O sonso e a lei

Nuno Veiga/LUSA

A argumentação – acompanhada por uma ameaça de veto – com que o presidente da República pretende sustentar a sua exigência de uma Lei de Bases da Saúde à medida dos seus desejos, é um rosário de falácias e equívocos.

1- As leis em que se tem fundado o Serviço Nacional de Saúde nunca foram obtidas pelo consenso agora tão desejado por Marcelo. Foram sempre suportadas por convicções e votadas por partidos determinados com objectivos determinados. O próprio PR, tendo sido líder de um dos partidos em causa, e tendo ele próprio tomado posições – ideológicas, claro está – sobre a matéria, sabe disso perfeitamente. Estar agora a exigir um consenso geral, uma votação para a eternidade – quiçá com todos os partidos a votar a favor – configura uma nebulosa e demagógica patranha na qual só são claros os interesses a servir.

2- O argumento de que um tal consenso – parente próximo da noção antidemocrática de “arco da governação” – garantiria uma prolongada vida à Lei é um simples truque argumentativo que, de tão básico, devia envergonhar o emissor – ele – e revoltar o destinatário – nós. Na verdade, qualquer que seja a maioria que aprove a Lei de Bases em discussão, nada impede que outra maioria – seja ela qual for – a venha a rever. Como já aconteceu, de resto.

3- Esta atitude do presidente não é, para quem o conhece, uma surpresa. Nenhuma popularidade ou habilidade nos gestos e nas palavras esconde os interesses e posições ideológicas do presidente. Não é que uns e outras sejam censuráveis só por si. Mas os malabarismos retóricos com que sobre eles lança uma nuvem de ambiguidade têm limites. Ultrapassando-os, Marcelo evidencia o que muitos sabiam e ouros intuíam: é um sonso.

Comments

  1. Ernesto Martins Vaz Ribeiro says:

    Há duas formas de actuar para que algo não avance:

    1 – Proibir a ideia
    2 – Procurar um consenso

    Marcelo, hipocritamente como sempre, prefere a segunda posição. Hipocritamente, porque sabe que nunca haverá, na matéria qualquer consenso.
    Esta situação é, pois, equivalente a uma proibição. E isso está exactamente na sua mente, no que toca ao SNS.

  2. Ana A. says:

    Múmias e Sonsos é o nosso desígnio!

    E um referendozinho ao povo, não?!

    Já que se quer um consenso…

    • Ernesto Martins Vaz Ribeiro says:

      Quanto ao referendo … Olhe que se engana. Volta a ganhar com maioria absoluta num país onde o povo é doutorado em futebol, mas inculto na maior parte das matérias 🙂

  3. Eu sempre disse que ele não presta………………

  4. ….trauliteiro e manhoso q b, sempre , e sonso também.

    era visto !!!

    • Ana Moreno says:

      E quem é que garante ao Sr. Presidente que o PSD vai ter um peso tão decisivo no parlamento pós-eleições legislativas de 2019??? Por acaso não se põe nenhuma hipótese de haver uma clara maioria à esquerda? Saberá mais do que nós?

  5. JgMenos says:

    A cambada esquerdalha mal pode esperar para acabar com os ‘negócios da saúde’ e correr a endividar-se ou a sacar os contribuintes para criar emprego públicos.

    As escolas abandonadas vão juntar-se hospitais abandonados para gozo `da cretinagem e emprego de 35 horas para a boyada.

    • Paulo Marques says:

      Claro, pagar PPPs é sempre mais barato em todo o lado e não dá sempre merda.

  6. E ainda, que o caso é sério : ( com permissão do autor)

    «Sabíamos o que era um pré-aviso de greve. Embora similares, desconhecíamos o que era um pré-aviso de veto até o Presidente da República o ter inventado, a propósito do destino que tenciona dar à Lei de Bases da Saúde que vier a ser aprovada na Assembleia da República se não merecer o voto do PSD. Tudo em nome de um “pacto de regime” e contra o “triunfo de uma conjuntura”. (…)

    No caso, o que interessa, porém, é o que esconde o argumento do pacto de regime. Que é, pelo que conhecemos, a síntese das propostas do Governo e do PSD, uma vez que as outras seriam dadas de barato, significando o sacrifício das propostas do BE e do PCP contra o sacrifício da proposta do CDS. Seria o regresso ao almejado bloco central por que tanto se bate veladamente o Presidente da República, numa das matérias em que os campos políticos devem ser particularmente diferenciados. Para o efeito, o regime havia de se resumir a dois partidos, sendo que dois deles fazem parte da solução política deste Governo. Enquanto teoria da geometria variável, esta seria o expoente da incongruência. Seria o equivalente ao cadáver esquisito dos surrealistas.»

    Cipriano Justo

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