Jaburu, o Flecha Negra

A memória guarda o que verdadeiramente importa? Estamos sentados frente ao mesmo bife grelhado, ele porque precisa da dieta e eu por solidariedade. Aconteceram-lhe muitas coisas nos últimos anos e não é que ele não se lembre delas, claro que se lembra, não pode esquecê-las, mas também não convém lembrá-las todas. Queremos que a conversa seja banal, o banal reconforta, traz-nos a vida de todos os dias, sem os grandes sobressaltos. Eu fico com as batatas fritas, ele com o arroz branco.

O puto, ao lado, explica-nos a sua preocupação, o único cromo que lhe falta na caderneta, o 117. As cadernetas de cromos são boas para ensinar-nos que é possível viver com a incompletude, que se sobrevive à frustração e se pode aprender a apreciar o que é imperfeito. Falta-te um cromo, há-de faltar sempre pelo menos um cromo em todas as cadernetas, paciência, rapaz, é a vida. Anda, pai, come o bife, que tens que fazer subir essa hemoglobina. E de legumes salteados, gostas? Ó mãe, o pai gosta destes legumes? Olhamos todos para ela porque é ela que sabe. O seu nariz franzido diz-nos que nem por isso. Adiante, arroz branco não faz mal a ninguém. [Read more…]