Os 49 anos do cinquentenário do 25 de Novembro

IL, Chega e CDS pedem inclusão do 25 de Novembro no programa dos 50 anos do 25 de Abril.

 

  1. Uma aliança de três partidos com representação na Assembleia da República quer que as comemorações do cinquentenário do 25 de Abril incluam um acontecimento que perfaz, no mesmo ano, 49 anos.
  2. Vejo, aqui, um sinal de inclusão, talvez porque a aliança em causa queira dar importância a todos os algarismos e não apenas a comemorações que terminem em 0 ou em 5. Então, o 9 e o 49 valem menos? Além disso, cinquentenário é quando um homem quiser.
  3. Por outro lado, esse mesmo desejo de inclusão fica por cumprir, quando a mesma aliança, decerto por lapso, se esquece do cinquentenário dos 49 anos do 11 de Março de 1975.
  4. Em termos pessoais, tenho a dizer que, se no cinquentenário de uma data histórica que se comemora este ano, tivermos de incluir a comemoração de um outro facto que ocorreu há 49 anos, exijo que o meu aniversário do ano que vem seja também comemorado este ano e espero que os meus amigos me ofereçam duas prendas no dia do meu aniversário deste ano, dia a que juntarei também o dia do meu aniversário de 2025. Se não fosse muito incómodo, e já agora, poderíamos juntar também o de 2026, que não há duas sem três.
  5. Tendo em conta a compreensível preocupação em celebrar datas o mais depressa possível, decerto a mesma aliança quererá lembrar os 48 anos do assassínio do padre Max e de Maria de Lurdes Correia, do atentado que vitimou Adriana Corço Callejas e Efrén Monteagudo Rodríguez ou ainda do ataque bombista que, falhando o alvo, matou Rosina Teixeira, esposa do sindicalista António Teixeira.
  6. O tempo é aquilo que quisermos fazer dele. As datas são como alguns cheiros, provocam sensações, fazem-nos viajar. Ora, para os partidos desta aliança, o 25 de Novembro de 1975 é o 24 de Abril de 1974 que se pôde arranjar.

Era uma vez uma história com 25 anos

Fez ontem 25 anos que os anti-fascistas de Coimbra arrancaram pela raíz a tentativa do “neos – núcleo de estudos oliveira salazar” celebrar a data de nascimento do ditador, na Sé Velha, em Coimbra. No ano seguinte mudaram para a Igreja de Montes Claros, mas também aí foram confrontados por outra manifestação. A mesma réplica aconteceu em Lisboa, igualmente com protestos. Nunca mais voltaram a tentar tal provocação. O fascismo não se pode ignorar, tem que ser combatido de frente, em toda a parte, a toda a hora, por todos os métodos que se revelem necessários. Vale pela efeméride e, como não podia deixar de ser, lembrar o João José Cardoso, não só por ser dele a recolha dos noticiários acima mas porque ele próprio foi um dos envolvidos na mobilização.

“Esperar tantos anos, torna tudo mais urgente”

“Aí
Só há liberdade a sério
Quando houver
A paz, o pão, habitação, saúde, educação
Só há liberdade a sério quando houver
Liberdade de mudar e decidir…
………………………
Esperar tantos anos, torna tudo mais urgente”
(Sérgio Godinho)


Os 49 anos da revolução são, infelizmente, de desencanto. Sentimo-nos despojados de um ideal que conquistámos, mas que ficou incompleto no trajecto – o tal PREC (Processo Revolucionário em Curso) que podia ter servido para o progresso social, se bem escoltado por gente decente – porque hordas – chusmas – de políticos, muitos deles nados e criados em linhas de montagem das juventudes – leia-se madraças – partidárias, estropiaram quase todos os sonhos de Abril, da longa Madrugada libertadora.

Perpetuar esta conquista vai a caminho de ser gerido por quem não faz a mínima ideia do que foi viver em Portugal antes de Abril. Que não tem a ínfima noção do que os seus pais e avós passaram em África, na Índia, em Timor. Porque os seus pais têm de esconder dos filhos o que sofreram, preferindo arrostar em silêncio a vergonha de se verem usados, maltratados, esquecidos os seus ossos no mato, as suas pernas na picada, os seus braços nas minas, os stresses de guerra, a incompreensão, a ingratidão. Por isso eu leio todos os dias, em páginas de antigos combatentes, essa revolta permanente, de quem se sente a mais, ainda que sempre tenha dado tudo por um valor a que chamavam pátria, e em nome desse valor esfacelaram-lhe as mentes em tropas especiais, ensinando-os a matar, a matar, a matar! Ou empurraram-nos, à tropa macaca, para o matope, para barracões de zinco e tijolo no mato, para bombardeamentos sem hipótese de defesa, para trilhos minados, para emboscadas de morte ou martírio, e sequelas para toda a vida. [Read more…]

Tanto mar

«Por causa das novelas percebemos perfeitamente o português do Brasil, mas o que temos mesmo pena é de não falarmos com o vosso sotaque”, disse António Costa.», “Público”, 24-04-2023

 

No dia em que Chico Buarque, um dos meus compositores favoritos, recebeu o Prémio Camões, soube que o primeiro-ministro do meu país, numa cerimónia oficial, confessou ao chefe de Estado do Brasil que nós, portugueses, temos pena de não falarmos com sotaque brasileiro. Pelo que ouço dizer, há brasileiros que defendem que o português correcto é aquele que é falado em Portugal, o que quer dizer que há muita gente a dizer disparates dos dois lados do mar. Pelo pouco que sei, o Brasil tem sotaques que nunca mais acabam, mas António Costa deve estar a pensar naquele que é usado nas telenovelas.

Entendamo-nos: eu e o meu país somos circunstâncias que acontecemos um ao outro, para sorte e azar de ambos. Não me acho nada de especial por eu ser eu e por eu ser português. Isto de ter uma nacionalidade é um casamento de conveniência que pode parecer de amor, mas é só um acaso, como é o caso do amor, a não ser para quem acredite no destino ou num deus que tenha tudo planeado, incluindo o momento em que havemos de tropeçar nos braços que queremos abraçar.

O Brasil, falado, cantado e escrito faz parte da minha vida. Tenho horas de músicas, dias de filmes, semanas de telenovelas, meses de livros, anos disto e daquilo. Nos últimos anos, tenho tido dezenas de alunos brasileiros, calorosos, engraçados, simpáticos, com direito a debates vivos sobre o ouro que roubámos ou não, com divertidos confrontos sobre pronúncia e escrita. Há muitos anos que não é possível ser-se português sem se ser brasileiro. E americano. E inglês. E francês. E italiano. E espanhol. [Read more…]

“LARGOS DIAS TEM ABRIL”

Porque importa levar Abril em Maio pelo tempo que o segue, aqui fica este fragmento de memória e tributo ao 25 de Abril de Carlos Maia Teixeira. A fotografia é do Eduardo Gageiro.
LARGOS DIAS TEM ABRIL

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Ver a nossa Esquerda a citar o tio Kissinger…

…era a última coisa que eu esperava ver em vida. Um dia não são dias e se é para o citar, nada como este belo exemplo:

Henry Kissinger, o todo-poderoso chefe da diplomacia norte-americana em 74 e 75, com Nixon e Gerald Ford, ficou famoso pela sua teoria da «vacina». Se Portugal caísse nas mãos dos comunistas – uma «Cuba» no Velho Continente – isso serviria de exemplo, evitando que outros países do Sul da Europa (Espanha e Grécia) seguissem o mesmo caminho…

Não deve ser o mesmo. É um primo. Pela certa. Não falta muito e citam o Ventura…

25 de Abril: de 1974 a 2018

Não tenho dúvidas. 25 de Abril de 1974 foi o dia mais importante das últimas décadas na História de Portugal.

Não mudou apenas o regime nessa data.

Para o melhor e para o pior, o país redesenhou-se, abandonou ideias imperiais, virou-se para a Europa, garantiu direitos para os cidadãos, socializou funções do Estado, combateu o analfabetismo e a pobreza extrema, aboliu bairros-de-lata, abriu fronteiras a outros povos, mas também escancarou portas a novas clientelas oportunistas e deixou que se instalassem pseudo-elites resultantes dos equilíbrios então gerados e das dinâmicas de mudança.

São estas que agora discursam no parlamento e nas celebrações. Corrompidas e demagogas, fizeram das encenações oficiais o Dia das Belas Intenções e juram nesta data aquilo que proscrevem durante o ano.

Neste 25 de Abril que já não é do povo ouve-se falar em povo. Também em justiça social, em diminuição das desigualdades, em combate à corrupção e à acumulação de riqueza não tributada, etc.

Contudo, se antes o problema era o 24 de Abril, agora o que é preciso mudar é o 26 de Abril e os dias que se lhe seguem.

Acróstico de Democracia

Leonor Pinto

D – ditadura
E – época festiva
M – militares
O – ouro
C – cravo
R -revolução
A – ação
C -cantar em liberdade
I – imortal
A – amigos

O cravo e a arma

Leonor Pinto, 7 anos

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O cravo

Sofia Castelejo, 7 anos

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O ditador que caiu da cadeira

Rita Mateus, 6 anos

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Antes do 25 de Abril, as pessoas não podiam dizer o que queriam e tinham que fazer tudo o que o ditador dizia, depois as pessoas juntaram-se e fizeram o MFA e depois veio a Liberdade…o ditador que se chamava Oliveira Salazar caiu de uma cadeira abaixo e morreu.

Quando começou a tocar a música

Sofia Mateus, 6 anos

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Nessa noite começou a tocar uma música e as pessoas quando ouviram tiveram a coragem de ir para a rua festejar a Liberdade que foi no dia 25 de Abril. O que houve de bom foi que os tropas tinham cravos na ponta das espingardas e não houve tiros….ficaram todos muito felizes.

A borboleta libertou-se da gaiola

Carolina Pinto, 5 anos

No 25 de Abril, a borboleta (à esquerda) libertou-se da gaiola e fugiu

No 25 de Abril, a borboleta (à esquerda) libertou-se da gaiola e fugiu

Não voltaremos atrás

Nuno Filipe, 11 anos

Liberdade

O dia da liberdade

Leonor Pinto, 7 anos

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O dia da liberdade é o dia em que começou a Liberdade no país de Portugal, as pessoas começaram a ser livres no dia 25 de Abril. Antes disso, as pessoas viviam sem liberdade, sem dinheiro, o Salazar proibia as pessoas de terem emprego, bastava dizerem qualquer coisinha que não boa sobre o Salazar que iam logo presas.
Ninguém podia comer porque toda a gente era pobre e tinham de rapar os tachos se queriam comer, até chegar o dia 25 de Abril de 1974.
Nesse dia, começou a liberdade, mas é pena que em alguns países ainda seja assim.

“Portugal 74-75” – O retrato do 25 de Abril

Um excelente documentário  com a assinatura de Joaquim Furtado, José Solano de Almeida, Cesário Borga e Isabel Silva Costa – RTP

não ter nenhum mês senão Abril

Guilherme Portugal – 18 anos

cravo

Abril são muitas palavras, nós conhecemo-la por revolução, essa onde tanques dispararam pessoas aos abraços, e muitos cantares, e era a nossa liberdade que começava no outro e acabava nos outros tantos que ainda estariam por começar. Glossolalia aos versados no discurso da força prepotente da força, mas dia 25 ninguém falava mais português do que qualquer cravo. Não a certeza da presença de um ouvido rente à porta, mas de uma porta rente à página, à nota melodiada, ao discurso urrado. Ninguém entendeu, mas perigoso e infeliz é começar a entender. Perdemos Abril quando formos entendidos nele – chamá-lo de Abril, colocar-lhe dicionários à frente, convencendo-o de que é um mês e não um poema violento de amores. Deixo-vos nos plantares, palavras flores, hoje só anoitece às oito e meia:

Escada que desanda

de cada cadência colorida de um segundo,

cada um, cada essência.

Tão labirinto como escrever ou pôr letras no papel ou redigir.

Digo que andar é desfrasear e destruir, e como emenda,

vai-se buscar água-palavra à fonte (tu) como poema-cantil,

viver a escrever é não ter nenhum mês senão Abril.

 

(imagem daqui)

 

Um Equívoco Democrático em Ruílhe

“Natal “impõe-nos” a tolerância! Transforma-nos e faz-nos perceber, que vivemos efectivamente em comunidade”

Esta é uma das frases que se pode ler na mensagem de Natal da página da Assembleia de Freguesia de Ruílhe (Braga), assinada que está pelo seu jovem presidente, Hugo Miguel Vilaça Martins.
Por ocasional coincidência, estas frases – mas assinadas por vários autores – aparecem, por exemplo, nos sites da JF Avanca (Estarreja) e JF São Miguel (Açores), assim como também no site da JF da Salga (Açores) e no da JF de Gême (Vila Verde).
Enfim, um texto emotivo, pessoal, pessoalizado mas assinado por muitos autores em simultâneo em geografias muito distintas.
No caso de Ruílhe, uma mensagem aparentemente duplicada (quem plagiou quem?) tinha aparecido no mesmo site oficial da AF de Ruílhe há um ano, no Natal de 2013. Na altura como agora, foi publicamente chamada a atenção para o facto por vários cidadãos na página de facebook daquele orgão democrático.
A façanha da duplicação de textos emotivos mas com autores diferentes repetiu-se agora e ontem, novamente, tal foi comentado na mesma página. E, novamente, o jovem presidente da Assembleia de Freguesia de Ruílhe não terá gostado do reparo e, num esquema evolutivo e perigoso, removeu vários comentários sobre este assunto, inclusive o meu comentário.
Não contente, o presidente deste orgão democrático, Hugo Miguel Vilaça Martins, bloqueou totalmente o acesso a pelo menos duas pessoas que educadamente havia feito o comentário.

Quem perde com este comportamento despótico e fascista?

Perde a freguesia de Ruílhe, perdem os ruilhenses. Merecem melhor, merecem o melhor possível.
Perde a democracia portuguesa ao ver-se violentada por um jovem, mais jovem que a própria democracia. E isto é particularmente assustador.
Perde o presidente da Assembleia de Freguesia de Ruílhe. Perde a oportunidade de se livrar de um embaraço escusado, retractando-se e, com isso, elevando-se a ele e ao orgão a que preside.
Em democracia, falhar é muito normal (só não falha quem nada faz); insistir no erro é pedante.
Fico a aguardar o pedido de desculpas. Fascismo nunca mais.

uma contagem pessoal dos 40 dias para os 40 anos do 25 de Abril

Sob motes diversos, usando quase sempre um poema, uma canção e uma imagem, comecei a contar os dias que faltavam para os 40 anos do 25 de Abril, a 16 de Março.

Contei 40 dias.

Estão aqui.

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25 de Abril no Porto – Avenida dos Aliados

Foi assim o dia 25 no Aventar

 O Aventar agradece as colaborações recebidas. Daqui a outros 40 (ou antes) há mais.

A seguir, os artigos do dia 25 no Aventar. [Read more…]

Autor convidado – Tito Lívio Santos Mota

E o ar ficou mais leve

Tito Lívio dos Santos Mota

radio-25-de-abril

De manhã levantei-me, comi a correr os corn-flakes e fui para o Liceu, sem ouvir notícias nem nada. O comboio chegou mais ou menos à hora, como de costume. Nada para assinalar até chegar ao largo do recreio. Estranhei ver os colegas em pequenos grupos que falavam baixo, com o Reitor e os outros professores, ar solene, que nos esperavam. « Houve um golpe de Estado, o liceu está fechado, façam o favor de voltar para casa ». Voltei. Desci a encosta até à Estação de Vila Franca de Xira, apanhei outro comboio e cheguei a Alhandra sem perceber bem o que se passava. Ao entrar em casa, dei com a minha avó que dançava e chorava e ria ao mesmo tempo, em frente do rádio-móvel que emitia comunicados. A minha avó sempre comedida, tão entusiasmada ? percebi logo que algo de bom acontecera, que era um « golpe bom ». [Read more…]

25 de Abril de 2014

João Esteves

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O 25 de Abril dos escroques

otelo
Estive na segunda-feira ao lado do Otelo, numa comemoração organizada pela Junta de Freguesia de Rio Tinto. Senti uma emoção contida. Contida porque, aos 43 anos, já não tenho idade nem disposição para me sentir arrebatado seja por quem for.
A verdade é que uma das maiores frustrações da minha vida é não ter vivido o 25 de Abril. Acabara de fazer 3 anos e, numa família de consciência política duvidosa, o acontecimento deve ter suscitado mais preocupação do que alegria. Diz quem se lembra que o meu pai, por esses dias, andava numa fona a rasgar tudo o que tinha em casa sobre salazar. Obrigava toda a gente lá em casa, ao que parece, a levantar-se quando começava o hino nacional com que terminava a emissão diária da rtp.
Sinceramente não sei se foi asim. O que sei é que fui criado segundo os ditames de um catolicismo do qual, hoje em dia, fujo a sete pés, e num ambiente de direita em que o psd era sempre a escolha no momento do voto.
40 anos depois, cá estamos a comemorar o 25 de Abril, como se realmente tivesse mudado muita coisa em relação ao dia 24. Enquanto os bravos Capitães faziam as suas comemorações num Largo do Carmo que foi palco e cenário de um dos maiores portugueses do séc. XX, no parlamento um bando de escroques, que ostracizou os únicos que realmente fizeram e quiseram a Revolução, debitava um conjunto de palavras ocas e lugares-comuns. [Read more…]

Autor convidado: Cristina Torrão

Cristina Torrão

O meu 25 de Abril

A aula não tinha começado há muito tempo, quando a professora foi chamada à Diretora. Ao regressar, lançou, muito aflita, a caminho da sua secretária e sem olhar para nós, as suas alunas da 3ª classe:
– Ide para casa, hoje não há escola!
Além de ansiosa, parecia muito irritada. Nós perguntávamo-nos se tínhamos aterrado no filme errado. Aquele dia havia começado igual aos outros e, de repente, dava-se uma viragem que não estava prevista no guião. Tínhamos acabado de chegar, de abrir os cadernos e os livros, de afiar os lápis… E porque estava a professora tão nervosa?
– Não me ouvistes? Guardai as vossas coisas e ide embora!
Já muito inquietas, desejávamos uma explicação daquela em quem confiávamos. Mas ela, atrás da secretária, arrumava os seus pertences, ruminando:
– Isto até pode dar em guerra… Não sei. Não sei o que se vai passar. Uma chatice, uma grande confusão!
Desandou dali, abandonando-nos à nossa sorte. [Read more…]

Autor convidado – Maria Helena Loureiro

“O dia inicial inteiro e limpo…”

Maria Helena Loureiro

25 abril
O rádio despertador acordou-me cedo, à hora do costume, que a primeira aula do dia era Inglês II com o John Byrne e eu não a perdia por nada deste mundo. Saltei da cama, fui tomar banho e, de regresso ao quarto, ouço “…desencadearam na madrugada de hoje uma série de acções com vista à libertação do País do regime que há longo tempo o domina” “Olha”, penso eu, “lá se lixou o Selassie!” que as coisas, desde janeiro, andavam sérias para aquelas bandas e logo ligo o secador de cabelo. Mas o barulho que abafava as palavras não disfarçava a música sem coro ou refrão e acabei por desligar o aparelho e ali ficar, especada, escova numa mão, secador na outra, ouvido na rádio. [Read more…]

O 25 de Abril como Eu o Vejo

25abril-40anosQuarenta anos depois, resumo-o a isto.
Não tenho muito mais a dizer.

Autor convidado – Mário Fernandes

Que os 40 anos da revolução de abril sirvam para unir esforços e gerar esperança!

Mário Fernandes

Uma das melhores formas de celebrar o 40º aniversário da revolução de abril era aprovar a redução do número de deputados, a limitação do número de mandatos, bem como o seu desempenho em exclusividade!

Completam-se na próxima semana os 40 anos do «25 de Abril», aquela data mágica que restituiu a democracia e a liberdade às portuguesas e aos portugueses. Com sete anos de idade, à data, não posso dizer ter experimentado o anterior regime, ditatorial, os meus pais sim, mas posso afirmar a lembrança que tenho daqueles dias de abril de 1974, pois existem três palavras que me foram ficando na memória: «revolução», «liberdade» e «povo». [Read more…]

Memórias do meu Abril

Há 40 anos vivia num aldeia da zona oeste, num vale assente entre montes, onde só ia quem tinha que ir, pois não era zona de passagem. E esse isolamento sentia-se na mentalidade das pessoas, fechadas sobre si próprias, sobre o trabalho nos campos, ao ritmo da migração da geração mais nova para a zona da Grande Lisboa e sobre a vida uns dos outros. Os homens usavam um barrete preto com uma borla na ponta, que servia também para guardar o tabaco e as poucas moedas que tinham disponíveis para o dia a dia, as mulheres vestiam-se de escuro, e na hora da missa usavam véu sobre a cabeça.

A vida das mulheres resumia-se à casa, a lavar no chafariz (já que água canalizada era uma miragem, tal como a luz eléctrica em muitas delas) e a alguns pequenos trabalhos no campo. Era o Portugal do “respeitinho é muito bonito” e o homem é que mandava na casa, na mulher e nos filhos.

Os meus pais eram muito jovens, na casa dos 20 quase à beira dos 30, mas tinham já feito uma incursão pela estranja. Meu pai tinha emigrado primeiro, com uma das famosas autorizações de Salazar, depois de ter passado 31 meses, em Alto Moloqulé, em Moçambique, em plena zona de guerra, onde vira morrer muitos dos seus camaradas.  Primeiro partira ele, com contrato de trabalho, mas sem casa. Mais tarde juntar-se-ia a minha mãe e, só tempo depois, tinham voltado para me vir buscar.

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Memórias com quarenta anos

Era madrugada alta quando acordei, estremunhada, com o telefonema de António Valdemar que, à janela da sua casa na Avenida da Liberdade, estava a ver passar os primeiros blindados. Que ia já ter com ele, respondi. Queria lá saber de recomendações dos militares para não sair: nunca tinha visto uma revolução,nunca tinha votado, nunca coisa nenhuma por causa da ditadura, não faltava mais nada do que não ver como era. Mas antes de sair, telefonei a todos os meus amigos que tinham filhos pequenos: que não deixassem as crianças ir para a escola de manhã cedo e ligassem o rádio. E porta fora. Estava uma madrugada fresca, macia, perfumada, dava gosto subir até ao largo e descer ao saltos as escadas da Praça da Alegria. Eu morava numa rua de fronteira entre o Bairro Alto e o Príncipe Real, a dois passos do SNOB, o bar que era poiso certo de jornalistas, e a casa do Mestre Agostinho da Silva, que pelas sete da manhã era certo a dar milho aos pombos no largo, pretexto meigo para meter conversa com os trabalhadores que partiam para a labuta diária e, sem saberem porquê, adoravam aquele velhinho que falava tão claro quando lhes contava histórias que os faziam pensar. Não era longe, também, do restaurante onde jantava todos os dias, o Rina, que era o nome da patroa, na Travessa dos Fiéis de Deus. Sempre os mesmos, amesendados ali por anos a fio: Edite Soeiro, Acácio Barradas, José de Lemos, Urbano Carrasco, Artur Agostinho, Joaquim Benite, Fialho Gouveia, António Soares, o pintor, malta do teatro e dos fados, com Maria da Fé à cabeça, enfim receita garantida para estarmos ali sem cerimónia, como em nossa casa, até às tantas. Às vezes a Rina chegava-se a nós, mansa, a pedir que nos fossemos embora para outro lugar porque tinha de se levantar muito cedo, e nós obedecíamos. Como naquela noite em que, absolutamente em brasa, todos discutimos a Lei de Imprensa que os liberais, liderados por Francisco Sá Carneiro e Francisco Balsemão, levaram à Assembleia Nacional, na esperança de travarem a censura. José Carlos Ary dos Santos chegou, sentou-se junto a nós e logo entrou na discussão, que prometia entrar pela noite dentro. Lá veio a Rina, com o seu jeitinho maternal, e emigrámos para uma leitaria do bairro que estava aberta toda a noite. E ali voltámos à discussão. A certa altura, o Ary dos Santos levantou-se e foi em direcção aos lavabos, mas sempre a virar o corpanzil para trás, sempre a berrar as suas razões naquela voz (inesquecível). Foi então que o tasqueiro, aflito, lhe gritou: “Oh sor Ary, sor Ary, por ai não, por aí é das senhoras!”. O poeta estacou, pôs a mão à ilharga e perguntou com a cara mais séria do mundo: “E eu sou alguma galdéria?”. Ficou submersa por um mar de gargalhadas a magna discussão. [Read more…]