O Liberalismo não é sobre dinheiro

Existe a ideia errada de que o liberalismo gira à volta do dinheiro. Não podia estar em maior desacordo. Ao contrário do que a esquerda e a direita conservadora, proprietárias de ideias coletivistas, nos querem fazer acreditar, todo o liberal luta apenas pela valorização do indivíduo. Claramente que a vertente económica também é levada em conta, mas o liberalismo não se prende aí. Também não é possível ser liberal na economia e conservador nos costumes. Quer dizer, é possível, mas é intelectualmente desonesto. É lutar pela liberdade apenas no que pode dar jeito a certo grupo. A partir do momento em que uma ideia apenas respeita a liberdade de uma porção de indivíduos, deixa automaticamente de ser uma ideia liberal.

O liberalismo luta pela emancipação individual de cada um, não reduzindo qualquer pessoa ao seu fenótipo. Desta forma, as pessoas podem ver aquilo que depende delas valorizado e não serem julgadas simplesmente por algo que não controlam. É por esta razão que o liberalismo encontra inimigos tanto à esquerda como à direita.

A esquerda não defende o indivíduo. A esquerda materializa certas características de seres humanos e junta-os em grupos diferentes, criando divisões identitárias. Quando, por exemplo, a esquerda defende que um ataque a alguém por ser homossexual é mais grave do que um ataque por um motivo pessoal, está a sobrepor uma orientação sexual ao valor individual. O indivíduo atacado sente-se protegido por supostos ativistas, quando, na verdade, está apenas a ser usado para a defesa de uma causa. A pessoa perde a sua independência para ser utilizado por uma característica pessoal.

Ninguém que defenda causas LGBT, causas antirracistas, entre outras, o faz por mal, digo eu. Mas o caminho não é esse. Pode parecer mais fácil e mais rápido, mas não é esse. Se eu tiver um jardim cheio de flores e quiser chegar ao outro lado, tenho de ir à volta. Seria mais fácil atravessar pelo jardim, mas iria estar a passar por cima de algo essencial naquele lugar.

A direita mais conservadora continua a não defender o indivíduo. Esta direita esquece que o indivíduo não tem de seguir a linha de pensamento que uma maioria segue. Relembrando o exemplo já apresentado, a maioria é heterossexual, mas não é por isso que não deve haver direitos iguais para quem não seja, por exemplo. Da mesma forma que a esquerda agrupa pessoas, a direita conservadora faz exatamente a mesma coisa, mas por outro sentido. Ambas as estratégias comprovam que é muito mais fácil juntarmo-nos a um rebanho e lutar por um grupo.

Quem segue estas estratégias tem de perceber que está a renegar a menor minoria de todas: o indivíduo.

O liberalismo nem sequer luta por que as pessoas sejam todas liberais. Apenas luta por que todas as pessoas tenham a liberdade de ser algo que queiram. Num país liberal, por exemplo, é possível ser comunista. Basta unirem-se aos outros que são comunistas. Num país comunista, não é possível ser liberal.

Enquanto não lutarmos de igual forma contra aqueles que materializam o amor à Pátria de forma infértil e aqueles que materializam pessoas por pertencerem a uma dita minoria, não nos podemos dizer defensores da liberdade individual.

Comments

  1. Paulo Marques says:

    “a esquerda defende que um ataque a alguém por ser homossexual é mais grave do que um ataque por um motivo pessoal, está a sobrepor uma orientação sexual ao valor individual.”

    Não, está a reconhecer que o ataque aconteceu por desprezo a uma especificidade do indivíduo, a qual os seus semelhantes sempre sentiram como ataque à sua segurança.
    É muito bonito falar em platitudes quando temos o privilégio de não ser assediados constantemente só por ser quem somos. Onde está a liberdade individual quando uma mulher corre riscos se sair sozinha à noite de mini-saia? Onde está a liberdade individual se um porco de uniforme nos assedia sempre por andarmos na rua errada?

    Privilégio e água benta, meu caro.

    • Francisco Figueiredo says:

      Em casos em que a liberdade individual é atingida, o Estado deve garantir que repõe a Justiça. Mas cada caso deve ser tratado individualmente, como sempre.

      • Humm? Mas o liberal chama o estado (a personificação do colectivismo) quando as coisas correm mal?

        Mas isso não responde á questão posta pelos outros comentadores.
        Defende a liberdade de alguém atacar um individuo apenas e somente por este ser homossexual, ou antes pelo contrario, que a liberdade do individuo ser homossexual sem que ninguém o chateie por isso deve ser protegida pela sociedade?

      • Paulo Marques says:

        Cada caso é um caso, mas os padrões existem. É não adianta fugir ao essencial, não há liberdade com assédio diário, entre outras questões mais subjectivas e variáveis.

  2. Rui Naldinho says:

    Esse liberalismo que descreve só existe nos livros. Na prática, todos os liberais que pretendem uma economia liberal, tendem a tornar-se conservadores nos costumes, com honrosas excepções, em especial quando sentem que os seus interesses económicos podem ficar ameaçados, ou que a correlação de forças já não lhes é favorável. Acabam como todos os outros, protecionistas.
    Então para quê o liberalismo?
    Tal como o comunismo, que nos livros defende uma sociedade sem classes sociais, o que a História nos demonstrou foi um monumental embuste, com uma nomenclatura a dominar um Estado burocratizado e uma economia pouco produtiva, que gerava um nível de vida baixo, nas populações.
    Se o Liberalismo fosse assim tão bom, o planeta era governado maioritariamente por partidos liberais, e não conservadores ou sociais democratas, há algumas excepções, como o Japão, por exemplo, por acaso uma sociedade altamente conservadora, nos costumes.
    A maioria das economias hoje estão agrupadas em comunidades de Estados, como é o caso da CEE, MERCOSUL, APEC, etc, etc, contrariando todas as teses do Liberalismo, tentando sim, interesses comuns regulados.
    Ao longo da História, desde a sedentarização do ser humano, este sempre esteve estratificado em grupos sociais e étnicos, onde uma ou mais classes dominavam outras. E mesmo essas tinham precedências umas em relação a outras. A luta de classes teve avanços e recuos, mas foi sempre caminhando para uma sociedade cada vez mais justa e equilibrada, depois de guerras, revoluções e catástrofes.
    Na prática, o liberalismo nunca existiu, a não ser nos livros.

    • Francisco Figueiredo says:

      Eu respondo a isso no próprio texto. A maioria rejeita o liberalismo, pois não defende grupos em que se esteja inserido. É muito mais fácil um vendedor de laranjas votar num partido que queira beneficiar tal profissão do que num partido que dê liberdade a cada um de seguir aquilo que quer. Abraço

      • Rui Naldinho says:

        Estou da acordo consigo, nalgumas coisas que escreve, essa incluído. Aliás, é isso que se passa em Portugal. Mas a vida sempre funcionou mais ou menos nesses moldes? Ou não?
        As pessoas defendem os seus interesses de grupo, votando no mínimo, em quem não os hostilize. Uma espécie de instinto de defesa.
        Aliás, uma das razões pela qual o PSD está hoje nas condições em que está, e Passos Coelho teve muita culpa nisso, foi precisamente deixar de ser um partido fortemente interclassista, tentando conciliar vários interesses de grupo, como foi no passado, para se tornar num partido cuja agenda política é pouco mais do que o roteiro da CIP, mesmo que esta tenha interesses legítimos. O país não é a CIP. É felizmente muito mais do que isso.
        O PSD deixou ao PS esse espaço todo. O da abrangência interclassista. Até lhe abriu as portas a uma Geringonça, coisa impensável há duas décadas atrás. Um PS que só não consegue uma maioria absoluta nas próximas eleições, como desejariam, porque não se livrarão tão cedo do estigma da corrupção e da endogamia. Também ainda não perceberam, os otários. Acham que somos todos néscios.
        Qualquer sociedade sem uma classe média forte, funcionando como um elevador social das massas operárias, mas também dos serviços, onde as assimetrias se esbatem, esta sociedade tende a radicalizar-se em grupos e/ou a acantonar-se em defesa do seu quinhão, mesmo que parco.
        Foi assim com a manifestação da TSU. Foi assim com os funcionários públicos e dos funcionários dos grandes grupos privados, por norma sindicalizados.
        Se acrescentarmos às assimetrias sociais, as assimetrias regionais, na velha dicotomia interior/litoral, ou pior ainda, Lisboa/Resto do país, a coisa piora ainda.
        Já alguém, da direita, se questionou como foi possível o PSD passar de maior partido autárquico, durante várias décadas, sozinho, para aquilo que hoje é, e ainda a necessitar da muleta do CDS para ganhar a maioria das Câmaras Municipais?
        Não, preferem meter a cabeça na areia e falar do Sócrates. Como se o PSD não estivesse também ele cheio de telhados de vidro.

  3. Ver escravos a falar de liberdade é sempre algo de divertido…

    • POIS! says:

      Pois é!

      É por isso que ler o que escreve V. Exa. é de partir o coco!

      Não me ria tanto desde que o outro caiu da cadeira e de quando a Padeira de Aljubarrota partiu a carola aqueles castelhanos e aproveitou para fazer sumo.

  4. Parador says:

    Uma metáfora sobre o denominado “liberalismo actual”,

  5. O indivíduo não é uma ilha; a sua liberdade define-se na noção de liberdade que exista na sociedade em que se integra.
    Essa noção de liberdade e das condições que se requerem à sua existência é que definem esquerda e direita.

    À esquerda temos classes, grupos, géneros e toda a espécie de colectivos até que possam suprimir as liberdades e passarem a falar do Colectivo, do rebanho seu ideal.

    À direita sempre preside o indivíduo, a sua extensão natural que é a família e a sua ancestralidade expressa pela nação; e haverá grupos de interesses vários, profissionais, ideológicos, culturais, mas nada ofusca o valor pessoal, a responsabilidade familiar e o serviço da nação.
    O liberalismo não é mais que uma tónica da Direita, que adverte sobre os perigos estatizantes, como condição de não se tornar um factor de disrupção social

    • POIS! says:

      Pois vejamos:

      “O liberalismo não é mais que uma tónica da Direita, que adverte sobre os perigos estatizantes, como condição de não se tornar um factor de disrupção social”

      Ai que beleza! Tivessem existido uns “liberais” na era salazaresca, assim para o avisar dos “perigos estatizantes” e o que já era perfeito seria simplesmente sublime!

      Já com o pijaminha vestido, os chinelinhos perfeitamente alinhados ao lado da caminha, preparando-se para se enfiar nos lençois dobrsdinhos, eis que JgMenos nos brinda com uma linda epístola aos liberais, para os relembrar do seu lugarzinho lá na Direita.

      É missão do Sr. Figueiredo e amigos, portanto, o de advertir sobre os perigos estatizantes, para que não haja exageros no saque. Enriquecer sim, mas não à tripa forra, senão a populaça revolta-se e é uma porra (olha rimei!)..

      Demonstra assim JgMenos que, apesar do seu pendor salazaresco, nada tem contra os liberais e até propõe que cada português de Direita tenha um liberal para o advertir.

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