Pelo direito a decidir morrer

Fotografia via The Local

David Goodall viajou até à Suíça, onde agendou a sua morte medicamente assistida para o dia de ontem. Aos 104 anos, e com a sua saúde a deteriorar-se mais do que o botânico australiano pretendia suportar, David decidiu morrer.

Não o pôde fazer na Austrália, como não o poderia ter feito na maior parte dos países do planeta, porque a liberdade individual é um conceito relativo. Mesmo nas orgulhosas democracias ocidentais, ainda existem aqueles que defendem que o direito a colocar um ponto final na nossa vida, ainda que manifestado por alguém na posse de todas as suas faculdades, lhe está vedado. Como se a vida de cada um fosse propriedade do Estado ou dos defensores do politicamente correcto.

Espero, sinceramente, ver o meu país na vanguarda da defesa e da legalização da eutanásia. Portugal é um Estado laico, que não deve vassalagem a preconceitos religiosos ou a autoritarismos conservadores, e que deve, na minha opinião, respeitar a decisão do indivíduo sobre a sua própria existência. Se o senhor António ou a dona Maria estão fartos de sofrer com uma doença grave e querem colocar um ponto final na sua vida, quem somos nós para lhes impor comportamentos sobre o seu corpo e a sua existência? Deixemos os totalitarismos para os Estados totalitários. Deixemos o ser humano ser livre de decidir sobre o seu destino.

Comments

  1. Concordo. Dar liberdade de escolha nunca obrigou os outros, que não concordam, a fazer o que quer que seja. Como no aborto. Quem não quer abortar não aborta. Quem não quer casar com uma pessoa do mesmo sexo não casa. Quem não quer mudar de sexo não muda. O que não acho legítimo é que quem não concorde queira depois mandar na vida e na casa dos outros.

  2. “Como se a vida de cada um fosse propriedade do Estado…”

    O Estado só deixa dar a nossa vida…pela Pátria! Com a nossa vontade expressa ou como efeito colateral!

    Ah! Mas, também, devemos estar disponíveis para morrer, caso esse mesmo Estado falhe, e não possa cumprir com algumas das suas obrigações constitucionais…

  3. Anibal Marques says:

    Pelo direito a decidir morrer.
    Não me oponho porque não consigo negar esse direito a um semelhante.
    Todos vamos morrer.
    Em qualquer momento podemos sempre tomar essa decisão e fazê-lo: auto eutanásia.
    Também não deve ser o estado a arranjar os meios para quem quer morrer, fazê-lo.
    Quem quer morrer pode sempre comprar “medicamentos” para isso ou dispositivos no mercado.
    Agora o meu direito de querer por termo à vida esbarra com a meu direito de não querer ajudar alguém a fazê-lo.

  4. Rui Naldinho says:

    “Agora o meu direito de querer por termo à vida esbarra com a meu direito de não querer ajudar alguém a fazê-lo.”

    Acha mesmo que alguém pode ser obrigado a exercer a eutanásia sobre outro, contra a sua própria vontade?
    De certeza que não. Pelo menos em Portugal.
    Aliás, essa foi uma das armas de arremesso aquando da aprovação da Lei de Despenalização do Aborto, vulgo interrupção voluntária da gravidez. Que eu saiba, nenhum médico ou enfermeiro foi obrigado a fazê-lo contra a sua vontade.
    Até porque, desde que isso seja legal, não faltarão hospitais privados dispostos a ganhar dinheiro com essa tarefa, tal como avonteceu na Suíça, a David Goodall.

  5. Ana Moreno says:

    “Como se a vida de cada um fosse propriedade do Estado ou dos defensores do politicamente correcto.”
    João, concordo contigo quanto ao tema. Mas o que é o politicamente correcto, neste caso? Não sei mesmo.
    Em geral, essa do “politicamente correcto” parece-me ser um carimbo demagógico para desconversar. Ou terá fundamentos mais profundos que me passaram despercebidos?

  6. Concordo por princípio com a legalização da eutanásia, mas precisamos de pôr os nossos melhores cérebros a trabalhar no enquadramento legal. É tão fácil persuadir um idoso de que já não anda cá a fazer nada e que seria preferível morrer, apenas para lhe sacar a herança…

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