E agora Catalunha? E agora Espanha?


Obviamente que a declaração de independência da Catalunha é ilegal. Nem vou perder tempo afirmando que deploráveis regimes ou ditadores subjugaram povos ao longo da História, tudo dentro da mais estrita legalidade. Fico-me pelos processos secessionistas, mais comparáveis à realidade catalã actual. George Washington e seus pares rebelaram-se ilegalmente contra a Coroa britânica, sem que alguém possa afirmar que o império britânico colonizou as terras ou subjugou aquele povo, verdade que existiam os nativos americanos e escravos, mas não foram estes que lutaram pela independência americana. O mesmo se pode dizer do Brasil, cuja declaração de independência foi ilegal à luz do Direito português. E se quisermos ficar pela Península ibérica, a restauração de 1640 foi um acto de rebelião, completamente ilegal.

Bem sei que a independência da Catalunha pode abrir um precedente na Europa, mas a desintegração da Jugoslávia a par do fim do império soviético não levaram ao nascimento de países que nunca foram independentes? Que critério foi cumprido pelo Kosovo, que não possa ser aplicado à Catalunha, à luz do Direito internacional?
Não está em causa a inabilidade política de Carles Puidgemont e seus pares, nem tão pouco o facto de ter como parceiros de coligação gente muito pouco recomendável politicamente, a democracia é como é, ganha legitimidade quem obtém os votos. Concordo que o ideal teria sido realizar um referendo dentro da legalidade, mas a Constituição espanhola não o permite, nem os principais partidos se mostraram até agora disponíveis para alterar a Constituição nesse sentido. Aqui chegados, o governo pode aplicar o artigo 155 e promover eleições. Mas estas não serão normais eleições para decidir quem governa uma região autónoma, porque estão transformadas desde já num plebiscito à declaração de independência ontem proclamada pelo parlamento regional. Se o povo catalão votar maioritariamente nos partidos que abandonaram a sala e que estão contra a independência, assunto arrumado, a Catalunha voltará a ser uma região de Espanha. Mas o que acontecerá se os partidos independentistas virem reforçada a votação? Neste momento o processo de independência já não está nas mãos dos independentistas nem sequer do governo de Madrid. O rei já vimos que é uma carta fora do baralho neste processo. A independência tem custos? Seguramente que sim, isolamento político, pelo menos numa fase inicial, dificuldades económicas avistam-se no horizonte. Mas será uma decisão dos catalães no próximo dia 21 de Dezembro que ditará o desfecho final, porque Madrid não terá condições para enfrentar a vontade dos catalães se esta for inequivocamente expressa nas urnas.

Comments

  1. ZE LOPES says:

    Tem piada! Quando foi da independência do Kosovo não me lembro de ninguém a perorar “E agora Kosovo?”.

    Aliás, quando a múmia que fazia de ministro dos Negócios Estrangeiros da época resolveu que estava na hora de reconhecer a independência do Kosovo deu como justificação que “os países que ainda o não tinham reconhecido não o tinham feito por razões internas” (cito de cor). Razões essas que “não existiam em Portugal”. Por isso, toca a reconhecer, como se as razões desses países, por serem internas, não fossem respeitáveis…Pergunto, então: por que razão a Espanha não reconheceu essa independência?

    E pergunto mais: haverá alguma razão interna que possa impedir que qualquer país venha a reconhecer a independência das Berlengas? Não creio!

    E pergunto ainda mais: existe alguma razão interna que impeça o reconhecimento da Catalunha? Qual? (Não vale dar justificações como “os principais partidos estão contra ou os nossos principais parceiros internacionais não o fizeram”.Embora me apreça que esse é o único critério para que se reconheça ou não uma independência unilateral.

    • ZE LOPES says:

      Na última frase, obviamente é: “Embora me pareça (…)”

  2. Rui Naldinho says:

    Excelente artigo.

  3. Fernando says:

    E por falar de genocídios que por norma nunca são referidos pelos crentes no capitalismo e excepcionalismo americano.

    “…verdade que existiam os nativos americanos e escravos…”

    Os verdadeiros americanos foram chacinados pelos excepcionalistas europeus e seus descendentes porque não tinham acesso à tecnologia que permitiu os europeus dominar o mundo e chacinar e escravizar milhões.

  4. Já que falam do Kosovo… Peguem lá uma prenda memorial!

    United Nations A/RES/63/3, 8 October 2008

    “Request for an advisory opinion of the International Court of Justice on whether the unilateral declaration of independence of Kosovo is in accordance with international law”

    “Is the unilateral declaration of independence by the Provisional Institutions of Self-Government of Kosovo in accordance with international law?”.

    Quem foi ouvido?

    Muitos, mas a parte divertida é a seguinte:

    “14. In the course of hearings held from 1 to 11 December 2009, the Court heard oral statements, in the following order, by:

    for the authors of the unilateral declaration of independence:
    Mr. Skender Hyseni, Head of Delegation;
    Sir Michael Wood, K.C.M.G., Member of the English Bar Member of the International Law Commission, Counsel;
    Mr. Daniel Müller, Researcher at the Centre de droit international de Nanterre (CEDIN), University of Paris Ouest, Nanterre-La Défense, Counsel;
    Mr. Sean D. Murphy, Patricia Roberts Harris Research Professor of Law, George Washington University, Counsel.

    Aqui estão os “kosovares” que são os autores da declaração de independência do Kosovo!

    Mas não importa!

    O divertio é o que declara o tribunal:
    A. General International Law
    79. During the eighteenth, nineteenth and early twentieth centuries, there were numerous instances of declarations of independence, often strenuously opposed by the State from which independence was being declared. Sometimes a declaration resulted in the creation of a new State, at others it did not. In no case, however, does the practice of States as a whole suggest that the act of promulgating the declaration was regarded as contrary to international law. On the contrary, State practice during this period points clearly to the conclusion that international law contained no prohibition of declarations of independence.
    “.

    A great many new States have come into existence as a result of the exercise of this right. There were, however, also instances of declarations of independence outside this context. The practice of States in these latter cases does not point to the emergence in international law of a new rule prohibiting the making of a declaration of independence in such cases.“.

    The exceptional character of the resolutions enumerated above appears to the Court to confirm that no general prohibition against unilateral declarations of independence may be inferred from the practice of the Security Council.“.

    84. For the reasons already given, the Court considers that general international law contains no applicable prohibition of declarations of independence. Accordingly, it concludes that the declaration of independence of 17 February 2008 did not violate general international law.“.

    Mas a DIVERSÃO CONTINUA…

    The Court thus arrives at the conclusion that, taking all factors together, the authors of the declaration of independence of 17 February 2008 did not act as one of the Provisional Institutions of Self-Government within the Constitutional Framework, but rather as persons who acted together in their capacity as representatives of the people of Kosovo outside the framework of the interim administration.

    fonte:http://www.icj-cij.org/en/decisions/advisory-opinion/2010/2010/desc

    E para concluir a DIVERSÃO:

    “Written Statement of the United States America of April 17, 2009, submitted to the same UN International Court in connection with the hearings on Kosovo. “Declarations of independence may, and often do, violate domestic legislation. However, this does not make them violations of international law.”.

    Pena que os catalães não pediram ajuda aos Democratas americanos!

    Resumindo: Se os cromos da Catalunha querem mesmo ser independentes e republicanos só têm duas formas de alcançar tal feito:
    1º Imitar os tugas (uns homicídios resultam sempre!)
    2º Pedir aos Democratas EUA que imaginem que a Catalunha é Kosovo e o resto de Espanha a Sérvia!

  5. JgMenos says:

    O Kosovo como padrão para avaliar a independência da Catalunha num único ponto – um processo disparatado.
    Talvez um exercício como ‘uma maioria independentista nos Açores, logo que lá se descobrisse petróleo’, fosse útil.

    • ZE LOPES says:

      Examinemos: cornos, não consta; mama, também não; esquerdalho, nicles.

      Podia até ser um bom comentário, se estivesse escrito em Português.

  6. O Kosovo é um excelente padrão para avaliar todos os movimentos de independência a partir da data em que ocorreu!

    Pois fica evidente que se tem de ter os AMIGOS CERTOS a comandar as operações, caso contrário, nenhum país apoiará o movimento independentista!

    O exercício proposto não tem grande utilidade pois a região do Kosovo não tem activos minerais nem energéticos que interessem à escumalha que promoveu a “independência”!

    • ZE LOPES says:

      Nem mais!

      E pergunto: então há alguma razão interna para não reconhecer a Abkhazia e a Ossétia do Sul? A não ser “porque não queremos”, ou “porque os nosso parceiros não o fizeram”. Resumindo, “esses não, porque não”! Não inventem mais razões!.

      Aproveito para agradecer a tradução para Português do comentário do Menos. Que anda completamente desorientado, mesmo descontando a já habitual falta de orientação. Para ele as pusões separatistas existem nas regiões mais ricas – o que é parcialmente verdade – impulsionadas por esquerdalhos que procuram uma nova causa depois da queda da URSS – o que é uma redonda mentira! (Veja-se o que se passa na Itália, na Bélgica, na Ucrânia – não me digam que o Putin é esquerdalho! – em regiões da Sérvia e da Macedónia, etc. etc.)

    • JgMenos says:

      Talvez considerar que um parágrafo não tem necessariamente que ser a continuação do que o precede…ou a iliteracia como conquista de Abril.

      • ZE LOPES says:

        Ao menos essa conquista ninguém lhe a tira!

      • António Fernando Nabais says:

        Porque antes de Abril, o país estava recoberto de intelectuais que já nasciam de cachimbo e a citar Cícero de cor.

        • ZE LOPES says:

          O Menos, por exemplo. Quando o levaram ao teste do pézinho, insistiu em levar o “Montanha Mágica” debaixo do braço direito e o “Á Procura do Tempo Perdido” no esquerdo. E os “Discursos de Salazar” dentro da fralda.

      • iliteracia… Soma e segue!

        Apesar de agora existirem mais membros da MANADA tuga a serem capazes de “ler” e “escrever”*, a realidade continua, divertidamente, a ser basicamente a mesma, pois continuam a evidenciar um nível de boçalidade, a face alegre dos iletrados, em tudo idêntico ao de Abril de 1974!

        *Corre no país que emite a LUZ que cega vastas quantidades de tugas – os EUA – a seguinte notícia:
        We have graduated kids who can’t read. [They] had a diploma in their hands that they couldn’t read. That sounds like an exaggeration or hyperbole. It’s not.
        fonte: http://foxbaltimore.com/news/project-baltimore/city-teacher-calls-for-total-revolution
        Resta saber se daqui por uns anitos não vamos também alcançar tal feito, nem que para isso tenhamos que fazer outra Revolução!

    • Nuno Castelo-Branco says:

      Para nem sequer falarmos o farto pasto que o Kosovo é para actividades nada consentâneas com a “normalidade democrática”. Parece-me que as forças armadas portuguesas, as tais que “nunca mais sairão do território nacional a não ser para proteger a nossa independência” ainda lá estarão (?) colaborando e de certeza quase absoluta, com a respectiva remuneração.

      • ZE LOPES says:

        O caricato é que o Kosovo…só quer ser temporariamente independente. Tudo faz parte de um plano para unificar a “Grande Albânia”, a partir de partes da Macedónia (quase metade…), Sérvia e…Grécia!

        O Sr. múmia que, em Portugal, fazia de ministro dos Negócios Estrangeiros do governo que reconheceu o Kosovo disse que havia países que não o reconheciam por “razões internas”… Coisa de somenos importãncia tal como…reconhecerem quem aspira a tomar-lhes uma boa parte do territótrio…

      • Fui ver o sítio da tropa tuga e lá dizem o seguinte:
        “Em 30 de abril de 2017 cessou a atividade operacional a Força Nacional Destacada (FND) que integrava a Reserva Tática do Comandante da KFOR, tendo a respetiva retração ocorrido até final de junho de 2017. Portugal, através de militares do Exército, tem nos últimos anos provido quatro cargos no Estado-Maior do Quartel-General (QG) da KFOR.

        Está planeado que a partir de novembro de 2017 seja projetada para o Kosovo uma nova FND, constituída por uma Equipa de Human Intelligence (HUMINT) com um efetivo de dez militares do Exército.”
        Pelos vistos a mama agora é só para uns quantos escolhidos!
        Mas lá está… Quem não chora, não mama!
        “O comandante operacional do Exército, tenente-general Faria Menezes, está a criticar fortemente a decisão de pôr fim à missão no Kosovo, que terminou no dia 28 de abril.”
        https://www.jn.pt/nacional/interior/general-do-exercito-critica-no-facebook-saida-do-kosovo-6258578.html

        Querem todos o mesmo… Afinal não deixam de ser tugas!

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