Os velhos de Cedofeita

Nestes dias de sol, quando o inverno dá os primeiros sinais de fraqueza, os velhos de Cedofeita vêm morrer para a varanda. Trazem a gaiola do periquito e a rafeira Pantufa, trazem o rádio de pilhas, e o iogurte do meio da tarde, para empurrar o comprimido, sentam-se num banquinho e ficam ali a olhar-nos, da tribuna dos que só têm passado.

Não sabemos que pensarão das nossas andanças, que lhes parecerá, visto de cima, o alvoroço dos vivos, quanto se rirão da nossa pressa. Não lhes conhecemos o nome, nem a história nem o timbre da voz. A casa que lhes entrevemos pela cortina está sempre escura e silenciosa, uma tumba na qual se depositam quando começa a arrefecer e de onde não saem nos dias de chuva.

Ali estão, emoldurados pelos arabescos de ferrugem das varandas e a corda do estendal de onde pendem um pano de cozinha e um par de peúgas. Seguem-nos com o olhar mas não sei se nos vêem ou se apenas buscam, no movimento dos nossos corpos, o que restou de um tempo gasto.