A oposição-administração não muito silenciosa

Nos vertiginosos tempos em que vivemos, onde o instantâneo é regra e a reflexão tende a ocupar um lugar secundário, poderá pensar-se que uma notícia de quarta-feira passada cheire a bafio. Mas é bem actual e nem precisa de ser arejada.

Muitos têm apontado a natureza louca do presidente americano, tendo repetidamente sido adjectivados de tontos para baixo. Mas agora é um elemento da administração Trump quem o afirma, o que devia ser suficiente para que as luminárias nacionais, a par das restantes, engolissem uns sapos. Talvez se tenham ficado pelas cuisses de grenouille, no entanto.

Não nos enganemos, no entanto. O autor desta carta é aquele tipo de amigo que nos sorri enquanto prepara a facada nas costas. Vem isto a propósito do que ele afirma como sendo os sucessos desta administração americana: desregulamentação, reforma fiscal e exército mais forte.

Vejamos. A reforma fiscal existiu sim, mas para aliviar as grandes empresas, já imensamente ricas; a desregulamentação tem como bom exemplo o fim da neutralidade da Internet, com enorme benefício para as empresas de telecomunicações (e com prejuízo para os consumidores americanos); e um exército mais robusto traduz-se na continuação dos negócios cimentados pela guerra.

Outro objectivo da administração Trump, óbvio mas não declarado, consiste em manter Trump até que altos cargos, tais como o Supremo Tribunal, fiquem povoados por peões republicanos, consolidando as posições do partido durante décadas (graças às nomeações vitalícias).

Quanto à loucura de Trump, esta só assim é vista por aqueles que acham que o totalitarismo dos anos 30 do século passado não se repetira. Há, no entanto, um crescente grupo de políticos que trabalham nesse sentido e Trump, suportado pelo facho Bannon, é o expoente deste movimento. O que para uns é a loucura, para outros é a estratégia a funcionar. E esta passa por destruir as instituições, tais como a ONU, a NATO e a UE, que têm funcionado como travão ao plano. A estratégia tem funcionado, com a conivência dos republicanos que tapam os olhos para assegurarem o poder vindouro, mesmo que alguns lancem uns gemidos anónimos na comunicação social.

Extrato da carta em causa:

“…

The dilemma — which he does not fully grasp — is that many of the senior officials in his own administration are working diligently from within to frustrate parts of his agenda and his worst inclinations.

I would know. I am one of them.

The root of the problem is the president’s amorality. Anyone who works with him knows he is not moored to any discernible first principles that guide his decision making.

In addition to his mass-marketing of the notion that the press is the “enemy of the people,” President Trump’s impulses are generally anti-trade and anti-democratic.

Don’t get me wrong. There are bright spots that the near-ceaseless negative coverage of the administration fails to capture: effective deregulation, historic tax reform, a more robust military and more.

But these successes have come despite — not because of — the president’s leadership style, which is impetuous, adversarial, petty and ineffective.

From the White House to executive branch departments and agencies, senior officials will privately admit their daily disbelief at the commander in chief’s comments and actions. Most are working to insulate their operations from his whims.

Take foreign policy: In public and in private, President Trump shows a preference for autocrats and dictators, such as President Vladimir Putin of Russia and North Korea’s leader, Kim Jong-un, and displays little genuine appreciation for the ties that bind us to allied, like-minded nations.

Astute observers have noted, though, that the rest of the administration is operating on another track, one where countries like Russia are called out for meddling and punished accordingly, and where allies around the world are engaged as peers rather than ridiculed as rivals.

The bigger concern is not what Mr. Trump has done to the presidency but rather what we as a nation have allowed him to do to us. We have sunk low with him and allowed our discourse to be stripped of civility.

… ”

Imagem: NYT

Comments

  1. Paulo Marques says:

    Faz lembrar o Hollande, o Costa ou o Macron como membros da resistência à TINA. Ao menos esses mentem pela frente.

  2. Paulo Marques says:

    Como um enorme número de americanos já disse, uma alternativa a um presidente demente não é uma junta rebelde à margem do processo democrático, é a destituição através do processos existentes, mas os republicanos são os primeiros a estar borrados de medo dos racistas pois não querem correr o risco perder os seus poisos dourados à custa do estado nas eleições.

  3. ZE LOPES says:

    Desde que vozes da Igreja denunciarm a presença de Satanás np Vaticano (dizem mesmo que já apareceu à janela da Biblioteca a dizer “nã, nã! Eu é que sou o papa ferancisco!”) nada disto é para admirar.

    Afinal, parece que os EUA têm mesmo um presidente! Só que não é Trump. Também não se sabe quem o elegeu nem quantos votos teve mas, se vamos por aí, Trump…

    Estejamos atentos aos próximos capítulos. Também o gajo há-de aparecer a um qualquer postigo a dizer “trampe? isso é qu’era bom! Eu é que sou o persidente dos estados unidos”, não tarda nada.

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