, porque esta é uma realidade que não controlam e que não obedece aos tradicionais métodos de manipulação da opinião dos outros. O que posso recomendar, como cidadão independente que sempre fui, social-democrata por convicção, é que usem a vossa independência e, sendo filiados ou não em partidos, optem por exercer o vosso dever de pensar e debater livremente aquilo que se passa no vosso país.

Aparentemente, as várias organizações políticas estabelecidas temem a vossa independência, pelo que exercê-la talvez seja a melhor forma de contribuir para mudar o país e mundo. Da minha parte afirmo que estive e estou, sem medo, em todos os locais em que a independência seja uma forma de estar na vida e um valor essencial. Não olho a quem está, de onde veio e ao que pensa. Respeito todas as formas de pensar e todos os entendimentos sobre a realidade. Afirmo os meus pontos de vista e, confesso, não me importo nada de estar em minoria. Mas saio, de imediato, quando esse valor da independência, que confundo muito com o da liberdade, é colocado em causa.

 

Publicado no Diário As Beiras de 19 de Agosto de 2017

Comments

  1. Paulo Marques says:

    Também Isaltino, Rui Moreira, Macron, Trump, só para citar alguns, são independentes, mas nada têm das qualidades que cita.

    • Mário Reis says:

      Mas não é o Homem é sempre parcial? Mesmo os independentes são parciais, a maioria de espírito adptativo e egocentrico, de renúncia a ideais e muitas vezes lugar ao sol. De paladinos da sociedade civil, não raras vezes “escolhem os ventos” das sociedades por comerciais. Como cá ando há mais de 50 e com a experiência de ter passado por partidos e trabalhar com independentes, vejo-os mais no contexto politico e ideológico e no papel que tem vindo a assumir, como uma nova e diferente forma de renuncia à transformação social em beneficio do neoliberalismo e dos mesmos de sempre. Nenhuma originalidade portanto, quanto ao papel que a social democracia não tenha cumprido no passado.
      São as leis do mercado politico, travestidas de conveniência tática e aversão aos partidos que interessa condenar à morte cívica.

    • Mas estes que cita não passam de estrume gerado por sistema partidário caduco que vê neles um sinal que coloca em perigo a sua própria existência. Saíram dos limites da roubalheira e da pouca vergonha colocando o próprio sistema partidário em perigo, dado que este, opta por uma conveniente descrição e opacidade onde a roubalheira e o oportunismo não pode (ainda) ser tão descarado. Daí terem sido profilacticamente afastados. Um independente por mais independente que possa fazer-lhe querer, nunca poderá ser um individuo que foi corrido do sistema pelos piores motivos. Essa gente não teria lugar na sociedade se porventura não houvesse eleitores ao seu pior nível.

  2. Rui Naldinho says:

    Muito bom.
    Jà agora, uma das grandes “virtudes” dos independentes, é que fazendo asneiras, cometendo erros, afinal, eles são humanos como os outros, serão logo punidos sem apelo nem agravo pelas entidades competentes, que possessas de raiva, por tal ousadia, escrutinarão até a cor das meias, ou quem paga o almoço na tertúlia do qual faz parte.
    Contrariamente os não independentes, filiados nos grupos de pressão do costume, cercados caninamente pela sua matilha de boys, cerrarão fileiras para que este seu exemplar não seja beliscado pelos Órgãos de Soberania, incluindo Justiça, ou mesmo pelo eleitorado.
    Contudo, não convém confundir independentes, que os há, e são muito bem vindos, com ex reclusos ou condenados, transformados agora em “recorrentes frequentes”!

  3. ganda nóia says:

    a ágata é independente apoiada pelo cds, perdão, pelo PP?

    parece que ela diz que as prioridades são a prioridade.

  4. Ernesto Martins Vaz Ribeiro says:

    Eu estou completamente de acordo com a definição de Independente que aqui deixa.
    Completamente de acordo.
    A minha dúvida não está na definição de Independente, mas na qualidade das pessoas que dizem independentes.
    O que tenho visto – até agora sem excepções – são uma espécie de “envergonhados dos partidos” que se pretendem afastar deles não pelas ideias, mas pelo que as pessoas pensam dos partidos. E, num repente, tornam-se independentes.
    Dito de outra forma, o meu receio está em poder ter nos ditos independentes agentes encapuçados que servem os partidos, mas passando a imagem de independente.
    Há tempos vi um conhecido independente a dizer cobras e lagartos sobre o apoio que um partido da nossa praça lhe manifestou. Mas esse mesmo “independente” havia recebido apoio de um outro partido uns meses antes e, nessa altura, nada disse.
    Destes “independentes” estou eu farto.
    O problema está justamente nos políticos, classe que a nossa vivência nos habituou a marcar distância, exercer vigilância e sobretudo a desconfiar, dada a sua prática continuada de desmandos.
    Pode ser que me engane, mas para já, estes independentes, para mim, vêm todos de carrinho … independentemente de assinar por baixo a sua reflexão.

  5. Ferpin says:

    Bla bla blá, que é verdade, por exemplo a ver o que diz o PSD do Rui Moreira, se o PSD e o CDs forem de esquerda.
    Se não, não é uma questão de esquerda/direita, mas dos mamões instalados contra os que aparecem a abanar a arvore
    Mas, isso o autor, provavelmente devido a palas, não consegue ver.

  6. Ferpin says:

    Pode o autor do artigo explicar que tipo de Social-democrata é?
    É que eu também me considero Social-democrata, e Desconfio que a nível de defesa da saúde, educação publica, segurança social, e muito mais, você estará muito à direita de mim.
    Só para rematar, ser sócio do PSD não quer dizer que se é Socialdemocrata. Aquilo é um albergue espanhol, do centro à extrema direita tem lá de tudo

  7. Só antigos legionários says:

    Ora aí está alguém que diz o que é o PSD !
    Cá por mim, só vejo antigos PIDE’s….

    • Eu disse que era do PSD? Onde? Lembro-me só de dizer que era social-democrata.

      • Rui Naldinho says:

        Aliás, alguém que se assuma hoje como social democrata, dificilmente estará no PSD. A não ser que esteja já senil. Mesmo no velhinho PSD, de Sá Carneiro, houve muito boa gente da direita que se respaldou aí por conveniência. E até no próprio PS.
        A verdade é que nas últimas décadas a Social Democracia tem sido muito mal tratada. Faz-me lembrar as Barrigas de Aluguer! Quem der mais, é que pode procriar naquela barrigudinha de empréstimo.
        Coisas do liberalismo!

  8. ze pagante says:

    A democracia faz-se com PARTIDOS POLÍTICOS, não com “independentes”. É dever dos eleitores, escrutinar se os eleitos são idóneos. O que acontece é que se vota no mesmo partido há 40 anos sem que se “limpem” os desonestos, corruptos incapazes, etc. que por lá andam a ser eleitos.

  9. José Marques says:

    A democracia faz-se com as pessoas. E as pessoas podem rever-se em partidos tal como os conhecemos ou em grupos de pessoas, que se agrupam, quando os partidos que existem para nos representar passam a ser apenas de alguns. E às vezes de bem poucos.

  10. joão lopes says:

    mas independente de quê? de umpartido politico,do poder dos media,ou das promessas que não cumprem? mas sejam independentes,e rapidamente(demasiado,até,basta ver o trump) passam a dependentes do deus dinheiro.

  11. Excelente texto.

  12. sobre liberdade…

  13. JgMenos says:

    Sem que na função pública haja o primado do serviço público e da competência profissional, sempre aos cargos electivos está associado um arrebanhar de quadros e clientelas que dificilmente pode organizar-se fora do quadro dos partidos.
    A independência da função pública é condição de independência das candidaturas.
    De outro modo, a norma é serem querelas ou estratégias partidárias.

  14. ZE LOPES says:

    Eu gosto muito de independentes. Até acho que cada português devia ter um independente.

    Coitadinhos dos independentes, que tão atacados são!Posso testemunhar! Ontem resolvi dar um passeio à noite, e foi horrível: os passeios, as praças, as avenidas pejadas de independentes estendidos no chão. inclusivamente vi alguns pisados por militantes partidários brandindo bandeiras e pendões, com ar triunfante, semelhante ao exibido pelo emérito independente Juán Carlos I na célebre caçada ao elefante.

    Agora mais a sério, se é possível: não é mais que pura arrogância considerar que quem quer, por sua LIVRE e INDEPENDENTE vontade de miltar numa organização política – partido, ou outra – é menos “independente” do que quem lá não queira estar. E que possa existir uma estratégia de combate aos “independentes”.

    Como no melhor pano cai uma independente nódoa, resolve citar Sá Carneiro. Pois fique sabendo que Sá Carneiro, mal se apanhou no poder por via da tenebrosa AD, tratou logo de engendrar uma lei eleitoral que eliminasse do parlamento os partidos de esquerda, por via de uma redefinição arbitrária dos circulos eleitorais. Valeu a oposição e, mais tarde, o veto de Ramalho Eanes..E já não vale a pena falar no assalto ao aparelho de Estado e à perseguição permanente aos militantes de esquerda.

    Sendo V. Exa. um social-democrata sem partido, não me admira que o persigam…os “social-democratas” com partido.Só lhe resta unir-se a outros social-democratas sem partido para…formar uma “união” de social-democratas independentes, ou seja…um partido…

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