A Hora do Planeta é uma valente treta

A Hora do Planeta, que Sábado se assinalou um pouco por todo o mundo, é um exercício de hipocrisia equiparável ao do banimento das palhinhas de plástico.

Mas é giríssimo, super instagramável e perfeito para que decisores políticos com responsabilidade directa no desastre ambiental em curso possam limpar a sua imagem e demonstrar, com pompa e virtude, uma preocupação que não têm.

O site do evento fala em dedicar 60 minutos a fazer algo pelo planeta. E acrescenta:

Apenas 60 minutos? Sim, apenas uma hora. Pode não parecer muito, mas a magia acontece quando todas as pessoas, desde a Ásia à África, América do Norte e do Sul, Oceania e Europa, doam uma hora para cuidar da nossa única casa.

É isso. Doamos todos uma hora. E o resultado prático dessa doação, a tal magia que acontece, é nada. Porque a seguir voltamos todos para os nossos padrões de hiperconsumo, para o nosso desrespeito pela água e pela vida animal, e a única magia que aconteceu foi esse exercício de hipocrisia para nos fazer sentir bem e achar que já fizemos alguma coisa que nos permita recomeçar mais um período de 364 dias e 23 horas a desperdiçar comida, a pegar no carro para fazer um quilómetro e a consumir fast fashion de curta duração que depois mandamos para um país africano, ao qual pagamos para “armazenar” o nosso lixo.

Até ao dia em que uma tartaruga morre asfixiada com a nossa camisola amarela da Primark.

O ambiente precisa de decisões radicais, não de kumbayas à volta da fogueira.

Precisa que reduzamos drasticamente o consumo excessivo de carne, que rebenta com a Amazónia e contribui com toneladas de CO2 para o efeito de estufa.

Precisa que declaremos guerra à obsolescência programada que aumenta de forma brutal o extrativismo e a quantidade de lixo produzido.

Precisa de mais e melhores transportes públicos e menos combustíveis fósseis a queimar nas cidades.

Precisa de uma rejeição global da cultura do hiperconsumo, porque os recursos são finitos e a produção industrial descontrolada uma das grandes causas do problema.

Precisa recuperar mais e de construir menos.

Precisa de enfrentar os lobbies que garantem a impunidade daqueles que lucram com a destruição do mundo natural.

Precisa que as COPs deixem de ser uma fachada sem efeitos práticos, patrocinada por alguns dos maiores poluidores do planeta.

Precisa que a transição energética seja mais do que um novo modelo de negócio.
E precisa de acção, já.

Desligar as luzes uma hora vale zero. Porque, no minuto seguinte, voltamos ao mesmo.

Mais 8759 horas a rebentar com o planeta.

Se é para levarmos com areia nos olhos, mais vale ir ali a baixo dar uma volta pelo Saara. Enquanto não rebentarmos com ele também.

Comments

  1. Ana Moreno says:

    100%, João. Tudo isso entra pelos olhos adentro há anos e, no entanto, blá blá blá crescimento, blá blá blá PIB, blá blá blá competitividade. Há muito tempo que tudo isto é esquizofrénico.

  2. Anonimo says:

    Nem dei por isso.
    Como abominava o “dia sem carros”. Já era difícil fazer o casa-trabalho-casa, com aquelas festividades bacocas pior ficava.

    Todo o sistema produtivo e modelo económico tem que mudar. Mais rapidamente do que a transição do motor de combustão (que tão cedo não desaparece). E alguns hábitos… mas aqui, cada um quer acabar com o que não usa. Por mim iam abaixo todas as cadeias de fast food.

    Já agora, desligaram as luzes… e os telemóveis, routers e tablets?

    • Paulo Marques says:

      Sim, já desliguei os 5W de meia energia verde para queimar os 66kW que me apetecer.
      O que vale é que entra a sua falsa equivalência e a de quem se… perdão, nos governa, acaba por continuar tudo na mesma até não valer a pena fazer nada.

      • Anonimo says:

        Boa cassete. Sempre gasta electricidade menos que fazer streaming.

  3. Luis Coelho says:

    Poi! Quando se deslocam vão em jatos privados!cada um no seu!
    Para quando a utilização do h2 separado instantaneamente, utilizando os motores que já existem??!!
    E se deixam de fantasias hipócritas, com pilhas e baterias que só vêm causar mais poluição!

    • Paulo Marques says:

      O h2 também não é particularmente verde (sempre lhe chamam azul…), como também não é a própria produção do veículo pessoal de 2 toneladas de plástico e metal.

  4. jose valeriano says:

    Diminuição de consumo de carne o que farão aos produtores e seus funcionários?
    Tudo de transporte publico nas grandes áreas Metropolitanas e o Interior , os mecânicos, bate chapas pintores, eletricistas e uma grande parte da sociedade que trabalha no ramo o que vão fazer?
    Hiperconsumo todo o tipo de negócios se podem englobar nesta área o que fazer com todo os empresários e seus funcionários?
    Transição energética sem energia fóssil como será possível se todas as outras energias são muito mais caras e poluentes na mesma.
    Quando estiverem todos em casa sem nada para comer e desempregados como irão pagar o seu bem estar, as suas merecidas férias?
    Há depois de nada fazerem já nem se lembram das férias pois a fome vai ser tanta que esquecem tudo.
    Não me chamem demagogo pois o que já está a acontecer com os preços e falta de alguns bens é o resultado disso mesmo.

    • Paulo Marques says:

      Produzem e vendem erva, carne artificial, reparam comboios, trabalham a lidar com os efeitos que já existem… trabalho não falta, falta é vontade.
      Serem muito mais caras e poluentes é notícia do século passado, a menos que queira manter as 2 toneladas individuais, onde está muito bem acompanhado com a cabeça na areia quando os custos dos efeitos aumentam exponencialmente.
      Mas considerar a mudança impossível com planos esdrúxulos dá muito jeito a quem já é dono disto tudo. Até fazem de conta que compram a poluição aos outros e tudo, acabando com a inovação.

    • POIS! says:

      Pois está claro, ó Valeriano! Que eloquência! Que perspicácia!

      Se amanhã olhar pela janela de casa e vir uma multidão à sua porta, não se espante.

      É a malta do Sindicato dos Carroceiros, que ficou sem emprego em meados do século passado e o querem nomear como seu porta-voz.

      Condutores de carroças, correeiros, carpinteiros e ferreiros carroçais, ferradores, já para não falar dos animaizinhos, coitadinhos… quantos empregos destruídos em nome do progresso!

      Bandidos!

  5. Ana Moreno says:

    Totalmente esquizofrénico.

  6. jose valeriano says:

    Sem comentário pois há muitos que falam falam mas não sabem fazer absolutamente nada nem tão pouco como se produz.

    • POIS! says:

      Pois é!

      Ou somos todos carnívoros, automobilizados e hiperconsumistas, ou o país está perdido!

      O país? O Mundo! Ou mesmo o Universo!

      Demagogo, Vosselência? Não era a primeira coisa que alguém se lembraria de lhe chamar. Era só para aí a quarta. Antes ainda havia a começada por A, por B…

    • tuga says:

      Sr Valeriano
      “Sem comentário”
      E melhor assim, ficamos menos confusos