Croniquetas de Maputo: homens adormecidos

Negócio florescente em Maputo, é o da segurança privada. Enormes painéis nas empenas dos edifícios mais altos anunciam serviços de segurança, encontramos empresas de segurança em ruas insuspeitas, cruzamo-nos nas avenidas com jipes paramilitares, confundimos os seus profissionais com polícias se não estivermos familiarizados com os uniformes, espantamo-nos ao vê-los ostentando armas, algemas penduradas na cintura, bastões ameaçadores.

Existem empresas cheirando a dinheiro, brilhando nos seus equipamentos inspirados em filmes americanos, empresas assim assim, empresas modestas, de fardamento surrado, que prestam serviços ao pequeno comércio, seguranças de ministérios ou organismos oficiais, meros cidadãos particulares, alguns uniformizados outros não, a quem chamam guardas, etc, etc.

De vez em quando, à porta de pequenas lojas em pleno dia, deparamos com um guarda armado com algo parecido com canhangulos de aspecto artesanal e anacrónico.

Este modelo securitário, de inspiração sul-africana e bem aproveitado pelas empresas de segurança (muitas delas detidas por europeus e sul-africanos), explora um medo e uma insegurança que nada tem de comparável entre as duas realidades.

Por isso mesmo, à noite, a partir das onze e meia, meia-noite, quando as ruas da cidade parecem absolutamente desertas, encontramos dezenas de homens a dormir encostados a portas e paredes, [Read more…]

Croniquetas de Maputo: o lixo e a chuva

Uma das primeiras coisas que nos assalta os sentidos, em Maputo, é o lixo. A visão do lixo, o cheiro do lixo, o cuidado com o lugar onde se põe o pé. A cidade não está preparada para lidar com o lixo que produz, a política de recolha e transformação é quase inexistente, os raros contentores parecem ter sobrevivido em mau estado a campanhas sucessivas no Iraque, no Afeganistão, na Líbia, nos campos de treino de uma escola para bombistas, amolgados, retorcidos, a tombar para os lados. Servem como mera indicação de uma zona geográfica em volta da qual se acumulam quantidades enormes de lixo. Não é raro, de dia ou de noite, encontrar lixo a arder, contentores em chamas, fumo negro toldando pequenas zonas da cidade. Outras vezes sentimo-lo à distância pelo cheiro de mil e uma coisas diferentes em combustão simultânea.

Em alguns locais, em algumas ruas, o lixo vai-se acumulando sobre o lixo, pessoas e automóveis pisam-no e compactam-no, nivelam-no, entupindo escoadores e valetas, tapando buracos aqui e ali. Os pobres dos pouquíssimos trabalhadores dos serviços de recolha, desprovidos de meios, acompanham camiões de lixo que há muito deixaram de ser basculantes, colocam um lençol de plástico no chão e vão empilhando lixo sobre ele, depois levantam-no, balançam-no uma, duas, três vezes e upa,  [Read more…]

Croniquetas de Maputo: Toponímias

     O Nuno lançou-me um repto que eu queria concretizar: fotografar a sua antiga casa em Maputo, numa rua que tivera nome de princesa e agora ostenta nome de presidente/poeta.

A Av. Salvador Allende, tinham-me dito, era perpendicular ao Hospital Central, o qual ficava entre as avenidas Eduardo Mondlane e Agostinho Neto. Estando eu na popular Rua do Bagamoyo, e sendo ainda um esticão até à avenida do  chileno, convinha-me decidir como lá chegar.

Podia ir a pé pela Karl Marx acima, cruzar a 24 de Julho, a Ahmed Sekou-Touré e apanhar a Eduardo Mondlane bem junto ao cemitério hindu. Mas também podia subir a Av. Samora Machel, seguir a Ho Chi Min, virar na Amilcar Cabral e continuar pela Agostinho Neto ou, até mesmo, pela Mao Tsé Tung, sem no entanto chegar à Kim Il Sung,  e entrar na Salvador Allende pelo seu início.

Também podia ir de taxi, é claro, negociar o preço antes de entrar, ter o dinheiro mais ou menos contado, passar pela Vladimir Lenine,  [Read more…]