Cavaco, coragem e ressentimento

Via Rádio Renascença

Cavaco Silva fez nova uma pausa na faustosa reforma, para mais do mesmo: malhar em António Costa. Com total legitimidade sublinhe-se. No fundo, e perante a perda de protagonismo e influência do seu partido, em queda livre desde que foi primeiro-ministro, Cavaco faz aquilo que ninguém no PSD parece ser capaz de fazer: oposição. Para quem tantas vezes afirmou que não era político, não há meio de se libertar da política.

Cavaco acusa Costa de falta de coragem. E, se há alguém neste país que está habilitado a dar lições de moral e bons costumes sobre coragem, esse alguém é Cavaco Silva. Porque de coragem perceber ele:

Da coragem de votar contra a libertação de Nelson Mandela, em 1987.

Da coragem para mandar carregar com violência sobre os manifestantes da Ponte 25 de Abril, através do ministro da Administração Interna de então, o impoluto Dias Loureiro.

Da coragem para recusar uma pensão vitalícia a Salgueiro Maia, que mais tarde decidiu atribuir a António Augusto Bernardo e Óscar Cardoso, dois inspectores da PIDE, por “altos e assinalados serviços prestados à Pátria”.

Da coragem para boicotar e censurar o trabalho de José Saramago, por fundamentalismo ideológico e religioso.

Da coragem de lucrar milhares de euros com venda de acções desse pardieiro de crime chamado SLN.

Da coragem de fazer uma permuta com Fernando Fantasia, na Aldeia da Coelha.

Da coragem de fugir ao pagamento da totalidade do IMI do mesmo imóvel.

Da coragem de dizer ao país que não sabia se os seus rendimentos chegariam para pagar as suas contas, em pleno Inverno da Austeridade.

Da coragem de anunciar ao país que os portugueses podiam confiar no BES, poucos dias antes da início da queda do império de Ricardo Salgado, de quem recebeu dezenas de milhares de euros em financiamentos.

Da coragem para destratar com profunda arrogância a jornalista que o confrontou com essas declarações, que Cavaco negou, apesar de registadas em vídeo.

Da coragem, essa sim, de não se esforçar por esconder aquilo que o move: ressentimento e egocentrismo.

Triste e ressabiada sina, a do político com a mais longa carreira política desde Salazar, que não é nem nunca será a grande figura da história da democracia deste país ou sequer do seu partido. Será, apenas e só, uma vírgula no virar da página do que restou do Estado Novo para a consolidação da democracia.

Comments

  1. JMaus says:

    Só falta acrescentar que esbanjou o dinheiro que veio da europa, ao contrário dos nuestros irmanos que o aproveitaram para nos ultrapassar ( tinham um governo socialista ) e assim continuamos a tentar recuperar o atraso, sem resultado.
    Apenas nos resta servir de exemplo daquilo que os países que aderem não devem fazer.

  2. Rui Naldinho says:

    Se há no presente alguém comparável ao “velho de Restelo”, referido no IV canto dos Lusíadas, de CAMÕES, ele é Cavaco Silva.
    Este fulano representa como poucos a metáfora do velho do Restelo. Contudo, incorpora para além disso o azedume e a vingança, que é coisa rara.

  3. JgMenos says:

    No mínimo diz o que pensa, o que é um alto grau de elevação de carácter perante tanta vírgula mesquinha que, ou diz o oposto do que pensa ou, mais comummente, nem pensa e limita-se a cavalgar a a vulgaridade mais em voga.

    • Sophie says:

      Diz o que pensa e depois nega que o disse…

      • POIS! says:

        Pois, mas é a isso que o Menos chama “elevação de caráter”.

        Aliás, está cada vez mais elevado. Falta-lhe pouco para entrar em órbita.

      • JgMenos says:

        Se o caso é o BES, se bem me lembro, transmitiu as garantias dadas pelo Banco de Portugal ao tempo.

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