O PCP e outras mortes anunciadas

Há pelo menos uns 20 anos que ouço a direita, e também alguma esquerda, anunciar a morte do PCP. Over and over again. E os comunistas lá se vão “aguentando”, com o quarto maior grupo parlamentar num hemiciclo com nove partidos, que eram 10 no início da legislatura, e uma sólida terceira posição no mapa autárquico, só ultrapassado pelos dois partidos que controlam o sistema. Caso para dizer, parafraseando Mark Twain, que mais de duas décadas de notícias sobre a morte do PCP foram manifestamente exageradas.

Do outro lado do espectro temos o CDS, também ele fundador da democracia portuguesa. Esteve na AD, esteve nos dois governos de direita deste século, onde ocupou pastas importantes, tem presença autárquica significativa, ainda que, essencialmente, numa relação com o PSD cada vez mais idêntica àquela que Os Verdes têm com o PCP, e, não há muito tempo, a sua anterior líder, Assunção Cristas, afirmava estar preparada para governar o país.

Hoje, reduzido a um grupo parlamentar de cinco deputados, em guerra aberta com a liderança de Francisco Rodrigues dos Santos, ninguém ousava anunciar a sua morte política. E, a julgar pelos últimos dias, com a debandada geral do que restava do portismo, para não falar na sangria de activos que rumaram à IL e ao CH, em curso há dois anos, tudo indica que poderá desaparecer bem antes do PCP. Ou pelo menos ser reduzido à insignificância de um MRPP.

Sabem porque é que o PCP não desaparece (penso eu de que, claro)? É que, concordemos ou não com as suas posições, com as suas lutas ou com a sua ideologia, o PCP tem quatro características, a meu ver essenciais, que nunca se lhes poderão ser subtraídos, e que lhe garantem uma consistência ímpar no sistema político português: 1) pagou com o próprio sangue o combate que travou com o regime fascista, fundamental para o sucesso do 25 de Abril, 2) é o único partido que luta, há 47, pelos direitos dos trabalhadores de forma consistente e com resultados práticos e 3) é ideologicamente estável e coerente, e 4) é um partido sério e responsável, que se move pela causa pública, o que explica porque até a direita sela acordos autárquicos com o PCP. Aliás, se duvidas restassem, basta ver o que aconteceu recentemente em Coimbra, onde a coligação liderada pelo PSD, que ganhou com maioria absoluta, e sem precisar de acordos adicionais, convidou o vereador eleito pelo PCP para assumir uma pasta na vereação. Em suma, sabemos o que podemos esperar do PCP. O mesmo não poderá ser dito sobre os restantes. E isso não é um detalhe. Porque o mundo real é bem diferente dos nossos dogmas, das nossas certezas e das nossas bolhas no Twitter ou no Facebook.

Comments

  1. José Meireles Graça says:

    Credo, até fiquei um bocadinho entusiasmado. Mas não muito, porquanto: i) O que foi fundamental para o sucesso do 25 de Abril foi o beco sem saída da guerra colonial, não as lutas do PCP; ii) Os direitos dos trabalhadores são assegurados em muitos lados onde não existem praticamente partidos comunistas e não são em nenhum em que partidos comunistas tenham acaparado o Poder; iii) O CDS talvez desapareça, mas o fascismo (na definição do PCP, que tornou a palavra um mata-borrão) continua bem servido, através do Chega!, IL e PSD (este tem dias, às vezes é mais e outras menos).

  2. JgMenos says:

    Nem me falem do desaparecimento do PC!

    No seu tempo, como associação de agentes soviéticos, já justificou o Estado Novo.

    E com o seu comunismo sempre justificará que a Direita se assuma de vez como anti-socialista, no que já está atrasada umas dezenas de anos.

  3. Filipe Bastos says:

    Aproveitando a boleia do José Graça:

    1) Malta como o Mendes insiste em romantizar o 25 Abril, essa mera golpada corporativa. Sem a mama dos oficiais do quadro não havia 25 Abril. Em que foi o PCP “fundamental”?

    2) O PCP luta realmente pelos direitos dos trabalhadores. É verdade. Pena meter todos os ‘patrões’ no mesmo saco, como se uma micro-empresa tivesse algo em comum com a PT ou a SONAE.

    3) e 4) É estável e coerente. Verdade. Sério e responsável… mais que o Centrão Podre, sem dúvida. Não se vê melhor que o PCP.

    Mas isso, neste esgoto partidário, não é dizer muito. O PCP nunca foi democrático. Adaptou-se a esta (pseudo-)democracia, que remédio, mas a sua teoria e práxis são do início do século passado. O mundo do PCP morreu há largas décadas.

    A obsessão com o ‘fascismo’, o bacoco tratamento por ‘camarada’, a cassete da ‘política patriótica e de esquerda’, a indefensável defesa de regimes atrozes, a hipocrisia do património imobiliário e da fuga aos impostos na festarola do Avante, a conivência com o Partido da Sucata… o PCP precisava de levar uma grande volta.

    • Luís Lavoura says:

      O PCP luta realmente pelos direitos dos trabalhadores. É verdade. Pena meter todos os ‘patrões’ no mesmo saco, como se uma micro-empresa tivesse algo em comum com a PT ou a SONAE.

      Que disparate. O PCP passa a vida a falar bem de, a a defender, os microempresários.

    • João L Maio says:

      Filipe Bastos,

      Só um reparo: quando diz “(…) Pena meter todos os ‘patrões’ no mesmo saco, como se uma micro-empresa tivesse algo em comum com a PT ou a SONAE.”, isto não representa a verdade.

      O PCP, por mais do que uma vez, tanto através de propostas concretas, como em declarações por demais conhecidas, defende e defendeu as PME. Tal como o Bloco, diga-se.

      É um argumento que a direita usa incessantemente, dizendo que BE e PCP são contra os negócios privados TODOS, o que não é, de todo, um facto. Basta ler programas dos partidos.

    • Filipe Bastos says:

      Que disparate. O PCP passa a vida a falar bem de, a a defender, os microempresários.
      O PCP … defende e defendeu as PME.

      Como sabe que são muitos, não quer perder (todos) esses botinhos. E como o Naldinho já constatou, o PCP adapta o discurso: de manhã vocifera contra os ‘patrões’, à tarde chora os que ficam de fora dos apoios do Estado.

      Bem no fundo, porém, vê todos como kulaks: por vontade do PCP só havia Estado. Tal como se adaptou à ‘democracia’, lá teve de tolerar o privado. Que remédio.

      Nisto esquerda e direita são parecidos: só gostam do que é grande. A direita defende os grandes mamões; a esquerda saliva por gigantes estatais. Sob as ordens do Comité Central, claro. Quem não gostar leva o tratamento de Kronstadt.

      • Paulo Marques says:

        E ainda não foi cancelado para um Gulag? Fraquitos, pá.

  4. Rui Naldinho says:

    A verdadeira razão para a sobrevivência do PCP no espectro político português, está na raiz da sua fundação, assente numa importante participação operária e sindical.
    Alvaro Cunhal assentou sempre a sua ação com base numa premissa. “O PCP não pode ser dominado pelas elites intelectuais do partido, porque tendo elas uma visão mais crítica do comunismo à escala internacional, mesmo sendo militantes com participação na luta política, na clandestinidade, mais tarde ou mais cedo terão a tentação reformar o partido”, ou de, segundo a sua óptica leninista, subjugar o partido a uma nova ordem política.
    Contrariamente a outros partidos comunistas cujas lideranças foram sempre dominadas por intelectuais, o comité central do PCP foi sempre dominado por sindicalistas.
    Ao longo de mais de vinte anos vimos sair do partido figuras importantes, quase todos eles intelectuais, mas o partido resistiu, contrariamente ao que aconteceu em França, Espanha e Itália, cujo apetite reformador, o chamado eurocomunismo, acabou absorvido por partidos sociais democratas e de esquerda fora do quadro da internacional comunista.
    É óbvio que com o envelhecimento do partido, este envelhecimento assenta na sua própria memória histórica, que se vai desvanecendo no tempo, o PCP vai perdendo ímpeto e militância, e tende a transformar- se num partido com pouca expressão eleitoral face a um passado em que condicionava e parava o país.
    Já o CDS é diferente. Até à saída de Freitas do Amaral da liderança do partido, os chamados democratas cristãos tinham alguma autonomia, dentro do espectro da direita, até pela desconfiança que mantiveram durante algum tempo com o PSD, um partido, esse sim populista, de matriz liberal, cujos sociais democratas, os poucos que estiveram na fundação do partido saíram com as Opções Inadiáveis. Acresce que a postura de Mário Soares em face da tentativa de domínio comunista em Portugal, barrando-lhes o caminho com ajuda dos EUA através de Frank Carlucci, abriu uma janela de oportunidade entre ambos os partidos, como interlocutores válidos.
    A partir da entrada de Lucas Pires, tudo se alterou no CDS. O partido veio sempre a definhar, e não tivesse sido a entrada de Paulo Portas que tinha sido director de um semanário de referência no período Cavaquista, com muita popularidade em vários sectores de quadros e intelectuais; não esquecer que nas duas legislaturas anteriores, o CDS tinha sido esmagado pelos voto útil, transformando- se no célebre partido do Táxi, mas, dizia eu, não fosse o Paulinho das Feiras, o mais provável nesta altura era o CDS não existir.

  5. Luís Lavoura says:

    Em suma, sabemos o que podemos esperar do PCP.

    Tem razão. Ao contrário do que acontece que o BE, por quem sabemos que podemos a qualquer momento ser atraiçoados. O PCP é um partido fiável. O BE, não.

    • Rui Naldinho says:

      Essa teoria é para mim mais um daqueles mitos que o tempo se encarregará de demonstrar como uma verdadeira treta. O PCP é um partido léniniste, e só isso já nos dá uma garantia de ortodoxia ideológica.
      Dou apenas um exemplo:
      Qual a razão para o PCP defender as touradas?
      A grande zona de implantação do PCP é o Alentejo, o Ribatejo e a cintura industrial de Lisboa, incluindo a margem sul. Essas zonas são por tradição popular muito ligadas às chamadas “artes tauromáquicas”. O PCP numa estratégia fria e calculista, jamais iria hostilizar o seu eleitorado tradicional por causa de uma dúzia de touradas.
      No Norte e Centro de Portugal os comunistas são tão anti touradas como todos os outros cidadãos simpatizantes de outras formações políticas, que se manifestam contra este espetáculo. Não podem é destoar do partido e calam-se.
      Se o PCP como partido de matriz operária é contra o capitalismo, qual a razão para defender o regime chinês, russo, e a oligarquia angolana, por exemplo?
      Não serão eles nos dia de hoje, coisas similares aos outros países capitalistas?
      Claro. Mas o PCP é um partido com uma enorme fobia ao imperialismo Norte Americano, assente nas multinacionais e no financeirismo. Já no que concerne ao Imperialismo Russo ou Chinês já tem uma posição completamente diferente. E em relação a Angola, também. Desde que eles continuem a ser anti americanos, no mínimo tolera-os.
      Eu diria que o PCP é sim um partido previsível, mais do que confiável.
      Já o BE com uma história de trinta e poucos anos, sendo a aglutinação de vários pequenos partidos, com várias tendências e visões da gestão política, é um partido muito mais aberto. Depois, sendo um partido com uma forte raiz intelectual e universitária, acima de tudo urbano, com vários protagonistas a marcar posição em nome próprio, pedir-lhes que votem à PCP, seria provocar a sua implosão.
      E por isso que o BE passa de 10% do eleitorado para 6%, e vice versa. Ninguém vive amarrado a dogmas.

      • Luís Lavoura says:

        O PCP é um partido fiável na medida em que cumpre com os seus compromissos e negoceia com seriedade e sem jogos duplos.
        O BE, pelo contrário, não tem fiabilidade, como se observou à saciedade nas negociações para diversos Orçamentos de Estado, em que o BE vinha cá para fora dizer à imprensa aquilo que se passava nas negociações, dessa forma atriçoando e quebrando a confiança dos parceiros negociais. O segredo é uma importante regra da diplomacia. Só se divulga publicamente o resultado final de uma negociação, não as propostas intermédias.
        O BE não é um partido sério, responsável e adulto. Trata-se de um conjunto de adeptos da “revolução permanente”, sempre prontos a atraiçoar e a adotar propostas inexequíveis.

        • Rui Naldinho says:

          “Trata-se de um conjunto de adeptos da “revolução permanente”, sempre prontos a atraiçoar e a adotar propostas”.
          Adoro esses bitaites. Isso é primário, meu caro.

          Responde-lhe eu:

          Tal como dar 100.000 000,00€ de borla fiscal à EDP.
          Tal como pagar 11,5 milhões de horas extraordinárias, só em 2021, no SNS. Cujo custo será (?). Atire um número a ver se sabe? E o ano ainda não acabou. Falta o início do Inverno e o final do Outono.

          Sendo um partido confiável, não percebo então qual a razão para o PCP não votar este orçamento para 2022, no mínimo com a abstenção, como fez o ano passado.
          E já agora, qual a razão para o PS não querer acordos escritos com lhe foi solicitado no início da legislatura.
          Que me recorde, na legislatura anterior 2015-2019, ninguém questionou o acordado na chamada Posição Conjunta.
          Aliás se alguém tentou fugir com o rabo à seringa, foi o PS que a meio da legislatura se preparava para baixar a TSU aos patrões e alguém lhe teve do lembrar (Verdes), que no acordo os aumentos salariais jamais poderiam ser compensados com baixas na TSU, do lado do patronato.
          Mas claro, isto é só para quem não vive de sound bites.

          • Luís Lavoura says:

            não percebo qual a razão para o PCP não votar este orçamento para 2022

            Simples: o PCP percebeu finalmente, depois de três eleições consecutivas em que perdeu muitos votos, que era impopular junto dos seus eleitores permitir a continuação do governo PS. Por isso negociou pedindo de mais e depois, vendo que – naturalmente – o PS não lhe concedia esse demasiado, votou contra.

            O BE, mais espertinho, já no ano passado tinha percebido que os seus eleitores não estavam a gostar da “aliança” com o PS, e saltou do barco já no ano passado. O PCP, mais sério, ficou mais um ano no barco.

            O BE contava evidentemente que o PCP continuasse a sustentar o governo. Isso era bom para o BE, e mau para o PCP. Infelizmente para o BE, o PCP não aceitou o bluff que este fez e deciciu votar contra. Agora vão-se lixar ambos na próxima eleição – tanto BE como PCP vão perder imensos deputados.

        • Paulo Marques says:

          Bem, se os democratas sérios só negoceiam atrás da porta fechada, ainda bem que não são democratas sérios; para isso já temos as democráticas NATO, UE, ISDS e por aí fora.
          Quanto a compromissos, que compromissos? Os da cabeça dos responsáveis pelo estado de coisas? Que nem admitem o que escrevem no programa, como a semi-privatização das pensões, de tão sérios que são?

        • Rui Naldinho says:
          • Carlos Almeida says:

            Muito bem Rui Naldinho

            “Antonio Costa nunca quis aprovar o OE22”

            Só não percebe isso, muito bem explicado no Expresso, quem for intelectualmente desonesto.

            Mesmo dentro do PS há muita gente que já percebeu do golpe do António Costa

      • Paulo Marques says:

        Fazem muito bem em ter posições alimentadas pelo pragmatismo; podiam era fundamentá-las fora de dogmas que assustem democratas e amantes de direitos humanos. Não que seja fácil de explicar, mas é a vida.

  6. Ah ah ah! O BE adapto da revolução permanente??? Não foram a Catarina e a Marisa que se declararm social-democratas? Caiam na real, camaradas….

    • Paulo Marques says:

      Então não? Todos os dias apelam à criação de milícias para expropriar o capital e destruir os meios de produção que não interessem. Aliás, se há falta de habitação e emprego é pela ocupação organizada da propriedade a bem da revolução em curso.

  7. estevesayres says:

    Os verdadeiros marxista, não mudaram de opinião politica sobre P”C”P!
    Um partido revisionista e social-fascista…

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