
@ Buena Vista Pictures/Photofest
O Clube dos Poetas Mortos era o grupo das pessoas que queria sugar a essência
da vida. Que queria extrair de cada pequeno momento tudo o que ele teria para dar.
O filme é aclamado pela crítica, é citado vezes sem conta, mas parece-me que nós, enquanto seres-humanos, nem sequer chegamos perto de o perceber.
Quando nascemos, a vida está-nos praticamente pré-estabelecida. Sabemos que temos um percurso escolar obrigatório, é-nos quase impingida uma ida para o ensino superior, por forma a construir uma carreira que dure 40 ou 50 anos, a reforma na casa dos 60 e depois o calendário, como nas prisões, de quantos dias faltam até morrermos.
Estamos tão anestesiados com esta ideia que nem percebemos o quanto ela é assustadora e castradora. Usamos estes edifícios da vida pré-construídos, quais construções em cadeia, porque são mais fáceis. Aparentemente mais certos. Usamos esta “fórmula mágica” vazia de verdadeira magia para nos escondermos dos medos e dos fantasmas da instabilidade, do perigo, do desconforto.
E talvez possamos morrer continuando a acreditar nesta farsa travestida de caminho correcto. Farsa porque nos diz, erradamente, que há uma fórmula mágica para todos. Que há uma resposta para a questão da vida que encaixa em toda a gente. Não percebemos que essa ideia falaciosa nos esgota, nos consome, e nos retira a individualidade que nos é própria e intrínseca. Aceitamo-nos cordeiros de um rebanho gigantesco, aceitamos que somos todos iguais, porque temos medo.
Medo de arriscar, medo de sentir. Temos medo daquilo que a vida nos dá de melhor. O sentimento. Achamos que ele não chega para suportar tudo. Achamos, até, que ele tem um qualquer preço. Escravos do dinheiro e do fantasma da estabilidade financeira, baixamos a cabecinha e damos passos muito vagarosos, muito pequenos, analisando o chão múltiplas vezes para termos a certeza de que estamos a pisar terra firme.
Mas e se não for firme? E se ao pousar o pé sentirmos o chão a tremer e tivermos uma descarga de adrenalina que, por meros segundos que sejam, nos faz sentir humanos?
E se chegarmos ao final da vida e sentirmos um arrependimento profundo por não termos feito mais? E se, como João da Ega, dissermos que falhamos a vida? Valerá a pena tanto medo, tanto receio, para, anos e anos mais tarde, sermos corroídos pelo arrependimento, às portas da morte?
Devíamos deixar de pensar que somos imortais. Que temos todo o tempo do mundo. Devíamos arranjar, ou no mínimo procurar, o equilíbrio perfeito entre a estabilidade da vida propriamente dita e da nossa parte emocional. Devíamos deixar-nos levar pelas nossas paixões. Porque as carreiras acabam, os filhos crescem e saem de casa. Mas as paixões, os sentimentos, tudo o que nos faz sentir vivos, perdura para sempre. Aliás, morreremos sempre com um sentimento: mas temos a capacidade de escolher se queremos que seja a paixão e a alegria de uma vida vivida; ou o arrependimento dos e ses… que nunca concretizamos.
Belo texto. Parabéns.
Pois deixe lá isso!
Num país onde um primeiro-ministro corrupto é ilibado daquela maneira por um juíz inepto, não vale mesmo a pena viver! Dito de outro modo: a essência da vida está pelas horas da morte.
Pois. Era um filme onde um professor mandava os alunos arrancarem páginas de um livro. Não atinjo a diferença relativamente a queimar um montão de livros, não sei se estão a ver…. É um problema que eu tenho, está claro. E que vou tentar manter.
Lembro-me de que andava no liceu quando saiu este filme; era poucos anos mais novo do que os personagens. Todos os meus colegas adoraram, foi de facto mui aclamado, com uma notável excepção – o crítico Roger Ebert. Cito:
“No final do curso de um grande professor de poesia, os estudantes deviam amar a poesia; no final do semestre deste professor, o que eles realmente amam é o professor.”
Só o li muitos anos depois, mas bate certo com o que me pareceu: como todas as americanadas, mesmo as supostamente ‘profundas’, um filme superficial e manipulador. Mas tem os seus momentos; e não é injusto dizer que marcou a minha geração, nascida digamos entre 1970 e 1980. Ensinou-a a dizer carpe diem.
Alguns anos depois, outro filme convidava-nos a pensar no sentido da vida: Trainspotting. Para mim, melhor: a fuga de Renton ao som de Born Slippy, a dizer-nos como ia finalmente ‘choose life’. Getting by. Looking ahead. The day you die.
O César Alves encara a alegria e a ausência de arrependimentos como a vitória na vida: se morrermos felizes não falhámos. É uma maneira de ver a coisa; se calhar a única maneira.
A verdade é que não há grande remédio. Façamos assim ou assado, no fim morre-se e nada importa. Passamos umas décadas, meros instantes num universo que nos é indiferente, a enganar-nos – a fingir que importa. Mas não importa.
Todos morrem, tudo acaba. Até os filhos, até os netos. E os netos deles. Tudo que fazemos é uma tentativa de esquecer isto.
O que importa é o que o Filipe acreditar que importa. Nem mais, nem menos.
É uma liberdade que assusta, e que muitos compreensivelmente não querem lidar com. Mas só depende de si.
Não é verdade que “nada importa”. O objectivo da vida é sermos capazes de resolver o melhor possível os nossos problemas e ajudarmos os outros a resolverem os seus. No fundo, de tornarmos o nosso mundo um pouco melhor.
Isto é particularmente importante nesta época de alterações climáticas. Todos nós somos responsáveis pelo mundo que deixamos à próxima geração.
Resolver problemas, ajudar os outros. Certo. E depois?
O resultado será o mesmo: todos morrem, tudo acaba. Até a próxima geração. E as cem gerações seguintes.
Basta cair um asteróide de alguns Km, o que irá acontecer um dia, e até as alterações climáticas serão irrelevantes. Toda esta treta para nada. Na melhor das hipóteses seremos esquecidos; na pior nem cá estará alguém para esquecer-nos.
Não é niilismo, é mero realismo. Mas acho bem que pense como pensa. Eu também assim penso. Que remédio.