Mesmo junto ao local onde trabalho, existe um daqueles espaços com máquinas automáticas que estão abertos vinte e quatro horas. “Aberto” é termo apropriado para este sítio em particular: os vidros que serviam de parede foram partidos por mitras em tempos imemoriais e jamais foram substituídos. E é desses mitras de que vos falarei hoje.
Habitualmente, o espaço está ocupado por um grupo de três ou quatro mitras e uma gaja, que deve andar a comer um deles, ou mais provavelmente os quatro. Fazem-se acompanhar de colunas de som e da bolsinha da ganza. Diria que o fumo pesado dos charros num espaço muito frequentado por crianças (é uma zona com várias escolas) seria desadequado, não fosse o lugar muito pouco kids-friendly por si mesmo, uma vez que uma das máquinas vende utensílios tão esdrúxulos quanto dildos, anéis vibratórios ou flashlights. Uma vez, de forma a pregar uma partida a um amigo mais ingénuo, uns alunos meus compraram uns preservativos na máquina, disseram ao amigo que se enganaram a pedir, que tinham pedido algo de que não gostavam, mas se ele quisesse podia ir buscar, que ficava para ele, e o pobre voltou confuso e com um anel vibratório na mão, que os colegas compraram convencidos de que eram preservativos. Ri-me e alertei que eles queriam enganar o colega, mas que nem sabiam comprar preservativos, contudo não daria mais explicações, alegando que lhes faltavam anos de vida para terem acesso à verdade, quando a mim é que faltava o conhecimento do que raio é um anel vibratório.
Mas adiante, que estava a falar dos mitras. Como referi, fazem-se acompanhar de colunas de som e a música reproduzida – como é de fácil suposição – não é da maior qualidade. O prato do dia é amiúde um mumble rapper de cara tatuada ou aquilo a que os brasileiros – apropriando-se de um género válido e respeitável – optaram por chamar de funk, mas que no fundo são popuzudas de cu ao vento e letras indecorosas e gramaticalmente assassinas entoadas por faveleiros que vão estar mortos daqui a dois dias (e cada um tem os seus gostos, mas não chamem àquilo funk).
Um dia, as coisas estavam diferentes. As paredes não abanavam dos sismos rítmicos das batidas ensurdecedoras. O volume da música era muito mais suave, quase imperceptível. Não só as aragens que nos chegavam do som eram subtis, pequenos vestígios melódicos, como aparentavam…agradabilidade. Qualidade. Beleza. Fiquei intrigado, claro está. Passados uns minutos, chegaram-me laivos de um órgão Hammond, runs ao estilo Jon Lord, e fiquei ainda mais suspicaz. Interpretei como sendo o meu cérebro, em modo de adaptabilidade e instinto de preservação, a dar-me propositadas alucinações sonoras, silenciando o som horrível da música dos mitras e transportando-me para os mais agradáveis campos do rock clássico.
Não, mas agora não. Esta eu reconheço bem, esta não me enganam. Isto é a guitarra do Gilmour na High Hopes.
“Os mitras estão a ouvir Pink Floyd.”
Esta conclusão não foi só pensada. Surpreendido e maravilhado, exclamei-a de sorriso no rosto e para gargalhada dos meus alunos. Um dos mitras terá descoberto os efeitos psicadélicos da música e sugeriu aos outros uma originalidade, “mano, juro, pinque flóide bate que fode, é um estaladão, até bates mal, filho”, e puseram uma playlist a dar.
Porventura, não lhes terá agradado particularmente o impulso de introspecção provocado pelas longas estradas do rock progressivo, o tédio pouco dançável dos extensos solos do Gilmour ou a profundidade das letras, que não têm o convite à luxúria gratuita de um “vou-tji pégá nessa báláda/ sua cachôrra dánáda” (inventada por mim, MC Dioguinho, agora mesmo).
A verdade é que, no dia seguinte, estava de volta o volume intenso e torturante dos sons habituais. No dia em que voltarem a colocar Pink Floyd a bombar naquelas colunas, irei até junto deles para ouvir mais de perto, nem que para isso tenha de fingir que só fui lá para comprar um anel vibratório. É que já agora fiquei curioso.
Testemunho comprovativo de quão bem integrado pode estar um professor numa turma de adolescente e seu psicótico mundo.
Pois, nem mais, ó Pink Menos…
“The Oliveira is in my head
The Salazar is in my head
You raise the blade, you make the change
You rearrange me ‘til I’m sane
You lock the door and throw away the key
And there’s someone in my head, but it’s not me”.
Pois não, não é! Quem será?
“os vidros que serviam de parede foram partidos por mitras” lamento a ignorância, mas o que significa aqui mitras?
O adolescente ou pós adolescente sabe la.
São nomes que a canalha usa por moda
Já vi chamar esse nome a tanta coisa. Em Lamego por exemplo tem um significado concreto, neste caso o garoto usou com um significado que tambem não percebi
Enfim, conversa de meninos
“Pós adolescente”? É melhor não subestimar.
Principalmente se o encontrar frente a frente.
Cuidado que o autor é durex, nunca perde o control e é pouco dado a harmony!
A única coisa que conheço com esse nome são as camisas sem mangas
Eu diria “gunas”… Mas o calão muda de ano para ano.
Tirado da Infopedia:
“calão jovem de meio urbano com aspecto intimidador ou ameaçador, de gostos tidos como vulgares e geralmente associado a comportamentos desrespeitosos ou violentos; guna”
É um termo que envolve, na minha opinião, um certo nível de desprezo, e que inclui desde “drogados” a pedintes ou simplesmente, mal-vestidos ou pessoas com sinais de pobreza.
É um “conceito” muito usado por certa “gente de bem” na vida…para, neste caso, classificar três ou quatro gajos e “e uma gaja, que deve andar a comer um deles, ou mais provavelmente os quatro” (1), o que torna tudo muito mais excitante….
O termo vem, certamente da Mitra que era um asilo da mendicidade em Lisboa, antepassado da Santa Csa da Misericórdia. Pode ver-se um bom estudo histórico sobre o assunto, da autoria de João Miguel Simões, aqui:
https://backoffice.scml.pt/wp-content/uploads/2021/10/Estudo-historico-da-Mitra.pdf
(1) note-se que o autor, a príncípio não sabia o número certo, mas quando viu “a gaja” soube logo que eram quatro. Certamente, não tinha ar de se contentar simplesmente com três…
O menino é um betinho, muito ao jeito dos liberocas emplumados a quem o dinheiro dos papas lhes permite abrir a boca com o tom de desprezo que caracteriza os meninos de bem, que após 50 anos de democracia mantêm a arrogância dos servidores do Estado Novo, quando falam da “populaca”” como eles chamam.
Essa gente é pior que os arruaceiros do Chega, que dizem ao que vêem
Beto, liberoca e facho. Trifecta.
Haja quem os reconheça e identifique.
Principalmente os liberocas, que são os mais cínicos e perigosos, porque atiram a pedra e escondem a mão
«…Sob o pretexto de criar uma sociedade de beneficência, organizou-se o lumpem-proletariado de Paris em secções secretas, cada uma delas dirigida por um agente Bonapartista, ficando um General Bonapartista na chefia de todas elas.
Junto a libertinos arruinados, com duvidosos meios de vida e de duvidosa procedência, junto a descendentes degenerados e aventureiros da burguesia, vagabundos, reservistas da tropa, ex-presidiários, fugitivos da prisão, escroques, saltimbancos, delinquentes, carteiristas e pequenos ladrões, jogadores, chulos, donos de bordéis, carregadores, escrevinhadores, tocadores de realejo, trapeiros, afiadores, caldeireiros, mendigos – em uma palavra, toda essa massa informe, difusa e errante…» – Karl Marx
Porra, o Carlitos tinha mentalidade de há 200 anos e também dizia merda? Olha, por esta não esperava, eu a pensar que havia santos…
Mitra, chunga.
Encontrados em reality shows tipo BB ou Ex on The beach.
As definições «guna» ou «mitra» são os nomes dados a menores de idade que se dedicam à prática de crimes.
No Porto são gunas, pá! Mitras é em Lisboa. Estás perdoado porque o texto tem muita piada!
Muita piada !!!!!
Tem piada .
Pois e, por acaso, não passou aquela canção dos Pink Floyd que diz…
“Hey teacher, leave the mitras alone!” ?
Confere.
Está estabelecida a popularidade da chungice.
Pois está.
Agora que Vosselência cá chegou, ó Pink Menos, não há dúvidas!
Oi ?
Olhem quem fugiu do gulag sanitário, isto está tão mau que sai de lá a fascinar-se pela sexualidade adolescente.
Esta juventude está perdida.