Notas sobre as Presidenciais 1: António Costa, o grande vencedor da noite eleitoral

António Costa é, na minha opinião, e a par de Marcelo, o grande vencedor da noite eleitoral.

Porquê?

Pelos motivos que se seguem:

  1. Escolheu o candidato vencedor, antes mesmo do partido desse candidato, ou do próprio anunciar a (expectável) recandidatura, e anunciou-o publicamente, lançando Marcelo na corrida, a um metro de distância dele, sem lhe dar hipótese de fuga. Com isto colou-se à popularidade do presidente, garantiu a cohabitação pacífica para o mandato seguinte, quando a tentação de afastamento, pela impossibilidade de reeleição, poderia ser maior, garantiu a sua – não do PS – vitória nas presidenciais e poupou uns milhares ao seu partido, em falência técnica há vários anos.
  2. Fez Ana Gomes teve que penar para ficar à frente do herdeiro do salazarismo, confirmando a tese de que quem se mete com o PS leva, mesmo sendo do PS. Levou por ousar desafiar o líder supremo do PS, levou por ter estado com António José Seguro por altura do golpe palaciano de 2014, levou por afrontar Luís Filipe Vieira e levou por ser a única militante com peso interno a a abrir o armário dos esqueletos socialistas .Levou ela e levou o Pedro Nuno Santos por tabela, para não se armar em alternativa interna. Foi um 2 em 1 com um docinho para o delfim Medina, também ele apoiante de Marcelo.

  3. Cristalizou a posição do PS enquanto partido-charneira do regime, remetendo o PSD para uma luta à direita com o Chega. Com o resultado de André Ventura, e depois de ter sido o único responsável pelo rompimento do cordão sanitário, Rui Rio ficou ainda mais à mercê da extrema-direita, facto que fica mais que evidente após a reacção do líder do PSD aos resultados, a roçar o limite da alucinação, elogiando os resultados do Chega no Alentejo, onde os resultados do PSD tendem a ser miseráveis. Rio criou o monstro parido por Passos, mas por agora celebra a vitória de Marcelo, que hesitou em apoiar. Quando a espuma descer, o que fica é um partido em quedas constantes em todos os estudos de opinião, a perder eleitorado e quadros para o Chega. Não fosse a intervenção twilight zone de Francisco Rodrigues dos Santos, a fazer lembrar o ministro da propaganda do Saddam, enquanto o seu partido é devorado por André Ventura, e Rio teria sido o bombo da festa. Cairá antes das Legislativas.

  4. À esquerda, o cenário não é muito melhor. Marisa, sem surpresas, foi esmagada, fruto da factura do chumbo do OE21 (quem se mete com o PS, leva), da transferência do voto útil para Ana Gomes e das fracas prestações nos debates. Já no campo comunista, e apesar do PCP manter praticamente a mesma votação, e até subir ligeiramente no campo percentual, o primeiro ensaio do putativo sucessor de Jerónimo é muito fraco, apesar de uma campanha (muito) melhor conseguida que a de Marisa Matias. Se Marisa pagou a factura do chumbo do OE21, Ferreira pagou o estatuto de moleta da Geringonça. Saem ambos enfraquecidos, e, tal como acontece com Rio em relação a Ventura, mais à mercê de António Costa e do PS. E uma das explicações para este desfecho, talvez a mais significativa, é que, ao não apoiar Ana Gomes, António Costa forçou a transferência de milhares de votos destes partidos, em particular do BE, para Ana Gomes.

Até o liberal Mayan teve que lutar, taco a taco, com um socialista, antigo presidente de Rans, que agora se diz independente e que comeu a IL no Porto, o seu quartel-general. António Costa fez o pleno, sem desgastar minimamente o seu partido, poderá escrever no seu livro de memórias que retirou o seu partido da corrida por estar absolutamente focado na pandemia, algo que, não sendo verdade, será facilmente engolido por milhares, e viu a sua oposição – à esquerda, à direita e no interior do partido – saírem de cena ainda mais enfraquecidas. Se alguém me conseguir dizer como é que a noite lhe poderia ter corrido melhor, faça o favor de se chegar à frente.

P.S: Reparem que eu falei de vitória de Costa e não do PS. O PS pagará uma factura alta, muito alta, pelo tacticismo de Costa. Mas só mais lá para a frente. Deixarei essa parte para uma das próximas notas que publicarei sobre este tema.

Comments

  1. Tal & Qual says:

    Agora, digam lá que o Costa não sabe muito…

    Sabe mais a dormir que o RR acordado…

  2. Paulo Marques says:

    O grande vencedor é só um, o coisito. Conseguiu que se discutisse quase só a sua agenda mediática durante um mês sem quase se discutir a verdadeira agenda política de bananeirar o país, porque as pessoas sérias donas disto tudo e os seus capangas na CS assinam por baixo. Só ficam chateadas por se dizer em alta voz a parte racista e misogena que sustenta a preferência política.

  3. Filipe Bastos says:

    Ganhou o Bosta e ganhou o coisito. O João e o Paulo têm ambos razão. E como se vê pelas conclusões do Paulo, a esquerda ainda não percebeu porque continua o coisito a crescer. Salvo seja.

    Os ‘racistas misóginos’ são já 500.000. Continuem a chamar-lhes nomes; continuem a desdenhar da plebe.

    Adorei ver a Marisa, no intervalo do seu mega-tacho da Euromama, prometer embevecida continuar a “lutar connosco”. Assim também eu lutava, pensa a plebe, enquanto faz contas ao que podia comprar com 1/5 do tacho da Marisa. Nem só a direita vive numa bolha.

    Se a esquerda – esquerda a sério, não a máfia do PS – não ganha juízo, logo vê onde vai parar. O Chicão explica-lhes.

  4. Os comentadores políticos que atacam ferozmente os agentes da viragem à direita, no Ocidente Democrático, não sabem (ou não querem) explicar as verdadeiras razões dessa viragem. Isto é, não atribuem a atual situação, a decisões tomadas pelos governos democráticos do pós-guerra, durante 50 anos.

    A autorização de concentrações capital que criaram empresas grandes de mais para poderem falir e grandes de mais para não pagarem impostos.
    A autorização de criação de offshores e dos mecanismos que autorizam as empresas a usá-los para fugir aos impostos.
    A criação de leis da comunicação social que protegem os jornalistas quando publicam notícias comprovadamente falsas. Em qualquer outra atividade quem vende gato por lebre fica sem alvará para continuar a vender.
    O não combate à criação de lóbis dentro do sistema judicial, que conduzem à perda do direito à justiça para grande parte da população e pequenas empresas.

    Estes problemas não tinham expressão em 1950, mas é necessário corrigi-los agora, se quisermos inverter a viragem à direita das intenções de voto.
    Percebe-se agora que as democracias de inspiração anglo saxónica promovidas (e muitas vezes impostas) pelos anglo-saxões, no pós-guerra, traziam dentro de si regras que impediram os governos de atuar contra:
    1. A concentração do capital
    2. A fuga os impostos
    3. A manipulação da opinião pública
    4. A politização dos sistemas judiciais dos países
    Chegados a este ponto, não há mesmo nada a fazer, senão A Revolução. Deitar tudo abaixo. Quem está melhor posicionado para liderar essa revolução é o populismo. Como sempre.

    Chega? ou querem mais!

  5. Rui Naldinho says:

    O grande perdedor destas eleições chama-se Partido Socialista. Pelo menos no longo prazo.
    É o que dá quando alguém só vislumbra o presente e não consegue ver dois palmos à frente do nariz.
    Se por um lado sou capaz de compreender a posição de parte do PS, nomeadamente dos dirigentes que lideram este governo, em quererem colar-se a Marcelo, por incapacidade de eleger um candidato seu, tal como o fez Cavaco com Soares, acho que o PS, ainda assim, devia ter apoiado, no mínimo, uma figura independente, próxima da sua área política. Eu sei que esta pandemia criou constrangimentos vários a António Costa. Mas em política, quem não quer olhar em frente, acaba sempre refém do passado e do presente.
    Se é verdade que o PSD também sai perdedor nestas eleições, muito por culpa do Chega, haverá um dia em que o PSD com uma maioria relativa, relativíssima até, ficará acima do PS, mas já sem o CDS, que entretanto se há-de escapulir para o espaço celestial, ficando o Chega como segunda força à direita, bem mais forte do que o CDS de outras eras, a impor a sua vontade a todos os outros. Para mim, a Iniciativa Liberal é um flop. Nunca terá grande expressão eleitoral. Betinhos da Foz, vendendo algo que só é consumido por meia dúzia de novos ricos, à espera de uma oportunidade para fazer as delícias de uns quantos, na fuga fiscal, por exemplo, sob forma legal, tal como fazem as grandes corporações, mas de forma ilegal.
    Com esta atitude política, o PS está a criar o caldinho político para uma germanização da governação em Portugal. Com um PSD a breve trecho, liderando um governo minoritário, e um PS a apoiá-los, numa grande coligação, durante décadas, como acontece na Alemanha. Já vão na quarta legislatura consecutiva, sem ter a mínima hipóteses de se tornar alternativa de Poder.
    Mas isso ficará para um futuro próximo, caso nos mantenhamos vivos, e o Aventar continue a existir.

    • Paulo Marques says:

      Duvido que chegue a tanto, dando o quanto aceita a narrativa de que não só tem o monopólio da corrupção, como tudo o que faz é corrupção. Ninguém o salvará da continuação da manietação da procuradoria em processos que envolvem tudo e todos sem nunca acusar ninguém, tudo com o conluio de uma CS que come fugas plantadas de informação sem o mínimo de espírito jornalista.

      • Filipe Bastos says:

        Não sei se entendi: há duas ‘narrativas’? 1) o PS tem o monopólio da corrupção; 2) tudo o que faz é corrupção?

        A 1ª é claramente falsa; a 2ª nem tanto. Devo dizer que nunca ouvi a 1ª. A 2ª ouço-a muito. Mesmo muito.

        • Paulo Marques says:

          Ouve, ouve, até usa a palavra “xuxialismo” sem ironia. E nem é preciso acusações legais, quanto mais condenações. Alguém se lembra de Miguel Macedo, com o mesmo número de condenações que José Sócrates? Alguém fez mea culpa de maltratar o agora muito reconhecido chefe da ONU?
          Tudo o que envolve fornecer serviço público favorece alguém, porque a política é isso. E técnicos e empresas independentes é coisa que não existe. Para o resto espera-se uma magistratura que olhe para mais que o umbigo, mas nisso não interessa mexer, que dá jeito aos partidos das reformas.

  6. estevesayres says:

    Os Grandes vencedores foram: Costa (neoliberal com tiques fascistas) Rui Rio (social-democrata de direita) e Francisquinho (fascista)… se não se põem a pau os neofascistas do Chega, nas próximas eleições vão “tirar” votos ao PDS, CDS e PCP (social-fascista)!!!

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