Ora sh*t para os asteriscos

Quem assista a um talk show americano depara-se com a sistemática censura de palavras como fuck, shit, asshole e demais termos que choquem a moral vitoriana dos sensíveis cidadãos norte-americanos. Parece que tal se deve à existência de uma lei que a tal obriga. Alteram, inclusivamente, o vídeo por forma a que um surdo não possa ler nos lábios. Mas aceitam abreviaturas, como f***, que a todos permite perceber o que é que está a ser dito. Tal como nigger, termo altamente depreciativo mas que é aceitável caso se use a expressão the n word.

O mesmo se passa em relação a outras práticas que não encaixem no seu modelo de virtudes. Comportamentos sexuais menos ortodoxos e traição, por exemplo, não levantam onda, caso todos possam fazer de conta que não sabem o que é que se esteja a passar. Poderia ser desta forma de reagir que vem a nossa expressão “para inglês ver” (não é). E é disso que se trata, negar a realidade, criando fachadas para americano ver.

Poderá ter sido por isso que Clinton foi destituído. Os republicanos fizeram-se chocados, primeiro pelo uso criativo do charuto, depois por ter mentido ao Congresso, e correram com ele.

Mas são estes mesmos republicanos que não têm problema em apoiar o mentiroso-mor que os representa, certamente por ser do seu partido. Ontem, uma testemunha do inquérito de destituição de Trump prestou declarações sobre o presidente dos EUA ter feito depender o apoio de 400 milhões de dólares à Ucrânia da divulgação de algo que prejudicasse o seu adversário democrata. E o New York Times notícia que os ucranianos sabiam disso. É certo que não é um charuto, mas não vêem eles nenhum problema nisto? Quanto a Trump, recusa-se a participar na investigação, o que, pela lei americana, é suficiente para a destituição.

Esta moral vitoriana, que com Trump mais parece um vaso com o verniz estalado, seria problemas deles, não se desse o caso de ter impacto nas nossas recatadas vidas e de, muito pior, estragar os programas de macacada dos late shows.

Comments

  1. De qualquer forma eu (que nem sequer tenho a mínima simpatia por americanos ou cultura americana tirando algumas particularidades) admiro a forma descontraída deles. Admiro por exemplo que pessoas ilustres como um presidente, em plena entrevista a ser difundida nacionalmente a pare porque uma mosca lhe pousou no braço e a mate (nem quero imaginar os protestos que hoje aconteceriam dos defensores dos animais!) e diga “I got the sucker”!

    Já nós em Portugal podemos dizer quinhentas caralhadas por dia (especialmente aqui no norte) mas depois em atos públicos ninguém diz “fôda-se” ou “caralho”, fica tudo mais na esfera da vida pessoal. E nas novelas portuguesas (ok, é verdade que há muito anos não as vejo…) além dos pequenos-almoços extraordinários, em que parece que somos todos muito ricos!, a linguagem corrente é ocultada e parece que todos usamos uma linguagem literária!

    Sobre Trump acho que alguém ainda poderá a vir um dia a escrever o romance “Crónica de um impeachment anunciado”!

  2. JgMenos says:

    ‘Esta moral vitoriana’
    o que tem a ver a simples decência ou bom gosto – ou o que queiram chamar-lhe – na linguagem com alguma moral vitoriana ou outra. Bem precisávamos cá dessas leis para se poder viajar em transportes píblicos sem ter que ouvir conversas e telefonemas na mais reles linguagem.

    Quanto ao mais, partidocracia é o mais que se pode ver por aí, mas ninguém parece interessado em mudar., ou em personalizar os mandatos dos eleitos.

    • j. manuel cordeiro says:

      A questão não é do foro da decência mas sim da hipocrisia.

      • JgMenos says:

        A decência pressupõe o que objectivamente é hipocrisia: o que se diz e faz em privado não se faz ou diz em público.

    • Paulo Marques says:

      Os protestantes ingleses mais puritanos fugiram para as colónias para fazer um país à sua imagem, e nunca mudaram muito nem na misoginia, nem no racismo.
      E, no fundo, são como o Menos: queixam-se da linguagem e comportamento dos outros, mas fazem exactamente o mesmo noutro contexto.

    • Ó Menos, nunca lhe disseram que é falta de educação ouvir as conversas das outras pessoas?

    • POIS! says:

      Pois! (citando:)

      “‘Esta moral vitoriana’
      o que tem a ver a simples decência ou bom gosto – ou o que queiram chamar-lhe – na linguagem com alguma moral vitoriana ou outra. Bem precisávamos cá dessas leis para se poder viajar em transportes píblicos sem ter que ouvir conversas e telefonemas na mais reles linguagem.”

      Gostámos sobretudo dos “transportes píblicos”. Não seria antes “transportes bíblicos”? Assim, tipo, sarças ardentes a voar e coisas do género!

      Realmente essas conversas incomodam muito e acentuam ainda mais a monotonia das viagens em transportes públicos. Por que não autorizar, em alternativa, as pegas de caras por grupos de forcados devidamente autorizados e auditados e outras atividades excitantes durante as viagens? Só se for por causa da oposição do do PAN! Chega, bandidos!

      • JgMenos says:

        Porque a imbecilidade é sempre prolixa?

        • Paulo Marques says:

          Porque falas pelo rabo.

        • POIS! says:

          Pois!

          (Citando JgMenos): “Porque a imbecilidade é sempre prolixa?”

          Não deixa de ser comovente que um ser da grandeza (*) de JgMenos se retrate em modo de autocrítica. Sem receio de continuar a ser pró-lixo!|

          Não pára este monumental ser, que é JgMenos, de nos dar lições de vida!

          JgMnenos: já terá seriamente pensado em se tornar pastor? Não propriamente dos seres com quem dorme, mas da IURD?

          A IURD abriu concurso para Pastores, pregadores da vida, com conhecimentos de Contabilidade! É o seu perfil, carago! Não perca esta oportunidade!

          (*) Segundo dizem, terá atingido mais de 1,51 m de altura! Oh, meu deus!

    • POIS! says:

      Pois!

      Realmente a “personalização dos mandatos” seria ótima!

      Por exemplo, entre o JgMenos e o Tiririca, deveriamos ter o direito de preferir o Tiririca, até porque tem muito maiores habilitações literárias.

      Infelizmente a lei portuguesa é como é e ficam os dois lá perdidos pelo meio das listas de suplentes do Chega, atrás de uma data de gajas que só lá estão por serem mulheres dos polícias candidatos do Chega. É indecente!

  3. Anonimus says:

    O Clinton foi destituído?

    Mentiroso ou não, vai ser reeleito. Devia dar que pensar.

    • j. manuel cordeiro says:
      • Anonimus says:

        Não chegou a concretizar.

        • j. manuel cordeiro says:

          Se quer uma resposta factual:
          “Clinton foi absolvido pelo Senado em 12 de fevereiro de 1999. Exigindo uma maioria de dois terços para a condenação, apenas 50 senadores (de 100) votaram pela acusação de obstrução e 45 pela acusação de perjúrio.”

          Para o próprio, pouca diferença fez.

          • Para o próprio fez imensa diferença. Não foi destituído e continuou o seu segundo mandato como se não tivesse acontecido nada.

          • j. manuel cordeiro says:

            Não é bem assim. Todo o processo pelo qual ele passou foi degradante.

  4. Paulo Marques says:

    Foi destituído porque mentiu ao senado, dando origem à famosa frase a discutir o significado do verbo “is”.
    Mas isso foi coisa de meninos. Imaginemos o Costa a dizer que só mandava ajuda a um país qualquer, mas que gostava que investigassem os negócios de um deputado, enquanto marcava uma reunião de líderes europeus numa propriedade sua. E depois os deputados invadiam a sala da comissão de investigação onde se discutiam as chamadas com segredos de estado e começavam a gravar.
    Tá tudo grosso.

  5. Manuel matos says:

    Eu acho graça é a ver/ouvir as alunos do ensino secundário, excelsas donzelas, a, em plena escola, projetarem homéricas caralhadas à velocidade de uma metralhadora com o freio nos dentes. São realmente o orgulho das senhoras suas (delas) mães

    • “projetarem homéricas caralhadas à velocidade de uma metralhadora com o freio nos dentes.”

      Ah poeta, pá!!! 🙂

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