MOAMBA

  • Tens-te transformado numa coisa muito ruim! – disparou o homem enquanto comia uma garfada de bacalhau.
  • É o que tu dizes. Outras pessoas dizem o contrário. – respondeu a mulher mordiscando um palito de batata frita.

  • Quem? – quis ele saber.

O diálogo prosseguiu neste tom que a excessiva proximidade das mesas me impedia de não ouvir, apesar do ruído de fundo do restaurante cheio.

Refugiei-me na moamba e nas memórias de sabores que, no meu caso, recuam até à infância e a outras geografias.

Enquanto o homem se lamentava em voz alta e a mulher, em silêncio, se arrependia pela milionésima vez de se ter casado com aquela besta, eu sentia alguma nostalgia porque, se quase tudo é reproduzível, isso não acontece com o travo do óleo de dendém caseiro dessa infância longínqua, aquele que marca pela eternidade fora o verdadeiro gosto de uma boa moamba de galinha.