Mil águas tem o Rio

Fotografia: José Coelho/EPA

Rui Rio foi reeleito, no Sábado, líder do PSD, derrotando Paulo Rangel nas directas do partido.

Depois de meses a dá-lo como morto, Rui Rio consegue, mais uma vez, uma importante vitória (sobretudo pessoal), sempre com aquela postura de cão-que-ladra-e-não-morde mas, quando consegue as vitórias que nem o próprio acredita serem possíveis (foi assim com Montenegro, foi assim nas Autárquicas em Lisboa, foi assim agora nas directas frente a Rangel), lá se agiganta no discurso e faz do seu latir um rugir que ecoa… na sua própria consciência.

Agora, tem duas opções muito claras: ou faz o que diz que quer fazer, que é, em caso de perder as Legislativas, juntar-se ao PS na aprovação de matérias de fundo, tais como reformas estruturais e Orçamentos de Estado, na constituição de um (informal) Bloco Central, ou tenta arregimentar as tropas à sua Direita e joga com o binómio Esquerda-Direita. Rio sabe que a melhor forma de estar perto do Poder, não o representando, é dar-lhe colo. E está pronto para dar colo a António Costa, para que o país não caia nas mãos de uma Geringonça 2.0, cenário dantesco para o PS… e para a Direita (o que, nos dias de hoje, já nos soa a redundância). O agora novo-velho líder do PPD jogará com isso, tentará fazer pressão sobre o Partido Socialista durante a campanha e, prevê-se – porque foram os sinais dados durante a campanha autárquica -, um ataque feroz (nunca coerente, mas feroz) à Esquerda parlamentar. Se tiver sorte, ou, por outras palavras, se António Costa e o PS meterem os pés pelas mãos, tanto na governação que ainda resta até lá, como durante a campanha, Rio poderá sonhar, com legitimidade, com uma vitória a 30 de Janeiro. Basta saber interpretar o que se passou na Câmara Municipal de Lisboa, inspirar-se nisso e rezar. E rezar muito. Na pior das hipóteses, fica tudo na mesma e: 1. o PSD aceita ser, de novo, oposição com Rio, mas desta vez a sério; ou 2. Rui Rio vai dar a volta ao bilhar grande e entrega essa oposição a outro.

Em suma, o PSD fica igual, sabendo que terá de ser diferente daqui em diante. Sabe-o porque joga a sobrevivência do partido ao Centro. Sabe-o porque reconhece a ameaça de poder vir a ser engolido totalmente pelo PS, por um lado, e de ver a extrema-direita roubar-lhe espaço, à sua Direita, por outro.

Rui Rio está mais vivo que morto. Resta saber se não vai, como de costume, deixar-se secar antes de desaguar.

Comments

  1. Alexandre Barreira says:

    ….o Costa que tenha cuidado a atravessar o Rio….as “correntes” podem atraiçoá-lo……!!!!

  2. Rui Naldinho says:

    Boa análise, João. Com lucidez e sem a clubite que alguns opinadores da nossa CS debitam, a roçar a estupidez.
    Não desvalorizo esta vitória de Rio. Acho que ela pode ter até uma certa dinâmica de vitória, e quem sabe, acabar por “meter o dedo no cu de António Costa”.
    Por outro lado demonstra que mesmo dentro do velho PSD há quem se recorde do nefasto legado de Passos.

    Há um factor para mim decisivo no resultado do próximo acto eleitoral. A gestão da pandemia até ao dia 30 de Janeiro de 2022 por parte deste governo.
    O PS já percebeu que se esta merda correr de novo mal, para lá caminha, salta fora do governo.
    Não é que Costa já está disposto a abrir os cordões à bolsa para contratar tudo e todos, que não faltem médicos, mas reformados, para apoiar o SNS até ao final de 2022. Mas como sempre, assente na técnica do “remendo”.
    Se não voltar a acontecer uma pré rotura do SNS como aconteceu no ano passado e início deste, com aquele caos, as ambulâncias horas e horas à espera nos parques de estacionamento dos hospitais, as UCI esgotadas e a ter de transferir doentes, se o processo de vacinação acabar por correr bem, Costa e o PS ganharão quase de certeza. Caso contrário, podem entregar o poder a Rui Rio.
    O engraçado vai ser ver o PS a ser muleta do PSD num governo de bloco central, mesmo que toda a esquerda tenha mais deputados. É que desta vez, BE e PCP exigiriam ao PS acordos assinados e escritos, com tudo escalpelizado, incluindo datas. Desta vez as cativações já não funcionariam e aí o PS não arrisca.
    Admitindo que o PS ganha com uma maioria relativa similar à anterior, mais deputado menos deputado, que não haja dúvidas, o Centrão reeguerse-à. É para mim é nisto que Rio aposta. Retirar o PS da Geringonça. Resta saber qual será o preço a pagar pelos socialistas. Se o preço social for alto, ao fim de dois anos de legislatura, a factura será paga pelo PS, muito mais do que o PSD.

    • Paulo Marques says:

      Ai, acontecer acontece, nem é preciso falta de capacidade para acontecer, tal o cansaço, o caos, e a falta de investimento que anda na saúde. Não há resiliência que resista.

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