O tudólogo d’Entre Douro e Minho

[maquinistas.org]

Chegou ao nosso conhecimento esta pérola do tudismo, actividade muito peculiar da cultura Portuguesa, onde alguém, que não percebe absolutamente nada de um determinado assunto, se põe a fazer opinações de fundo sobre o mesmo na imprensa. Não que ponhamos em causa o irrevogável direito de o fazer, que defendemos solenemente, mas sim a obrigação moral que quem está no mundo da política tem de se pautar como um exemplo ético para a sociedade (nem que seja de aparências!).

Ricardo Santos, Engenheiro de Software, ex-líder da JSD Paredes, candidato vencido à concelhia de Paredes do seu partido, membro da Assembleia Municipal de Paredes e aparentemente tudólogo de serviço à coluna de opinião do Verdadeiro Olhar, emanou o seu parecer sobre o projecto da linha do Vale do Sousa através da referida publicação. E, do alto da sua sapiência de tudólogo, aparentemente não gostou…

Classificou o projecto como “Megalómano” – o que, na verdade, se compreende pois para o PSD linhas de caminho de ferro são para fechar, tendo em conta os desbastes que foram feitos à rede ferroviária nacional durante os seus governos. Logo, tudo o que envolve carris é “megalómano” ainda que haja um grande potencial de procura. Adiante, e em contradição consigo próprio, afiança que o projecto foi desenhado num guardanapo. É, no mínimo, estranho que algo considerado taxativamente como “megalómano” seja depois acusado de ter sido criado num mero “guardanapo”.

Não nos parece que cinco presidentes de câmara se juntem num qualquer tasco para jantar. Ao almoço, ainda vá, que a vida politica a isso obriga, mas o jantar é sempre mais formal e o tom usado dá a entender que os presidentes em questão são malta que se trata bem. Assim sendo, não cremos que nesse tal hipotético jantar os guardanapos fossem de papel, pelo que a insinuação do cavalheiro implica que há uma grande probabilidade do plano ter sido desenhado num guardanapo de pano… o que não é lá muito provável, uma vez que os cavalheiros em questão terão algo mais que um mínimo de educação (não se chega a presidente de câmara a ser mal educado).

Por outro lado, tendo em conta a informação pública disponível, não nos parece que este projecto preliminar de linha tenha sido feito num “guardanapo”. Apesar de todos sabermos que o vinho é um potente motor criativo, a verdade é que todas as ideias nascem nalgum lado e sofrem um processo de desenvolvimento. O corrente estado do projecto da Linha do Vale do Sousa é claramente preliminar, já bastante longe da fase do “guardanapo”, justificando que o mesmo seja inserido no PNI 2030. Assim, quer-nos parecer que o problema do “guardanapo” é o PSD não ter lá conseguido desenhar nada por não estar presente. Deve ser muito frustrante para o PSD Paredes perder mais 20% dos votos e passar duma maioria a minoria em apenas 8 anos.

Relativamente às criticas acerca do estado da Rede ferroviária nacional, são plenamente justificadas. É pena é esquecer-se da merd@ muito pior que os anteriores governos PSD fizeram. Aliás, ainda se dá ao luxo de escrever estas pérolas:

“Fosse um governo do PSD e talvez este país tivesse a coragem de parar e contestar o estado a que os comboios e a linha ferroviária chegaram.”
“Devo relembrar-lhe que esta nossa linha, a linha do Douro, simultaneamente serve dois mundos distintos. Um mundo em que temos comboios modernos e com uma elevada disponibilidade e outro onde fazer uma viagem de pouco mais de 100 km’s demora mais de 4 horas!”

Oh pá – isto é tão bom – o estimado cavalheiro, com os seus graves problemas de memória, dava um óptimo cómico de improviso (stand-up), pois, na nossa humilde opinião, é bastante dotado e versado na actividade!

Mas a frustração é de tal ordem, que nem as tais obras que o nosso tudólogo reclama que tanta falta fazem, escapam:

“Se tentar fazer uma viagem entre o Pocinho e São Bento, necessita de 4 horas e 38 minutos, mais precisamente, para chegar ao destino. E pelo meio ainda consegue usufruir de uma pequena troca entre comboio e autocarro.”

Obviamente, pode-se criticar a opção pelo modelo escolhido para as obras, mas deixar a ideia no ar que é uma situação habitual, ou permanente, não é moralmente correcto. Todos sabemos que os actuais tempos se devem à interrupção actual da Linha do Douro entre Livração e Marco de Canaveses a fim de ser renovada e que o tempo normal do percurso é cerca de metade do agora praticado. Ou seja: Um gajo é preso por ter cão e por não ter, desde que não seja do PSD!

Depois o disparate prossegue a bom ritmo:

“Então, uma Câmara com uma dívida de mais de 100 milhões e uma “má herança” herdada pelo atual executivo permite um investimento numa linha de comboio?”

Que se saiba, a construção de linhas de caminho de ferro cai sob a alçada do Governo e o que foi feito foi um estudo para tentar convencer o Governo da viabilidade de tal linha. Aliás, o estimado autor acaba por afirmar que:

“Mas, e talvez com o êxtase do momento, o concelho de Paredes foi promotor de uma conferência para discutir o projeto, convidando o Secretário de Estado a estar presente. Na sua intervenção anunciou, com pompa e circunstância, que a linha ferroviária do Vale do Sousa iria ser contemplada no Plano Nacional de Investimentos 2030… como um estudo!”

Será que o estimado não compreende sequer o que lê?

Mas afinal quem é que vai financiar a construção da linha? É que sendo o estudo preliminar, são necessários muitos mais estudos de custo avultado, em regra a cargo do promotor da mesma, para se determinar a sua efectiva viabilidade. O que o autor acaba por referir, com estas palavras, é que o estado chamou a si a responsabilidade da construção da linha se for viável, no próximo ciclo de investimentos públicos. Ou seja, o autor, mais uma vez, contradiz-se flagrantemente!

A sugestão de criação duma empresa de transportes públicos intermunicipal é extremamente interessante, em especial se tivermos em conta que há várias empresas privadas que sairiam prejudicadas por tal medida. Indicia ainda um possível desconhecimento acerca da especificidade da futura contratualização dos serviços públicos de transporte de passageiros, pelo que aconselhamos vivamente o estimado cavalheiro a visitar o site do Grupo de Trabalho para a Capacitação das Autoridades de Transportes, cujo sitio na internet não terá problemas em encontrar, pressupondo um correcto domínio das tecnologias de informação, que é certamente apanágio de qualquer profissional do ramo.

Resumindo:

Para a próxima, antes de mandar bitaites, informe-se! O Google é amigo e a Wikipedia é um óptimo recurso, se consultado com olhos críticos!

Comments

  1. Antonio Martinho Marques says:

    Tudólogos e nubívagos de ideias, chegam rápidamente, sem ou com caminho de ferro, aos corredores do poder e costumam estacionar, depois, em gabinetes governativos…

  2. JgMenos says:

    2019 é um ano muito contemplativo:
    – contemplanos estudos para realizar obra daqui a 20 anos.
    – contemplanos a abertura de inúmeros concursos para obras sem orçamento que as assegure.
    .- conteplaremos muito provavelmente o lançamento da primeira pedra de obras para as quais não há estudos
    – contemplamos ainda as guerrinhas da treta partidária

    • ZE LOPES says:

      Contemple mas, por favor, não exagere. Lá na minha terra o povo costuma dizer “Cuidado! A contemplar morreu um Menos”. Diz o povo! Lá na minha terra! Não deve ser por Menice, perdão, por acaso…

    • Paulo Marques says:

      Sempre é melhor que contemplar obras para oferecer aos clientes do Cruz.

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