Adivinha

Qual foi o OCS que pegou num vídeo feito para dar nas vistas à conta de um conhecido fabricante de robots e o transformou numa notícia, sem um mínimo de validação jornalística, titulada “A ‘vingança’ das máquinas está aí. Robots já atacam“?

Talvez o texto fosse também uma paródia, à semelhança do vídeo, poderíamos pensar. Indo pelo endereço encontrado no Google logo se percebe que o artigo foi apagado, pelo que se ficaria na dúvida, não se desse o caso de a Internet ainda ter memória. E de ter uma cópia.

Nem o bem visível texto no vídeo dizendo “Bosstown Dynamics”, nem o esclarecedor final do vídeo travaram a pena inspirada do autor. “Os piores pesadelos dos que pensam que as máquinas vão acabar por dominar o planeta e os seres humanos, tal como previsto nos filmes de nível B de Hollywood, acabam de ser materializados no mais recente vídeo divulgado pela Boston Dynamics.” O drama, o horror, a tragédia, assim diria Artur Albarran perante este juízo final.

Lançado o desafio aos espíritos audazes sobre que OCS seria este, o qual até tem uma rubrica chamada fact check, vamos lá desfazer esta verborreia sobre o escorrer de letras publicadas em forma de notícia.

Basta um pontapé no delicado pote de porcelana que é a credibilidade de um OCS para que este se estrilhasse. Uma boa cola poderá juntar as peças, mas as fissuras estarão lá. No caso do Observador, que é dele que aqui se trata, o caso tem precedentes e não constitui surpresa, sendo apenas mais uma constatação. A restante comunicação social, em graus diversos, tem sofrido das mesmas maleitas. Estamos perante uma tendência, derivada da falta de financiamento, dirão alguns, aos quais será de recordar a época dourada das notícias plantadas do tempo em que a comunicação social era a única voz capaz de chegar às massas.

A qualidade sempre teve altos e baixos, mas agora o problema é outro e reside no produto jornalístico propriamente dito. Não necessariamente na qualidade dele, mas no facto de este ter pouca procura. Nos tempos do instantâneo, os títulos e os leads parecem satisfazer os consumidores de notícias. Esse produto de consumo rápido tem elevada procura, mas também regista a particularidade de não ser facturado facilmente. A UE, com a sua taxa dos links, é, nem mais nem menos, do que a tentativa de rentabilizar as três ou quatro linhas de texto que uma multidão lê sem pagar no Facebook, no Linkedin, no Google e nos outros gigantes da Internet.

Para um jornal que pega num vídeo qualquer e dele faz uma notícia, o cenário é positivo, pois já se encontrava a vender apenas o título e o lead. Para os outros, a nova fonte de receitas dificilmente será suficiente. Resolver o problema da comunicação social implicaria uma mudança de paradigma social, onde não tivéssemos consumidores de notícias, mas sim leitores. Onde os estímulos incidissem na reflexão, em vez de incentivarem o instantâneo. Tal mudança seria como recuar a um tempo anterior ao frenesim da modernidade. O que, como sabemos, não acontecerá pela mesma razão que ninguém quererá andar de carroça quando tem um automóvel à disposição.

Portanto, A “vingança” das máquinas que nos aceleram a vida está aí, em cada momento que deixamos de ter para reflectir, apesar de os robots não atacarem.

18/06/2019
Os piores pesadelos dos que pensam que as máquinas vão acabar por dominar o planeta e os seres humanos, tal como previsto nos filmes de nível B de Hollywood, acabam de ser materializados no mais recente vídeo divulgado pela Boston Dynamics. Esta empresa especializada na produção de robots, que já pertenceu à Alphabet, a dona da Google, e que agora integra o grupo Softbank (especialistas japoneses de software), revelou que as suas máquinas já são capazes de se conseguir defender e até atacar.

Os robots vão evoluir no sentido de desempenhar cada vez mais funções e tarefas, desde carregar objectos, proporcionar assistência a idosos, ir às compras e tudo o mais que os seres humanos, seus programadores, decidirem. Munidos de inteligência artificial, à semelhança dos veículos autónomos, também eles vão ter a possibilidade de se deslocar do ponto A ao B, escolhendo as melhores opções de trajecto e ultrapassando todos os problemas que encontrem pelo caminho. Tal como os automóveis sem condutor.

A Boston Dynamics, para demonstrar o estágio de evolução do mais recente software, submeteu o seu robot a uma série de ataques. Não para danificá-lo, tanto mais que cada um destes protótipos tem um valor astronómico, mas para mostrar que as suas máquinas, mesmo perante situações muito adversas, tentam sempre executar as tarefas de que estão incumbidas. Mesmo quando estão a ser agredidas, empurradas ou atiradas ao chão.

Como algumas das funções destes robots podem incluir a defesa de outros, por exemplo quando servem de companhia e apoio a idosos, a Boston Dynamics revela que os seus robots podem igualmente defender-se e inclusivamente atacar, até seres humanos. O golpe de karaté tipo Bruce Lee revela toda a agilidade da máquina, para depois demonstrar que, na ânsia de neutralizar os seus agressores, não se inibem de recorrer a golpes menos próprios, como um pontapé nas partes baixas do antagonista.

Comments

  1. Fernando Manuel Rodrigues says:

    Ou seja, você está a ajudar com mais um prego para o caixão do jornalismo 😉

    Não que eu não concorde. O jornalismo actual tornou-se. na maioria dos casos, em “jornalixo”, tendo perdido toda a objectividade e imparcialidade, e tendo-se tornado em veículo de difusão e propaganda ideológicia, pura e simples.

    Ainda por cima, escrevem mal – não dominam nem são proficientes no seu veículo de expressão.

    Por isso, lamento, mas não lamento. Os jornals, tal como as televisões generalistas, estão condenados à obliteração (na minha opinião). Teremos (os cidadãos que pretenderem manter-se informados) de ler muito mais fontes, e ser muito mais críticos na filtragem da informação obtida. Mas isso já acontece hoje em dia.

    • j. manuel cordeiro says:

      “Ou seja, você está a ajudar com mais um prego para o caixão do jornalismo”

      Pois, assim parece.

      Por acaso, até vivo bem com jornalismo que não seja imparcial, desde que não pretenda passar por imparcial. Por exemplo, nos EUA, quando vejo algo na Fox News já sei que será a favor do Trump e quando leio o NYT já sei que são maioritariamente a favor dos democratas.

  2. Eu Mesmo. says:

    O que se passa no jornalismo, passa-se nas outras áreas onde deixaram de haver leitores, para haver consumidores de notícias e de livros… deixaram de haver pacientes e há consumidores de serviços de saúde… etc… O mercado não é a panaceia para todos os males da economia e sociedade… muitas vezes é mesmo o catalisador para o declínio…

  3. Típico do Obervador, é mais forte que eles, meter medo para que os DDTs vivam melhor é a cultura deles.

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