Memória dos anos 80 e seu Bloco Central

Não sei o que bebem nos jantares parlamentares de Natal, mas produz efeitos notáveis. António Costa recordou e exaltou os tempos do Bloco Central dizendo  que nos anos 80 “tudo teria sido impossível sem a grande capacidade de mobilização, sem a capacidade política mobilizadora do colectivo nacional que Mário Soares assegurou e nos permitiu sair da crise”. Como há sempre uma emenda pior do que o soneto, já reforçou a asneira:

O que eu quis sublinhar é que o bem mais precioso que o país tem perdido ao longo destes anos é a confiança e que não há nenhum país que seja capaz de vencer uma crise, de superar as suas dificuldades sem recuperar a confiança e dei o exemplo do doutor Mário Soares e da forma como liderou esse Governo.

Deve pensar que a malta anda com amnésia, ou que a tia Merkel também nos ofertou a prima Alzheimer.  Nem de propósito esta tarde passei pelo meu sótão e como de costume não encontrei o que procurava mas dei com um saco onde, entre outras memórias do meu tempo de estudante, estava esta preciosidade:

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O artigo tem a curiosidade de ter sido escrito pelo Marinho da Anop, hoje mais conhecido por António Marinho Pinto, que me substituíra na coordenação do primeiro jornal da Secção de Jornalismo da AAC, episódio que, esse sim, deixo para trás, pela consideração que me merecem vários dos envolvidos. O mesmo não direi da Luís Parreirão, que de presidente da Direcção-Geral saltou para uma conhecida carreira na política e negócios, mais nos negócios Mota Engil que na política.

Isto é apenas uma amostra. O Bloco Central tinha uma missão, que cumpriu com dterminação: limpar Portugal dos vestígios do PREC, a eito, e com particular empenho na recuperação de um capitalismo puro e duro que tanto tremera. Foram anos de confiança? sim, foram, basta recordar a confiança com que o clã Espírito Santo regressou a Portugal e se transformou no topo da casta dona disto tudo.

É verdade que o Mário Soares do “temos de viver com aquilo que temos” sempre teve uma diferença em relação ao seu sucessor Passos Coelho: apostou na capacidade de desenrascanço dos portugueses (a expressão também é dele) e houve um fechar de olhos para a pequena economia paralela, que enganou a fome a muita gente.  A polícia de choque quando actua tem duas opções: ou deixa à multidão uma escapatória, por onde se pire e desenrasque, ou cerca-a e vai dando cacetada em todos um a um. Não há melhor imagem para encontramos a diferença entre a austeridade da dupla Mário Soares/Mota Pinto e a do par Passos Coelho/Paulo Portas.

Quanto a António Costa, continuarei a acompanhar a sua caminhada para o poder com a certeza de que vai criar esperança e confiança em muita gente, farta dos filhotes do colonialismo que assaltaram o poder, precisamente porque prometeram não fazer o que fizeram em dobro.

Daqui a dois anos, quando de vez acabarem as ilusões sobre os partidos que nos trouxeram até aqui, a um país onde a corrupção e o poder da casta é lei, conversamos. Haja entretanto juízo na esquerda (que talvez aprenda com o que se apresta para suceder na Grécia e no estado espanhol) e se construa uma alternativa.

 

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