Crónicas do Rochedo – XXI :: Referendo da Catalunha, E se D. Afonso Henriques…

CATALUNHA
Aos olhos de alguns, muitos, que analisam o problema da “legalidade” do referendo da Catalunha imagino o que passou D. Afonso Henriques…
 
Aos 14 anos, armou-se a si próprio cavaleiro (uma ilegalidade, tendo em conta as regras da época). Não satisfeito, luta contra a sua mãe e vence em 1128 a famosa Batalha de S. Mamede e declara o Reino Portucalense como independente (sem referendo, coisa que à época não era costume), contrariando todas as leis vigentes (de Castela, diga-se). Em 1139 vence a Batalha de Ourique e afirma-se como Rei de Portugal, contrariando as leis da época – podemos considerar as batalhas como uma espécie de “referendos” de hoje? Só mais tarde, em 1143 é que Castela aceita a independência (Tratado de Zamora) e só em 1179 a Santa Sé reconhece o Reino de Portugal. Ou seja, se a coisa dependesse do cumprimento das leis soberanas de Castela (e Leão) ainda hoje andava a malta a discutir a realização de um referendo cumpridor da Constituição de Espanha, para que, cada um dos habitantes deste pedaço de terra, chamado Portugal, fosse um país soberano e independente. É isto, em resumo, que defendem os actuais legalistas, certo?
 
A escolha dos habitantes da Catalunha só pode ser feita através de um referendo (as batalhas caíram em desuso). Um referendo livre e democrático. Se votam a favor da independência ou contra ela é uma decisão de cada um dos eleitores do respectivo território, a Catalunha . Querer fazer depender disso o cumprimento integral do disposto na Constituição de Espanha é uma aberração política. O mesmo se aplica, obviamente, a outros povos na mesma situação (dentro e fora de Espanha).
 
Ver tantos portugueses a referir-se ao referendo da Catalunha como uma violação dos preceitos jurídicos de Castela (desculpem, de Espanha) é, no mínimo, de ir às lágrimas…

Comments

  1. Ouvir portugueses indignados, oriundos do único reino que se separou de Castela, contra o referendo catalão, faz-me lembrar os tempos do referendo português à regionalização (que até sempre esteve na Constituição) e em que muitos ilhéus votaram em massa contra a regionalização…. como se eles mesmos já não estivessem em regiões autónomas! Lógica da Batata?

  2. Orlando Sousa says:

    De Castela nem viúva nem donzela!

  3. Ernesto Martins Vaz Ribeiro says:

    A lei pode ser má, mas o seu não cumprimento é socialmente reprovável, seja esse não cumprimento o não respeito por uma Constituição, ou o não respeito de uma lei que proíbe o tráfico de influências ou o peculato e que não é cumprida.

    Portanto concluo que o facto de andarem a monte verdadeiros bandidos que nos depenaram, justamente porque não cumpriram a lei, também deve merecer o mesmo comentário por parte do articulista, sendo de “ir às lágrimas” ao ver a contestação por parte daqueles que pugnam por um quadro legal.

    É por essas e por outras que temos Isaltinos e quejandos que nos vão governando e outros com pulseira electrónica a gozarem as suas chorudas reformas e com as suas fortunas num qualquer Offshore. Estes também “vão às lágrimas”, mas é de gozo.

    A questão dos preceitos jurídicos ( e não só os de Castela) por ser uma questão legal, tem como única forma de resolução, o debate sério que permita criar um novo quadro legal que sirva os contendores. E essas conversações não se fazem, nem com cargas policiais, nem com atitudes de autodeterminação unilaterais. Os problemas devem ser discutidos numa sociedade cordata, com gente civilizada (o que me não parece ser o caso) e em sede própria.

    O problema é que estão frente a frente dois galos na mesma capoeira (para já). Um tem tiques franquistas e o outro, tiques de Schaubble, pois é justamente com a aplicação da “fórmula Schaubble” – que já foi dirigida aos Portugueses (1), não esqueçamos – que se refere aos “outros” espanhóis de uma forma prepotente.
    E é isso que se devia pedir: diálogo entre as partes beligerantes. Este estado de guerrilha é que não não interessa a ninguém e, tal como está, não tem solução, porque os contendores se não ouvem.

    (1) – espero que nessa altura o caro Fernando Moreira de Sá não tenha ido às lágrimas…

  4. …”A escolha dos habitantes da Catalunha só pode ser feita através de um referendo (as batalhas caíram em desuso). Um referendo livre e democrático…”
    Fernando Moreira de Sá, de todo concordamos consigo , nós os bem informados e justos e inteligentemente sensatos e realistas ! Bem visto o seu texto/análise !
    Sabendo-se da complexidade da questão, Rajoy bem que deu um tiro no pé usando a força policial e violência

    • Ernesto Martins Vaz Ribeiro says:

      Desculpe cara Isabela, mas não resisto a comentar a sua tirada:

      “(…) nós os bem informados e justos e inteligentemente sensatos e realistas (…),

      Considerando que tenho uma opinião diferente da sua, não lhe respondo à letra sobre o ” (…) justos e inteligentemente sensato e realistas(…)” porque me considero exactamente isso: Justo e e inteligentemente sensato e realista, ao ponto de não vir aqui maltratar quem não pensa como eu.
      Mas não resisto a dizer-lhe que presunção e água benta, cada qual toma a que quer.
      Cumprimentos.

      • ,,,se alguém sendo bonito diz que é bonito, isso não significa que esteja a maltratar os feios : D

        • Ernesto Martins Vaz Ribeiro says:

          🙂 Prefiro continuar a ser “Justo e inteligentemente sensato e realista” não me referindo à beleza pessoal (sou Ernesto e não Narciso) nem à da cara Isabel, mas apenas e só porque não tenho o prazer de a conhecer 🙂

      • Não se esqueça que Fernando Moreira de Sá executou uma conspiração digital para levar o tonto Passos Coelho ao POTE. A tese de FMS já correu mundo e ele tem muitas credenciais para por os beligerante na ordem. Felizmente as coisas voltaram ao seu lugar. e foi apenas uma ovelha dizimada..

        • Ernesto Martins Vaz Ribeiro says:

          Cara Lídia Drummond.
          Desconheço a situação que relata.
          Limitei-me, num espaço que muito prezo pela sua liberdade, deixar uma opinião que refere tão só e apenas a necessidade de criar uma ponte de entendimento, via diálogo, num complexo caso como este, que tem séculos, em vez de apelar a referendos ou cargas policiais.
          Foi tão só isso que, democraticamente, referi.
          Cumprimentos.

  5. Paulo Marques says:

    A legitimidade da autodeterminação não tem nada a ver com legalidade da mesma, e os casos reais só na última década ou duas deviam chegar para elucidar quem gosta de imperialismos.
    Quando à Catalunha em si, também não é preciso estudar muito para perceber que a legitimidade da constituição também não é grande, independentemente dos exageros e jogos políticos de algumas pessoas. Nem era assim tão grande o desejo de independência, mas Rojoy suicidou a pouca legitimidade boa vontade que reclamou, e esperemos que seja o primeiro de muitos autoritários a fazê-lo nas mais variadas questões.

    • Paulo Marques says:

      * a pouca legitimidade e a boa vontade que reclamou

      • Ernesto Martins Vaz Ribeiro says:

        Caro Paulo Marques:
        Uma Constituição será sempre legítima, a menos que se revogue… ou reveja, mas em todo o caso nunca desaparecendo. Não será por uma razão qualquer que lhe chamam a “Lei fundamental”.
        Admito que possa ser injusta, nomeadamente a espanhola e isso, não está em discussão. Agora que é legítima, tem que o ser, senão era a bandalheira generalizada.
        O mundo muda e os conceitos também. O que me parece é que se fez marcha atrás e se voltou à Idade Média.
        Estou completamente de acordo consigo, porque conheço muito bem a Catalunha. Rajoy enterrou de vez um processo que se queria pacífico, acordando um leão adormecido.
        É o que dá quando os políticos não dialogam.

        • Paulo Marques says:

          Há mais do que uma definição de legitimidade, e a mais comum é misturar o conceito com legalidade. Não é o meu, há valores humanos mais altos do que as leis.

          • Ernesto Martins Vaz Ribeiro says:

            Não misturo conceitos nenhuns, apenas tenho como certo que estamos numa sociedade governada por leis, sendo a legitimidade e a responsabilidade algo que, numa sociedade democrática e livre, decorrem desse facto.
            Quanto aos valores Humanos, completamente de acordo consigo, mas isso só acontecerá quando o Homem for capaz de respeitar a sociedade e a si mesmo , algo que só aconteceria numa hipotética. sociedade Anarquista (no bom sentido, entenda).
            O problema real e actual é a sociedade vem a ser governada por pessoas tipo Trump, Rajoy, Kim e até Isaltino, imagine …
            Quer falar em valores humanos a esta gente?
            Cumprimentos.

        • Diogo Ferreira says:

          Felizmente o 25 de Abril violou a Constituição vigente. O povo é soberano. Felizmente para nós, em 1640 quem venceu os espanhóis foi Portugal, e infelizmente na mesma altura a Catalunha perdeu, se tivesse sido ao contrário éramos nós que estávamos agora a lutar pela Independência, se necessário até à dentada.

  6. Se é verdade que a única forma de decidir se a Catalunha se separa ou não de Espanha é um referendo entre os catalães, não o é menos que uma secessão é um assunto demasiado sério e com consequências demasiado perenes para ficar ao sabor de maiorias conjunturais, como aconteceu no UK (onde se continua a pedir mais um referendo). No mínimo, deve exigir-se uma maioria qualificada de 2/3 (talvez até de 3/4) para garantir que corresponde verdadeiramente a um sentimento generalizado da população.
    Não me parece que num referendo “a sério” houvesse 90% de catalães a querer a independência. É possível que houvesse 2/3, mas mesmo isso não tenho a certeza.
    E é preciso não esquecer que não é só a independência que os catalães pretendem, mas também uma mudança de regime para uma república, que fartos de contos de reis e princesas (que têm de suportar mesmo nunca os tendo escolhido) andam eles.

    • Rui Naldinho says:

      Todas as maiorias são conjunturais, a não ser que se esteja perante uma ditadura.
      A ideia de que o referendo feito no Reino Unido sobre o Brexit, não é válida, apenas porque a maioria qualificada, não teve dois terços de “OUT”, só pode ser encarada por aqueles que têm um enviesamento do regime democrático. Desse o referendo um resultado diferente, e já ninguém discutiria a sua legitimidade democrática. Daí os ingleses, a democracia mais antiga da Europa, respeitarem os valores democráticos, mesmo sem estarem escritos. Coisa rara, no planeta.
      Contrariamente, a Espanha sempre viveu com os seus fantasmas, e dali nunca sairá a não ser empurrada por outros. As instituições espanholas ainda estão dominadas por uma lógica franquista . Neste caso, são as instituições internacionais que devem obrigar a Espanha a aceitar um referendo, e só aos catalães. Em especial aquelas que estão sempre dispostas a caucionar uma nova independência nos ex países da cortina de ferro, nos Balcãs, ou no mundo islâmico. Ou há coerência, ou então a democracia existe apenas em função das agendas imperiais de cada grupo de pressão, num determinado momento.
      A chamado “mundo cristão”, na Península Ibérica, sempre teve quatro reinos. Navarra, Castela, Aragão e Portugal. Existiram mais, mas sem uma identidade cultural e nacionalista bem vincada, face aos anteriormente referidos. Basta dizer que a Galiza é a região de onde saíram Franco, Fraga Iribarne e Rajoy. Mas também uma grande parte das elites do PP.
      por exemplo, a língua é um dos fenómenos mais evidentes, desse nacionalismo e dessa identidade cultural. O Basco, o Catalão, o Castelhano e o Português.
      A conjuntura política no século XVI e parte de Século XVII proporcionou a Castela, primeiro com os reis católicos, e depois com os Filipes, em especial Filipe IV de Espanha, III de Portugal, criassem um reino com dimensão territorial e económica, capaz de competir com a Inglaterra e a França. O reino de Espanha. E não fosse a riqueza e o fausto, criado pelos descobrimentos marítimos, desde a escravatura às riquezas chegadas ao reino, no período renascentista, que abafaram em parte os nacionalismos, e hoje nem sequer estávamos a falar deste fenómeno Catalão.

      • Quando falei em questões conjunturais referia-me a questões de curto prazo. Num referendo em que o “sim” à independência ganhe por 51%-49%, o que garante que os 2% que determinam a secessão não tenham votado “sim” apenas por simpatizar com um governo regional que o defende / antipatizar com um governo regional que o condene, ou simplesmente com os rostos que defendem cada uma das posições? O que garante que passados seis meses as proporções não ser invertessem sem que, nessa altura, fosse possível reverter o processo? Deve haver democracia nas decisões num sentido mas não no outro?
        Se é necessária (e bem, a meu ver) maioria qualificada para alterar a Constituição (por pequena que seja a alteração), porque não haverá de ser para uma alteração ainda mais profunda na vida de um povo como é uma secessão?

  7. JgMenos says:

    «as leis vigentes (de Castela, diga-se). » …de Leão, diga-se.

    Quando de autonomia quer passar a Estado independente melhor seria que começasse por dizer ao que vem a partir de uma representação parlamentar independentistas que não fosse nem escassa nem dúbia quanto a quem e ao que representa.
    Não se conhece nenhum plano sobre a independência e sobre a UE que tenha princípio meio e fim.
    Tudo se aproxima demasiado e politiquice de chefinhos de duvidosa valia.
    Tudo muito geringonço…

    • ZE LOPES says:

      V. Exa., ao pequeno-almoço, alimenta-se de vírgulas, não é? Apanhe uma linguastrite e depois desculpe-se com a geringonça!

  8. Pedro Soares says:

    Isso mesmo, se não fosse a revolta da Catalunha em 1640 Portugal não tournava se outra vez um estado independente.

  9. De ir às lágrimas é o seu post que quer fazer igual o que é diferente. Numa coisa diz bem em chamar a idade média: o governo catalão actual é a expressão de uma oligarquia feudal. Comparar as lutas pelo poder, de autocratas seus familiares da época medieval com um regime constitucional democrático onde as minorias podem e devem ser protegidas é de ir às lágrimas. Comparar a Espanha de hoje com o poder imperial de Castela é de ir às lágrimas. Ressuscitar o fantasma de Franco, um galego, è de ir às lágrimas. As revoluções fizeram-se e fazem-se contra poderes discricionários e não democráticos. Violar uma constituição que todos referendaram, repito todos, não é fazer uma revolução, é trair o voto popular e democrático. Ver a extrema direita e a esquerda catalã no mesmo lado da barricada, é de ir às lágrimas. A quem interessa uma Europa desunida e fraca pronta a ser oferecida de bandeja aos interesses de Putin, do Islão e da China? Quando é que a Esquerda vai perceber que a Rússia já não é o seu farol? Foram as patetices, fraquezas e desuniões da esquerda quem pôs o galego Franco no poder. Abaixo a extrema direita e as esquerdas que lhe vão a reboque buscando nacionalismo serôdios e medievais.

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