Algumas confusões (minhas) sobre Educação para a Cidadania

Faz-me confusão que faça tanta confusão a tanta gente a existência de uma disciplina ou de uma área disciplinar ligada à cidadania.

Faz-me confusão que seja considerado fundamental por tanta gente a existência de uma disciplina ou área disciplinar ligada à cidadania.

Faz-me confusão que haja tantas pontes queimadas entre quem se interessa por Educação e que as políticas educativas continuem a ser imposições erráticas e avulsas com origem em gabinetes ministeriais e/ou departamentos universitários carregados de gente que se julga dona da Educação, incluindo a que se refere ao ensino básico e ao ensino secundário.

Faz-me confusão que haja quem pense que é possível estar na Escola sem aprender, directa ou indirectamente, cidadania.

Faz-me confusão, a propósito dessa aprendizagem inevitável, que haja quem pense que é possível ensinar Humanidades, Ciências ou Artes sem fazer referências constantes a questões e problemas de cidadania.

Faz-me confusão que haja quem acredite que é possível viver numa escola asséptica e absolutamente imparcial, em que os professores não tenham opiniões ou preferências ideológicas, religiosas ou clubísticas. Aproveito este ponto para informar, para grande surpresa de uma larga maioria, que os professores são pessoas, sendo que alguns chegam a ser pais.

Faz-me confusão que haja quem acredite que os professores são, na sua larga maioria, pessoas sem o mínimo de ética, que aproveitam todos os momentos para catequizar os pobres alunos, arrastando-os para o seu partido, para a sua religião, para o seu clube ou para a sua associação recreativa.

Faz-me, aliás, confusão que haja quem acredite no poder absoluto da catequização dos professores, como se a palavra dos professores (ou de outros educadores) fosse imediatamente obedecida. É, aliás, por isso, que os alunos nunca deixam de cumprir instruções do professores e é também por isso que os filhos nunca desobedecem aos pais.

Mudando, aparentemente, de assunto, faz-me confusão que uma certa direita viva obcecada – até talvez acredite nessa obsessão e isso não nasça da desonestidade – por esta questão da catequização, por este magno e imaginário problema do marxismo cultural e derivados. Todos os que tiveram oportunidade de frequentar a escola do Estado Novo sabem o que era verdadeiramente catequização.

Faz-me confusão, por falar em catequização, que muita direita desmiolada se tenha atirado ao ar quando Rui Tavares apareceu de relance na telescola, quando neste país dominado pelo socialismomarxismoestalinismocomunismo, a televisão pública pagou a um antigo ministro de Salazar para expor as suas ideias sobre História de Portugal, durante anos. Nem Nuno Melo nem outros da mesma espécie rasgaram vestes perante a entrega de dinheiros públicos a alguém que não escondia – nem tinha de esconder – a sua ideologia e até as suas crenças. Com José Hermano Saraiva, houve muita gente que ficou a gostar de História, mesmo sabendo-se que José Hermano Saraiva estava longe de ser um bom historiador ou mesmo um historiador.

Não me faz confusão que um pai ou um encarregado de educação ou mesmo alguém que não tenha filhos faça propostas ou críticas no que se refere a um assunto como a Educação, que é tão fundamental que tem de ser da responsabilidade de todos. Faz-me confusão que, em nome dessas críticas ou dessas propostas, um pai faça com que os próprios filhos fiquem reféns de uma causa, recorrendo, ainda por cima, a um argumento muito em voga entre uma direita que parece ter descoberto a liberdade há tão pouco tempo que parece não saber muito bem em que consiste ou o que fazer com ela.

Comments

  1. Paulo Marques says:

    «Faz-me confusão que seja considerado fundamental por tanta gente a existência de uma disciplina ou área disciplinar ligada à cidadania.»

    Heh.
    É o problema quando se preconiza o fim da história e ela continua a não acabar, tem que se encontrar culpados em número cada vez maior por razões cada vez menos racionais à medida que o inevitável se torna cada vez mais risível. A ideologia não falha, só pode ter sido falhada desde a nascença.

  2. Filipe Bastos says:

    Não acredito que lhe faça assim tanta confusão:

    A cidadania é bonita, mas cabe lá o que cada um quiser. Para a direita cabe conformismo ao status quo, respeitinho à autoridade e aceitação da desigualdade. Não cabe a cangalhada PC e woke da esquerda actual. Sabe que é isso que está em causa.

    Os professores são injustamente acusados de doutrinação? Claro: quando o Dioguinho e a Inês não pensam como os seus papás de classe média esperavam, alguém tem de ser culpado.

    Diz que o tal pai deixa os filhos “reféns de uma causa”. Talvez, mas num país de meias-tintas esse pai assume uma posição. Houvesse quem protestasse e resistisse a este regime podre.

  3. Daniel says:

    Tanta confusão…

  4. Daniel says:

    Tanta confusão!….

  5. Faz-me confusão tanta superficialidade num só texto.

    • António Fernando Nabais says:

      O que vale é haver comentários profundos.

  6. Fernando Manuel Dias de Lemos Rodrigues says:

    Faz-me confusão que o facto de alguém lutar por algo que acha ser um direito fundamental seu e uma questão de princípio seja considerado estranho.

    SE esse alguém estivesse em greve de fome a lutar pelo direito a casar com uma pessoa do mesmo sexo ou a suicidar-se de forma medicamente assistida já seria considerado um herói.

    É essa dualidade de crotários que me faz confusão.

    • António Fernando Nabais says:

      É favor reler com atenção o último parágrafo.

      • POIS! says:

        Não! É mesmo assim!

        Trata-se de um critério eivado de ingenuidade.

  7. Fernando Manuel Dias de Lemos Rodrigues says:

    Como muito bem disse (e aí concordamos a 100%) cidadania está presente (ou deve estar presente) em todos os actos educativos, e não é algo que se “ensine” – é algo que se pratica diariamente.

    Logo, uma disciplina que pretenda “ensinar” Cidadania mais não é que uma disciplina doutrinária. Sobretudo quando os adolescentes saem do Ensino Secundário sem quaisquer noções sobre como governar economica e financeiramente a sua vida, sobre o que são e para que servem (ou deveriam servir) os impostos e a fiscalidade, sobre as relações de trabalho, sobre o que é a economia de uma família, de uma empresa e de um país, sequer com noções básicas sobre qual o sistema político/administrativo que nos governa.

    Aos 18 anos vão votar, e nem sabem exactamente o que está em causa em cada uma das votações onde o seu voto também irá fazer parte da decisão.

    Mas sabem tudo sobre as causas “woke” da moda, isso sabem.

    • António Fernando Nabais says:

      Afirmar, com base na premissa, que uma disciplina de Cidadania só pode ser doutrinária deve ser um recorde olímpico qualquer

      • POIS! says:

        Claro! Até porque nada é mais “doutrinário” dentro de uma disciplina que fora dela.

    • Paulo Marques says:

      Sim, a educação precisa de mais interseccionalidade em todas as matérias, porque a luta é toda a mesma.

  8. Presumo que já não faça confusão ao autor que a RTP 1, paga pelos impostos de todos os portugueses, tenha escolhido o dia de ontem (a 6 semanas das eleições legislativas) para começar a transmitir, depois do telejornal, um programa chamado “Estado Social – Todos por Todos” (“Estado Socialista – Tachos para Todos” dava muito cana). Lá está: não é doutrinação, nem propaganda, paga por todos, ao serviço de alguns. É apenas informação. Há é pessoas que vêem mal em tudo.

    • Perdão, o nome original da séria era “Estado Socialista – Taxas para Todos” – os tachos, naturalmente, são só para alguns.

    • António Fernando Nabais says:

      Ao autor nem sequer faz confusão que o José Hermano Saraiva tenha vivido à custa do erário público a vender uma coisa vagamente parecida com História. Quando ao resto, cruzes, credo! Estado Social? Todos por Todos? Isso até se pode confundir com humanidade ou com cristianismo ou com solidariedade ou, pior, com civilização! O programa começa por fazer referência à esperança média de vida e à taxa de analfabetismo no início do século XX. Confesso que não vi o resto, mas vou fazer um esforço, enquanto me desvio das milhentas tentativas de catequização a que sou sujeito a toda a hora.

      • Não vi, só vi que estava a dar – mas tenciono ver. Se não estranha a RTP considerar oportuno programar séries que ecoam o “slogan” de um partido político na véspera das eleições, também imagino que não estranhe a RTP ter considerado inoportuno transmitir reportagens incómodas a esse mesmo partido porque se estava na véspera das eleições. É a moral da prima Flor.

        • António Fernando Nabais says:

          Não me lembro do “slogan”, mas, de qualquer modo, não sou eleitor do partido que está no governo. Aliás, já há muitos anos que não contribuo com votos para partidos de governo. Mas gosto muito de quem vê conspirações e catequização em cada esquina.

    • Paulo Marques says:

      Estou mais preocupado como é que ainda paga ordenado ao Carlos Daniel e fazia fretes à Sandrinha do que essa coisa horrível que é o estado social.

  9. JgMenos says:

    «Todos os que tiveram oportunidade de frequentar a escola do Estado Novo sabem o que era verdadeiramente catequização.»

    Sabes é nada!
    Só os doutrinadores de hoje imaginam que o anterior regime fazia algo de parecido com a dose de corretês que todo o imbecil se sente motivado para impingir.
    Deus, Pátria e Família, não requer a multidão de tretas que por aí andam em constante promoção.

    • António Fernando Nabais says:

      Só um fascistoidezinho de palas é que pode acreditar que o Estado Novo não era uma máquina espectacular de propaganda e de catequização. Ou usas palas ou não lês. Vai estudar, coisinho. Para além de ler, ainda falei com muita gente. Outra coisa, ó reles: eu acabei a Escola Primária exactamente em 1974, vê lá tu. Ninguém me contou o que era estudar História de Portugal nesse tempo, entre outras matérias carregadinhas de ideologia e vazias de rigor. Tu não sabes nadinha.

      • JgMenos says:

        Tadinho, que ainda sofreu a propaganda fascista!
        Ensinaram-lhe aqueles horrores de tirar Lisboa aos mouros como se fosse uma coisa boa, para agora termos tanto fdp lá concentrado.
        E às tantas disseram-lhe mal da Primeira República, esse puteiro que nos levou à 1ª GG por causa de manter as colónias, essa horrível exploração.
        Pior ainda se o quiseram convencer que os terrorista só iriam levar a miséria ao Ultramar, que esses fascistas eram capazes de dizer todas as enormidades.
        E a democracia? Nem sei o que poderiam ter-lhe dito; às tantas que era o melhor regime para oportunistas, chulos e treteiros!

        As melhoras para esse trauma histórico.
        Tadinho!

        • António Fernando Nabais says:

          Ó meu ruminantezinho de quatro joelhos, pede que te mudem as ferraduras, que deves andar com dores nas articulações, tadinho. Despacha-te, que Nossa Senhora, São José e o Menino Jesus precisam de ti para fugir para o Egipto.

        • Paulo Marques says:

          Isto de achares que serias um português privilegiado, invés de mais um à rasca para ter casa, comida e roupa lavada só porque repetias a cartilha, nunca deixará de ser hilariante.

    • POIS! says:

      Pois estou a ver!

      Que V. Exa. deve ter andado no Liceu Nacional das Berlengas.

      Porque lá os currículos eram muito diferentes. E mesmo os programas.

      Por exemplo a História, cá diziam à malta que ganhávamos todas as batalhas aos espanhóis. Lá não. Diziam a verdade. Empatámos duas e ganhámos outra nos penalties.

Discover more from Aventar

Subscribe now to keep reading and get access to the full archive.

Continue reading