História em que não acontece nada

Era um modesto hotel de uma cidade de província. Um desses estabelecimentos semifamiliares, em que o dono parece ter conseguido desenvolver o dom da ubiquidade, não só para controlar os empregados e guardar a sua propriedade, mas também para observar com deleite a nossa cara de susto quando nos surpreendia em cada esquina. Era um homem calvo, de rosto amarelado, com um dente de ouro que reluzia em simultâneo com o relógio de pulso, uma espécie de sincronização prévia à dos smartwatches com os smartphones que me pareceu muito original. Esperava os hóspedes pela manhã, chegava a persegui-los se ousavam esquivá-lo, para indicar-lhes a salinha, mesmo ali ao lado, onde o pequeno-almoço estava a ser servido, como se estivéssemos em Xanadu e houvesse o risco de perder-nos. Desejava que estivesse “tudo de feição” e indagava detalhes sobre a nosso relacionamento com o colchão: demasiado brando, quiçá muito duro? E que tal as almofadas? A mantinha extra está na prateleira de cima do armário, favor não esquecer. Era diligente, atencioso, insuportável. [Read more…]