Primeira, segunda e marcha atrás

Imagem: Dr. Drodd Graphics

Comece pela tónica, passe à quarta, continue na quinta de sétima e volte à tónica. Ou como se diz na gíria musical, primeira, segunda e marcha atrás. Falamos de acordes e das fórmulas para escrever canções. Numa melodia em Dó Maior seriam Dó Maior, Fá Maior e Sol Maior de sétima os acordes em causa.

Existem outras receitas bem conhecidas e, ainda mais, usadas. De facto, muito do cançonetismo por elas passa, independentemente da sua popularidade e origem. Não é uma melodia complexa que garante o sucesso, tal como uma melodia simples não está necessariamente condenada ao fracasso – que o diga quem analise Zeca Afonso. Há muito para além das palavras e das notas nas canções, tendo a interpretação um papel determinante na conquista do podium.

O assunto do plágio no campo da música não é novo e tem muitos exemplos amplamente conhecidos, alguns com casos ganhos em tribunal, tal como aconteceu com Led Zeppelin e com Radiohead. No primeiro, o tribunal decidiu que o tema Stairway to Heaven, dos Led Zeppelin, era um plágio da obra “Taurus”, interpretado pela banda Spirit. No segundo, a decisão foi que a canção Creep, dos Radiohead, foi plagiada a partir da composição “The Air That I Breathe” do grupo The Hollies. Ouvido com atenção, notam-se algumas semelhanças, tal como acontece em qualquer música que use alguma cadência de acordes suficientemente batida. E se as há aos rodos. Recorrer a meia dúzia de acordes banais, e é de sublinhar a banalidade na generalidade das canções, pode ser considerado plágio? Parece que há quem ache que sim.

E depois, há o caso Tony Carreira. Em algumas canções, a cópia é óbvia, indo ao ponto de ter trechos de melodia iguais e letras semelhantes. Desconheço se foram licenciadas, mas parece que ninguém apresentou queixa. Constatamos que temos um Ministério Público (MP) capaz de tecer considerações musicais e, até, de constituir um processo no qual se esmiúçam particularidades das obras de  Rudy Perez, Maria Graciela Galan, Joaquin Galan Cuervo, Hervé Vilard, Henri Didier René e de Tony Carreira. Curioso conhecimento musical, sem dúvida. Mas a questão mais inesperada de todas é perceber porque razão o MP decidiu abrir este processo quando ninguém se queixou. Não é que não o possa fazer, mas não terá nada de mais importante para investigar? Interessante.

O que irá o nosso Ministério Público a seguir investigar? Irá ele analisar se o tema “Anita” de Marco Paulo é um plágio da canção homónima de Costa Cordalis? Ou se o “Vinho Verde” de Paulo Alexandre plagia o “Griechischer Wein” de Udo Jürgens? Aguardemos. Ao menos, vamos tendo música enquanto esperamos por alguma condenação no campo da corrupção.

Comments

  1. Nefertiti says:

    De acordo. Mas as as comparações finais são infelizes. Marco Paulo sempre fez assumidamente versões de temas alemães. Tantas vezes que o produtor Mário Martins o dizia em entrevistas de televisão acerca do seu produzido. O mesmo se passa com Vinho Verde que sempre foi dado como uma tradução e tem até versões em várias línguas. O mesmo com canções como por exemplo She ou My Way. Mas não será o que se passa aqui, de acordo com o MP. Por outro lado, Carreira diz haver acordos e questões já derimidas no passado.

  2. Fernando Manuel Rodrigues says:

    Acho que o j. manuel cordeiro tem razão. Aliás, já o tinha dito aqui mesmo, em comentário a outro post. Independentemente das questões éticas e artísticas, com as quais estou de acordo, isto está longe de ser um crime publico, e a questão só diz respeito aos detentores dos direitos das obras originais (a não ser que exista uma CIG para investigar a produção musical também). Há, de facto, questões bem mais importantes com que o MP se deve preocupar.

    Este é, de facto, um não assunto, ao qual se está a dar demasiada importância. E vai ser resolvido fora do tribunal, por acordo, estou certo disso.

    Por outro lado, tem havido algumas condenações por plágio que são autênticas anedotas. Uma delas aconteceu ainda recentemente nos EUA (não me recordo agora quem eram os envolvidos, mas o autor original da obra que fundamentava a queixa até já está morto, e a acção foi movida pelos herdeiros).

    Sei que, na altura, ouvi a canção mais antiga e a actual, e decididamente, não achei que os queixosos tivessem razão.

    • Paulo Marques says:

      Os direitos de autor duram a vida do autor + 70 anos, graças à Disney e à Cher. E não me parece que a Disney não consiga outra extensão em breve, uma vez que o Steamboat Willy, em si um plágio, está quase no limite.

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