O devir histórico (1)

A premissa de que o mesmo homem não pode atravessar o mesmo rio duas vezes, é um pilar da tese do devir, fundada por Heráclito. Contudo, um povo pode repetir os mesmos erros ao longo da sua existência. Esse outro devir, o histórico, a repetição dos erros por banda do mesmo povo, consubstancia-se no exemplo português. E um povo não será, na sua essência, o mesmo, pois que o tempo tudo muda e um povo não sairá da regra. Ou talvez saia. Talvez um povo se mantenha igual a si mesmo e seja essa perenidade a sua razão última para existir. Talvez. Sei é que o mesmo erro tem sido repetido ao longo dos séculos. Desde o mercado das Índias, que nos obrigava a comprar fora o que se dava à troca para trazer e comercializar as especiarias na Europa, levava a que a diferença de preço esmagasse as nossas margens de lucro, e enchesse os bolsos de outros. E mesmo assim, não se deixou de esbanjar. Da mesma forma que, séculos depois, foram os alemães e os italianos que tanto ganharam com os fundos comunitários, pela compulsiva aquisição, por banda de sempre honrada gente, de Ferraris, Porsches, Mercedes e outras máquinas que não eram, infelizmente, nem teares nem cubas de inox. Neste devir histórico de se esbanjar quando há até que nada haja, existe também um perigo que se pode repetir: a tentação de se abdicar da democracia, para que haja alguém que endireite as coisas, ponha as contas em ordem e meta o país nos eixos. Também já tivemos isso antes. Não vai há muito. Querem ter outra vez?