Catarina Carvalho, ainda mais uma “especialista” em Educação

Nos últimos tempos, os “especialistas” em Educação têm andado especialmente activos, preocupados com os alunos e tudo e revoltados com os professores.

Durante anos, não se preocuparam com a criação de mega-agrupamentos, com o aumento do número de alunos por turma, com as constantes alterações legislativas e curriculares, com a falta de professores nas escolas, com a ausência de políticas sociais, com o empobrecimento da formação contínua dos professores, com a terrível falta de funcionários não-docentes, com o empobrecimento da formação inicial de professores graças ao sistema de Bolonha, com o empobrecimento dos estágios pedagógicos, a perda de qualidade das cantinas semiprivatizadas, enfim, com uma série infindável de problemas e medidas que tornam cada vez mais difícil que as escolas possam compensar, o máximo possível, os problemas de crianças causados por factores sociais e/ou familiares.

O que tem levado os “especialistas” a sair das tocas em que vivem, dispostos a morder tudo o que cheire a professor? A possibilidade de haver um reposicionamento dos professores nos escalões onde deveriam estar, se a progressão não tivesse sido congelada durante quase dez anos. Em suma, os “especialistas” estão furiosos com a recuperação de direitos laborais, o que se compreende, porque é um conceito contrário à religião que praticam.

Hoje, Catarina Carvalho fez referência a um estudo da DGEEC. O próprio estudo merece um estudo, mas Catarina Carvalho, como “especialista” em Educação, é alérgica ao estudo. No dito estudo, a dada altura, pode ler-se que é «bastante impressionante a forma transversal como o contexto económico influencia as classificações em todas as disciplinas». Dir-se-ia, comentando a afirmação, que ainda há gente que considera que o óbvio é impressionante.

Catarina Carvalho diz que isto é que deve ser combatido na rua e não as carreiras dos professores, como se um combate eliminasse o outro e como se não tivesse havido, ao longo dos anos, quem tivesse alertado para o problema. Eu próprio, modestamente, há seis anos, chamava a atenção para o facto de haver quem quisesse tapar o sol com coisas a que chamavam estudos.

Um especialista em Educação, face aos problemas detectados no estudo da DGEEC deverá, obviamente, colocar a hipótese de que os professores tenham uma quota-parte de responsabilidade na situação, mas não deixaria de investigar os muitos problemas que continuam a retirar às escolas a possibilidade de compensar as contingências decorrentes do contexto socioeconómico. Catarina Carvalho, como directora de uma magazine de domingo, é só uma “especialista” em Educação, o que se confirma quando atribui, talvez ajeitando um cabelo irónico, «nota 100, ou 20, ou lá o que se usa no secundário, para os professores que protestam». E ao pensar em professores prestes a recuperar tempo roubado, ainda fará um trejeito de quem está a ser incomodada por maus cheiros, que o trabalhador, sobretudo se reivindicativo, é uma pessoa que só usa sabão macaco ou lá o que se usa nas manifestações.

Comments

  1. Luís Lavoura says:

    colocar a hipótese de que os professores tenham uma quota-parte de responsabilidade na situação

    Sem dúvida que têm.

    Ao mandarem os alunos fazer muitos trabalhos de casa, e ao ordenarem-lhes que façam em casa trabalhos sobre temas muito especializados, trabalhos esses que depois influenciam a avaliação final, muitos professores estão de facto a descarregar para cima dos pais dos alunos a responsabilidade por estes terem boas notas. Porque é evidente que, se os pais forem pessoas educadas e cultas, serão eles quem farão (ou ajudarão a fazer) os trabalhos dos filhos, garantindo-lhes uma boa nota; enquanto que, se os pais forem pessoas incultas ou com pouco tempo para acompanhar os filhos, estes serão incapazes de fazer trabalhos de jeito em casa, ficando então condenados nas classificações.

    Quando eu fui aluno, há decénios, lembro-me de que os meus pais jamais tiveram que me ajudar e, no entanto, sempre consegui, por mim mesmo, ser um excelente aluno. Hoje em dia tal é praticamente impossível – os professores dão aos alunos um tal volume e uma tal complexidade de trabalhos para fazer em casa, que só quem tenha a ajuda dos pais consegue safar-se.

  2. António Fernando Nabais says:

    Portanto, o insucesso escolar deve-se ao excesso de trabalhos de casa? Realmente, não há como os “especialistas”, para que tudo fique esclarecido!

    • Luís Lavoura says:

      Não. O excesso de trabalhos de casa pode influenciar a forma como “o contexto económico influencia as classificações”. É a isso que se refere a frase “colocar a hipótese de que os professores tenham uma quota-parte de responsabilidade na situação”.

      • António Fernando Nabais says:

        O contexto económico é um factor tão complexo que pode chegar a ser determinante. Uma criança que não é estimulada, que vive num meio violento ou desorganizado, a quem não são impostas regras de civilidade já chega ao Primeiro Ciclo em desvantagem. Querer incluir aqui a o excesso de trabalhos de casa é só demagógico.

  3. José Feliciano Cunha de Sotto Mayor says:

    não conhecia esta catarina. mais um títere dos liberais-fascistas, portanto.

  4. Miguel says:

    Mas afinal de quem é a culpa?
    Já sei que não é dos professores.
    Dos pais, coitados, que tem de trabalhar também não.
    Dos miúdos, nem vale a pena ir por aí.
    Auxiliares?
    Editoras?
    Pronto, fazemos assi.m, ninguém tem culpa.
    E responsabilidade, alguém quer um bocadinho?

    • António Fernando Nabais says:

      Pois, culpa talvez só o ministério, mas a responsabilidade é de todos, a começar pelos pais e pelos professores, como é evidente. De qualquer modo, se derem a um agricultor uma colher, quando precisa, no mínimo, de uma enxada, é um bocado difícil esperar que o terreno fique bem lavrado.

      • Miguel says:

        Entendo que há muitos factores a ter em conta e que devem ser discutidos para que se tomem medidas.
        Mas a verdade é que acho que o sentido de responsabilidade, o ser responsável, anda afastado há muito deste ( e se calhar de quase todos) assunto.
        Acho que se vêem os melhores resultados quando existe esse sentimento e o mesmo é partilhado pelas partes envolvidas.
        É o que acho mas também não sou perito 😄

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