pele genuína

Ontem passei uma hora com dois dos filhos do Luiz Pacheco. A Câmara das Caldas da Rainha – terra onde viveu e deixou milhares de histórias maravilhosas na memória de muitos – entregou a medalha de mérito cultural a título póstumo ao escritor-pai. Escolheram-me para a entregar em mão, por razões que conheço e não divulgo. Bem sei o que diria desta condecoração o próprio Luiz Pacheco. E por isso ainda mais me diverte a simpatia deferente dos seus filhos por um reconhecimento público, autárquico, (esse tão maldito poder local), vindo de um universo literário tão anti-institucional como o de Luiz Pacheco. Mas que havemos nós de fazer perante quem nos prova, documenta e assevera a fragilidade triunfante da Beleza e da Inocência sobre a irrefutável sordidez da vida? Cru, acre e luminoso, Luiz Pacheco recebe finalmente, contra muitas vontades resistentes, o que sempre mereceu das mãos de uma cidade onde teve e tem admiradores fiéis. Que podíamos nós fazer quando o libertino incomestível nada mais fez senão depor a sua poesia nas nossas mãos para que a usássemos como luvas? De pele genuína. Segunda pele. Mais humana que a primeira.