Alma errante

Durante o almoço do Aventar, no Porto, falou-se de Angola e de um novo correspondente que se prepara para nos enriquecer com novas da antiga jóia da Coroa lusitana.

Ao ouvir falar de Angola, como que revisitei esta minha alma, amaldiçoada a ser errante, por entre caminhos, pousos e, também, rótulos.

Por ter nascido em Angola, fui rotulado de “branco de segunda”. Essa tão iluminada condecoração, dada pelo provincialismo reinante no colonialismo português. Tal como, uma vez cá, tentaram catalogar-me de “retornado”. Estatuto que sempre repudiei. O resto da família, sim. Eu, não. Pois que “retornado” seria no dia em que retornasse aonde nasci: Angola. Era uma questão de semântica. E o meu refúgio, e também o meu tormento, desde então, foi esse: o da língua portuguesa, o das palavras.

Em Portugal não me sinto “retornado”, pois não parti de cá. Disso, tenho safado a pele. Do “branco de segunda”, é que não, embora a pele ateste o contrário. Mas, disso, pouco importa.

O problema maior, é estar como que preso no tempo, e perdido no espaço. Pois que a terra onde nasci mantém-se no espaço, mas perdeu-se no tempo. E o país onde vivo, é diferente do que me contam de outrora, e diferente, também, do que me disseram que ia ser.

Entre o passado suspirado e o presente entristecido, a memória e a dúvida, o sonho e desalento, algures, ruma a minha alma, errante, como que em busca de si mesma.

Um dia ela há-de reencontrar-se, entre a saudade viva e o desalento sentido. Como  portuguesa que é.