Quanto mais evoluímos, mais nos afastamos da nossa própria evolução: um fenómeno geracional

Hoje em dia já não se medem as distâncias em metros ou quilómetros, ou, até, em minutos. Já são poucos os que dizem “serão 20km, demorarei 30min”.

Agora, no mundo novo e admirável, medem-se as distâncias consoante a percentagem de bateria que se tem no telemóvel. Hoje diz-se: “serão 20km, tenho 18%, devo chegar a tempo”. ‘A tempo’ de voltar a carregar o telemóvel, pois claro; não ‘a tempo’ do compromisso. E isso afecta o nosso dia-a-dia, o nosso humor e a nossa predisposição; falo, pelo menos, e infelizmente, por experiência própria. Actualmente, quando o telemóvel fica inoperacional, apercebemo-nos de que perdemos grande parte das nossas capacidades de interagir com o próximo, especialmente quando ‘o próximo’ está à nossa frente, em carne e osso, na vida real. E este é um fenómeno premente, sobretudo, nas idades mais jovens. Fazer conversa com um idoso enquanto se espera pelo autocarro foi substituído com fazer conversa com um desconhecido, atrás de um monitor iluminado, muitas vezes sem saber sequer se esse desconhecido é real ou não. O Ser Humano continua à espera da chegada da vida alienígena, quando o mesmo anda alienado faz tempo.

Estamos já tão moldados pelas novas tecnologias que chegaram e, em tão pouco tempo, tomaram conta da nossa vivência a todos os níveis, que chega a ser confrangedor o nível de satisfação que atingimos quando temos um gadget qualquer com a bateria nos 100% ou quando encontramos uma tomada para podermos carregar o té-lé-lé… mesmo que essa tomada nos obrigue a sentar no chão… de uma estação de autocarros em ruínas… em Idanha-a-Nova… e que o chão cole.

Assim vai o mundo e nós vamos com ele. Quando formos, os gadgets ficarão… até que se lhes morra a bateria.

Comments

  1. J. M. Freitas says:

    As coisas não me parecem tão dramáticas. Acontece isso sempre que aparece algo de novo, ou não? Por vezes imagino o que se poderia ter pensado quando se inventou a fala, a escrita, o domínio do fogo, a gravação da voz, a gravação de imagens, o automóvel, etc. Coisas que alteraram profundamente a vida e, portanto, os hábitos. Que seria dos comentadores de futebol se não existissem vídeos e a possibilidade de repetir as jogadas e fazer o jogador andar para trás? E penso no que seria se já existissem telemóveis e WhatsApp há uns século. Imagino vasco da Gama a enviar vídeos da Índia para D. Manuel I com os comentários: “ó Manel já cá tou”. “Olha-me para estas ´
    indias, muita boazudas”. Etc.
    Em todos os casos haveria (houve) que achasse que o mundo estava perdido! Ou não?
    E nas glaciações e subsequentes aquecimentos? Quantos cavernícolas não ficariam doentes com o aquecimento ou arrefecimento global? E quando desaparecerem os Dinossáurios? Ai a biodiversidade!!


  2. Cada vez mais as pessoas as pessoas se queixam que não têm tempo, nem para si nem para os outros – as relações acabam porque as pessoas precisam “respirar”! – mas depois conseguem ter tempo para fazer um horário de trabalho de seis ou mais horas, todos os dias, sábados, domingos e feriados incluídos!, nas redes sociais.

    Ainda na 6a feira o meu novo colega de treino lá no clube, de cinquenta anos, me dizia que disse ao filho, de 16 anos, se ao menos não queria passar lá “só para ver” e então se gostasse poderia experimentar a modalidade. Ele contava-me como antigamente treinava à noite num clube e no dia seguinte já estava a treinar no outro, e que adorava tudo que era desporto. “Tenho uns trinta troféus de melhor guarda-redes”. E ele bem quis que o filho fosse na 6a feira, mas ele não foi, porque “ele não liga nada ao desporto”. Mas temos que compreender, porque, por certo, o puto “não tempo” a perder para abandonar a tecnologia.

  3. Paulo Marques says:

    “Nossos jovens agora amam o luxo, têm más maneiras, desprezam a autoridade; mostram desrespeito aos mais velhos e gostam de conversar ao invés de estudar. As crianças agora são tiranas, não as servas dos seus lares. Elas já não se levantam quando os idosos entram na sala. Elas contradizem os pais, interrompem os convidados, devoram a comida e tiranizam os professores.”
    Sócrates, há uns aninhos