Algumas breves considerações sobre a despenalização da eutanásia

Em primeiro lugar discordo das posições assumidas pelo CDS/PP e PCP, da mesma forma que discordo da posição do BE sobre a votação próxima na Assembleia da República do projecto-Lei que despenaliza a eutanásia. Isto porque os dois primeiros decidiram votar contra, os bloquistas a favor, uns e outros sem concederem liberdade de voto aos seus deputados. Gostaria de ter parlamentares livres, que assumissem as suas posições em vez de acéfalos obedientes ao directório partidário.
Há muita gente que confunde conceitos que vão do testamento vital, ao suicídio medicamente assistido chegando à eutanásia. Vamos por partes, não falamos de eutanásia quando um médico decide colocar um ponto final ao tratamento, por considerar irreversível o estado do doente. Só poderá ser considerada eutanásia quando um doente mentalmente lúcido solicita que lhe seja colocado um ponto final ao sofrimento. Decisão que terá que ser tomada pelo próprio e não pela família, ou qualquer terceira pessoa.

Não me limito a defender a despenalização da eutanásia, como até vou mais longe e defendo que seja legalizada a prática do suicídio medicamente assistido. Porque entendo que cada vida é única, mas desejavelmente livre e não aceito pertencer sequer aos meus familiares, quanto mais a um Estado ou religião. A vida é uma propriedade individual e deve ser respeitada, criminalizando quem contra ela atente, mas libertando os indivíduos de conceitos e dogmas de inspiração ou tradição religiosa. O que não implica que um médico possa ser ou deva ser obrigado a praticar um acto contra sua vontade, para isso existe objecção de consciência. E muito menos que alguém que permaneça agarrado à vida, mesmo em sofrimento atroz, deva ser eutanasiado.
A diferença entre os que defendem a despenalização da eutanásia e os que se lhe opõem, é simples. Nós, os primeiros, queremos ser livres e ter liberdade de escolha. Os segundos quaisquer que sejam as suas motivações ou convicções, pretendem impor-nos a sua visão filosófica utilizando para o efeito a força coerciva da Lei. Estranho ver alguns liberais do outro lado da barricada, mas nem tudo é a preto ou branco na vida…

Comments

  1. joaovieira1 says:

    A Declaração Universal dos Direitos do Homem (e da Mulher?), aprovada, na Assembleia Geral da ONU, em 10/12/1948, reconhece que todo o ser humano, do nascimento à morte, goza de dignidade e direitos iguais e inalienáveis e que os mesmos constituem o fundamento da liberdade, justiça e paz no mundo. Tal reconhecimento, porém, não impede que milhares de seres humanos, a todo o momento, morram, pelas mais diversas razões, incluindo, o suicídio. Para mim, ser a favor ou contra a eutanásia, em Portugal, país, ainda, tão desigual e injusto, não é decisão fácil, dado tratar-se de um direito cujo bom exercício, não estando, devidamente, assegurado, pode inspirar fortes reservas. Se quisermos, porém, continuar a ser imitadores do que se passa, em países, científica, tecnológica e culturalmente, mais avançados, força, vote-se a favor. A lei será aprovada, mas a sociedade ficará, mais uma vez, dividida. Será que a paz e o equilíbrio sócio-político de que desfrutamos, desde de fins de 2015, não merecerá mais um prolongamento do que um corte?

    • Paulo Marques says:

      A sociedade também ia ficar dividida com a despenalização do aborto, com a legalização do casamento homossexual ou com o testamento vital e, no entanto, nada mudou, excepto a vida das pessoas envolvidas.
      Se calhar, não há razões para adiar as causas (não) fracurantes sem ser canalhice política. Se calhar.

  2. Tudo se resume a isto:

    “Até na morte dos outros querem mandar”.
    (Bruno Nogueira)

  3. whaleproject says:

    Suicídio medicamente assistido? Bateu com a cabecinha nalgum lado? As pessoas são livres de se matar. Agora os médicos não devem servir para isso. Já basta quando servem porque não têm meios para tratar os doentes como deve ser, a tempo e horas, o que, em Portugal, está na base de muitas situações dolorosas e irreversíveis.
    Já pensou porque é que a Guiné-Bissau não debate eutanásia? Acredita que estamos muito melhor num país em que há hospitais que apanham infestações de piolho do pombo? Que aqui algum tetraplégico aguentava 28 anos vivo num hospital?
    Não precisamos de eutanásia. Precisamos de mais médicos, mais enfermeiros, mais meios. Não somos um país avançado, nunca seremos. E agora queremos regredir à Grécia antiga, em que a noção de cuidados paliativos era a pancada na cabeça e o vinho tinto. Eutanásia não é modernidade, é crime. Não me interessa se na Holanda se pratica ou se na Bélgica se ajuda a morrer quem tem depressão e nenhuma doença física. Nós já morremos muito rapidamente quando temos a má sorte de ir parar a um hospital. Não precisamos do método Mengele para ajudar á festa.

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