PSD: A falta de gravitas

Quando se trata de um tema tão sensível como esse, nós temos de ter muito bom senso no seu tratamento. Estamos a falar de pessoas, de pessoas que são vítimas em muitos casos de redes de utilização de seres humanos, e estamos a falar de deficiências do funcionamento do enquadramento dessas pessoas na sua legislalização ou no acompanhamento da sua atividade laboral, e isso já é uma responsabilidade nossa”, Marcelo Rebelo de Sousa.

Quando é preciso que seja Marcelo Rebelo de Sousa a chamar a atenção às crianças na sala, está tudo dito. O Presidente da República, que sabe mais a dormir que esta malta acordada, já percebeu que o centro direita foi tomado pela falta de bom senso. Portanto, se para Montenegro “Portugal deve “procurar pelo mundo” as comunidades que possam interagir melhor com os portugueses“, já Moedas prefere a regra “imigrantes só com contrato de trabalho“. Um tipo distraído ouve, entre uma mini e uns tremoços, e até é levado a concordar: então não e melhor que saibam português e que tenham contrato de trabalho? O bom é mesmo inimigo do óptimo e Marcelo lá teve de explicar à canalha a realidade: “Quando se trata de um tema tão sensível como esse, nós temos de ter muito bom senso no seu tratamento. Estamos a falar de pessoas, de pessoas que são vítimas em muitos casos de redes de utilização de seres humanos, e estamos a falar de deficiências do funcinamento do enquadramento dessas pessoas na sua legislalização ou no acompanhamento da sua atividade laboral, e isso já é uma responsabilidade nossa“.

Vamos ao mundo real. Traduzindo para português corrente, Montenegro prefere que os imigrantes sejam “falantes” de português. Isto se não formos interpretar a coisa de forma mais lata e entender que a palavra “interagir melhor” acrescenta “ocidentais” aos falantes tugas. Enfim, para o caso a interpretação mais restrita chega. Já Moedas não faz a coisa por menos: “imigrantes com contrato de trabalho“. Vamos então por partes.

Vamos partir do pressuposto que os dois destacados responsáveis políticos do PSD não são ignorantes. Não o sendo, sabem perfeitamente os diferentes caminhos que motivam uma pessoa a vir para Portugal. Sobretudo, a procura por uma vida melhor do que aquela que o seu país de origem oferece. E sabem que, nesse ponto, não somos a última bolacha do pacote. Obviamente, o facto de pertencermos à UE favorece essa escolha, nem que seja como trampolim. Depois temos as máfias e a procura, por parte de empregadores portugueses ou estabelecidos em Portugal, de escravos ou perto disso. E nestes dois casos estamos perante crimes que não são evitados com pseudos “fechos de fronteira” ou “muros” ou com domínios de língua, como a história nos ensina. E como Montenegro e Moedas muito bem sabem. Como sabem que, actualmente, temos um problema sério de demissão do Estado fruto de todas as trapalhadas ao longo dos tempos com o SEF e com a falta de meios das forças de segurança. Quando o Estado se demite cabe aos nossos representantes resolver o problema e não lançar cortinas de fumo.

Depois temos o momento “a mim ninguém me dá lições”, um clássico da política portuguesa que eu julgava, por tão ridículo, já ter caído em desuso mas que Moedas recuperou com toda a força: “Eu fui emigrante, sou casado com uma imigrante, não aceito lições de ninguém nesta matéria“. Estamos tramados. Carlos Moedas ainda está excitado com a vitória nas autárquicas. Até pela sua experiência pessoal ele sabe que a história de “imigrantes só com contrato de trabalho” é demagogia. Barata. Neste momento em que o centro direita e a direita precisam de gente adulta, de se apresentarem como uma verdadeira alternativa ao Partido Socialista. Não para ganharem eleições como se isso fosse um jogo de futebol. Para as ganharem por se apresentarem como uma alternativa com um programa sério e com gente capaz.

O problema é mais sério do que parece. E tanto Montenegro como Moedas sabem muito bem. Os dois grandes partidos sabem muito bem. Sabem o que alimenta as máfias que nos trazem estes escravos vindos da Ásia. É que são empresários conhecidos dos partidos que contratam estas pessoas. Empresários que costumam receber políticos nas suas empresas, com todas as mordomias e que são vistos como exemplos de “empreendedorismo”, esse palavrão que tantos gostam de usar. Empresas que alimentam os seus lucros com salários de miséria, que colocam esses trabalhadores a viver em condições miseráveis – e que venha o primeiro autarca dizer que desconhece os apartamentos onde vivem multidões ou os barracões onde os colocam em terrenos baldios ou em “estaleiros de obra”. E que não sabem quem os contrata. E como as coisas se passam. Está à vista de todos, nas ruas das nossas cidades e até nalgumas aldeias. Quantos de vós não os viram a deambular nas ruas das nossas cidades? Naquele prédio daquela rua? Quem já trabalhou em câmaras municipais sabe que estas coisas não passam despercebidas a quem de direito. E o que fazem? Deportar esses desgraçados ou punir quem os explora? Sim, Marcelo Rebelo de Sousa está a ser corajoso, está a ser uma das poucas vozes decente no centro direita e direita democrática que o PSD diz querer representar. A sua voz não pode ser calada e deve ser amplificada dentro do PSD, sobretudo quando pede “aos dirigentes sociais-democratas que não vão atrás da “emoção” e da tentação de “captar votos e ser mais populista”.

E ter de ser o Presidente da República a recordar aos dirigentes da sua família política que: “Um país com emigrantes espalhados pelo mundo não pode ter dois pesos e duas medidas” é ainda mais gritante do desnorte, da falta de bom senso e, sobretudo, da falta de gravitas desta gente. Uma varidela de alto a baixo pode não ser suficiente. Este PSD é um cadáver adiado…

 

Breve nota final: Alguns amigos meus, leitores do Aventar e militantes do PSD, fizeram-me sentir o seu desconforto com os meus últimos escritos sobre o partido. Expliquei que a questão é muito simples, sendo eu um eleitor de centro direita e direita sou mais exigente com os “meus” do que com os outros. O facto de o partido em que mais vezes votei ter sido o PSD não me pode inibir de o criticar quando entendo que merece crítica. É a minha opinião pessoal, feita de forma livre como é tradição deste blogue. Como lhes disse a eles, não me dá nenhum prazer, antes pelo contrário e ainda por cima quando tenho “neste” PSD bons e velhos amigos. Só que isso não me pode nem inibir e muito menos limitar a liberdade de expressar o que penso. Ainda por cima quando entendo que o momento é demasiado sério neste espaço político para amadorismo e meias tintas. O perigo de sermos tomados pelos “grunhos” é demasiado real para me calar.

Comments

  1. Anonimo says:

    Magnifique.
    É a resposta-padrão à (suposta e autoimposta) superioridade moral e intelectual da esquerda.
    Ou de como a empatia é um bem em extinção, seja por pressões de direita (eu estou bem, logo vocês também devem estar) ou esquerda (não podes falar de racismo se fores branco).
    Neste caso não podem falar, eu é que estou do lado dos pobres e desfavorecidos, vocês são os burgueses e só eu sei o que é o sofrimento.
    Antigamente era o sabes lá o que a vida custa oh meu.

    Mais um cromo para a colecção

    • Paulo Marques says:

      Claro que toda a gente pode falar, ninguém leva é a sério quando é para tudo ficar na mesma.

    • british says:

      “É a resposta-padrão à (suposta e autoimposta) superioridade moral e intelectual da esquerda.”

      What ?

  2. JgMenos says:

    A gravitas transformada em loas aos tadinhos. Tudo o mais não tem gravidade.
    O novo clericalismo esquerdalho parece herdado das jocistas do Cerejeira.
    Está tudo bêbado!

    • Carlos Almeida says:

      Caríssimo JgMenos

      Chego a conclusão que afinal nunca foi Saazarengo, foi mesmo da ala extrema direita do Estado Novo. Nazi puro
      Fale com o Júdice que tem muito em comum

      A bem da Nação

Trackbacks

  1. […] depois de ter sido criticado por Marcelo pelas declarações xenófobas, diz que não aceita lições de ninguém por estar casado com uma imigrante e por ele próprio ter […]

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