Mais uma girl no posto

Lá está, Ana Paula Vitorino empoleirada no cargo de presidente do Conselho de Administração da Autoridade da Mobilidade e dos Transportes (AMT). O mandato tem a duração de seis anos e o Conselho de Ministros considera que a deputada do PS tem “idoneidade, competência técnica, aptidão, experiência profissional e formação adequadas ao exercício das respetivas funções”, evidenciadas pelo seu currículo.

Pois APV terá a maior competência técnica, mas, para um cargo destes, isso não basta. Segundo a associação Transparência e Integridade, está em causa um “conflito de interesses” por “Ana Paula Vitorino poder vir a pronunciar-se sobre o que a ministra Ana Paula Vitorino fez. Ainda que já esteja fora do Governo há cerca de ano e meio, ainda poderá ter que tomar uma posição relativa às suas anteriores decisões no Executivo”, defendeu, em declarações ao Expresso, Susana Coroado, presidente da associação.

Por outro lado, o deputado do PSD, Carlos Silva veio denunciar a promiscuidade de interesses pela ligação da ex-ministra ao ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita. Não é só o facto em si; é chocante a argumentação apresentada por APV em resposta à acusação: “Enquanto mulher não aceito nem aqui nem em qualquer sítio que ponham em causa a minha capacidade e independência por viver seja com quem for [com o ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita]”. “Isso chama-se machismo e misoginia”.

Ora, aproveitar a boleia de uma causa justa, como é a do necessário combate ao machismo, para escamotear a questão colocada, a saber, a promiscuidade de interesses, dá-nos uma dimensão dos critérios da sra. ex-ministra.

Mas foi nesta performance, em 2016 a promover o investimento de empresas americanas na exploração e produção de hidrocarbonetos em off-shore profundo que a antiga ministra do Mar melhor revelou o seu enquadramento, remetendo os cidadãos para uma caixa de sapatos, na ânsia do negócio. Disse assim, “Não temos em Portugal esses movimentos como há noutros países europeus contra esse tipo de exploração porque estamos a fazer as coisas de forma consistente, devagar, sim, mais devagar do que gostaríamos, mas é melhor assim porque estamos a explicar o que estamos a fazer (…)”.

Queria, nessa época, a sra. ex-ministra aliciar os americanos para que viessem esburacar o mar a 50 km da costa alentejana em busca de petróleo, por via daquela gulodice pelo negócio que tão presente está nos governos do centrão. Hoje, pelo facto de estes negócios nunca terem acontecido, o governo e a sra. ex-ministra deveriam agradecer expressamente, humildemente e devotamente aos portugueses que lutaram contra esta enormidade. Alguém consegue entender que, em 2016, ainda não tivesse chegado nadinha aos ouvidos da sra. ex-ministra sobre as alterações climáticas e a urgência de acabar com os combustíveis fósseis?? O que teria acontecido, se os valorosos cidadãos – os tais de movimentos que segundo a ex-ministra não existem em Portugal, mas que felizmente existem – não tivessem protestado com vigor contra essa obtusidade? A resposta é: Teria avançado investimento em “activos perdidos”, pelos quais ainda iríamos ter de pagar indemnizações astronómicas por decisão de tribunais arbitrais privados (ISDS), como é o caso da Itália, que está sujeita a poder ter de pagar A$371 milhões de indemnização à companhia petrolífera britânica Rockhopper Exploration, por, em 2016, ter proibido a perfuração num raio de 12 milhas náuticas da sua costa. Note-se que a Rockhopper apenas gastou A$39 milhões no projecto; porém, o obsoleto Tratado da Carta da Energia (TCE) protege não só os investimentos, mas também as “legítimas expectativas de lucro” das multinacionais. Mais dia, menos dia, saberemos como acabará esta saga, que decorre actualmente, já depois de a Itália ter saído do TCE em 2017. Como assim??? Eu respondo: Devido à escandalosa clausula de caducidade – também chamada Zombi – que garante a protecção aos investimentos durante mais VINTE (!!!) anos, após a saída de um país do TCE.

Voltando ao principal assunto do post: a sra. ex-ministra até pode ter a máxima competência técnica e profissional para o novo cargo e tem sem a menor dúvida “o direito de trabalhar para ganhar a vida”. Mas a sua forma de encarar os cidadãos a quem deve servir e que votaram o governo que a escolheu, deixa, com toda a certeza, muitíssimo a desejar.

Ocorre-me  repentinamente aquela canção fantasiosa que diz: O povo é quem mais ordena…

Que alucinada utopia!

 

Comments

  1. JgMenos says:

    Sendo uma excelsa representante do carácter e postura do verdadeiro ‘militante do P* Socialista’, nada a estranhar na nomeação.

    • Paulo Marques says:

      Não seja modesto, assentava que nem uma luva nas nomeações do querido reformista também.

  2. Paulo Marques says:

    Uma excelente nomeação para que ninguém no governo pense em alterar alguma sobre o rentismo e demais mendicidade privada.

    • JgMenos says:

      Já sabemos, desde que prometam assaltar a propriedade, sempre estás de acordo.

      • POIS! says:

        Pois temos todos de reconhecer!

        C’a g’anda resposta deu o Menos! Não se sabe é a quem, mas isso não lhe tira mérito!

      • Paulo Marques says:

        No dia que acontecer, ou sequer for proposto, poderá-se discutir.
        Mas é revelador que limitar o rentismo já é atacar a propriedade privada, tal o nível de comunismo no país.

  3. Júlio Rolo Santos says:

    Quando é um homem a. questionar as competências de uma mulher para desempenhar um determinado cargo é apelidado de machista e quando é uma mulher a fazê-lo? É por estas e por outras que as mulheres não se libertam quando são elas próprias a terem dúvidas sobre o seu papel e posição na sociedade que tanto reclamam de igualdade de gênero. Pelos vistos ainda temos um longo caminha a percorrer não é que eu me sinta desconfortável com a minha situação que ainda me permite obter algumas vantagens em vestir calças mas, já que estamos em maré de reclamar igualdade de gênero, que seja.

    • Paulo Marques says:

      Ela não tem dúvidas, é oportunista e sabe bem que não é o problema. Ou ia descobrir só agora que se importava com o que os outros acham?

  4. J. M. Freitas says:

    Na minha modesta opinião o problema da igualdade de género está mal posto. A obsessão pelo politicamente correcto começa a ser doentia. Recomendo a leitura, no blogue de Seixas da Costa (duas ou três coisas), do artigo sobre o filme o Meu Tio. É de loucos.
    Este artigo de Ana Moreno impressiona-me mais por me fazer recordar a mania da perseguição aos políticos. Há sempre algo contra a dizer. E, com tanta incompatibilidade, torna-se difícil arranjar Ministros. Verdadeiramente neutros, assépticos ou Santos retirados dos altares. Para se fazer carreira política tem de se ser sacerdote desde tenra idade. Sem mácula. E aceitar ser-se mal pago.
    É engraçado que muitas pessoas querem que os políticos não tenham regalias mas que sejam de grande qualidade! É difícil encontrar!

    • Filipe Bastos says:

      Freitas, Freitas. Por onde começar?

      “Mania da perseguição aos políticos”, Freitas? A sério?
      Aprecia então andar a ser enrabado há quatro décadas, com alegre desfaçatez e infrene impunidade, por esta pandilha de chulos e trafulhas? Se calhar até ajuda a aplicar a vaselina?

      “Aceitar ser-se mal pago”, Freitas? Quando estes parasitas mamam não só o tacho político e as respectivas regalias – cartões, subsídios e ajudas, carrões com motorista, etc. – como os inevitáveis tachos seguintes, públicos e privados?

      Por ex. o seu caro Seixas – sabe a mama privada desse xuxa?

      Mal pagos comparados com o quê? Com o Mamão Mexia, esse ex-pulhítico? Ou com as carreiras medíocres que 99% deles teriam sem a porca da pulhítica?

      Ninguém quer santos, Freitas. Só políticos que sejam sujeitos a validação e escrutínio, não pelo esgoto partidário como agora, mas por entidades fora das suas patas que os vigiem, responsabilizem e punam efectivamente.

      E que as suas nomeações e decisões, em vez de serem o que lhes dá na gana, passem a ser também sujeitas a escrutínio. Uma coisa chamada democracia, já ouviu falar?

  5. Júlio Rolo Santos says:

    Estas nomeações já vêm do antigamente é vão continuar porque o sistema não dá sinais contrários. Como inverter a situação? Dão -se alvíssaras a quem encontrar a solução que não passa por bater sempre nos mesmos. Todos são cúmplices da direita á esquerda passando agora pelas extremas.

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