Francisco Louçã, um negacionista?

Todos nós conhecemos Francisco Louçã, atual Conselheiro de Estado. Sabemos que tem uma obsessão pelos seus fantasmas neoliberais e que faz parte de uma classe desonesta que tortura a realidade até que ela fique a seu gosto. O próprio Francisco Louçã, que em pouco dignifica o meu bonito nome, teve também momentos infelizes em que tenta colar nomes como Friedman e Hayek a autênticos facínoras, recorrendo a citações totalmente descontextualizadas. Também foi apanhado a mentir sobre a taxa fixa proposta pela Iniciativa Liberal e foi ainda desmascarado por Mário Amorim Lopes numa troca de galhardetes que foi do Expresso ao Observador. Não tenho o meu homónimo como uma pessoa séria e honesta. Trata-se de um dos grandes normalizadores da extrema-esquerda em Portugal e, atenção, com todo o mérito. No entanto, como puderam ver, o meu título não é uma afirmação. É uma interrogação. Custa-me crer que uma pessoa com elevada cultura e que já conheceu tantas realidades seja negacionista. Pode ser uma má interpretação minha e prefiro isso do que ter um Conselheiro de Estado que negue algo que o próprio Estado reconhece.

 

A que se deve tudo isto? No seu espaço na SIC Notícias, Louçã trouxe um discurso de Aline Beuvink, em 2019, na Assembleia Municipal de Lisboa. Por momentos, fez-me lembrar o Facebook que de x em x tempo tem de trazer algo antigo como se fosse novo. Mas o grave não é isto. Aline Beuvink, num estilo que não aprecio muito, fez um belo discurso que explica o porquê do mito sobre os comunistas comerem crianças ao pequeno-almoço. A própria explica que isto não é literal, é um “mito com fundo de verdade”, porque foram as políticas comunistas adotadas pelo regime que de forma propositada causaram fome a milhões de pessoas. E esta fome levou a um desespero tal que deu origem a canibalismo no Século XX. O Holodomor levou à morte pela fome de pelo menos 3 milhões de ucranianos e de forma deliberada. Francisco Louçã desvalorizou isto tudo e ainda fez questão de dizer que há uma certa direita que acredita nestes mitos, focando-se apenas na parte literal de “comunistas comem criancinhas”, ridicularizando e assim fugindo à verdadeira questão.

 

O que me choca aqui não é a insensatez de Francisco Louçã, muito honestamente. O que choca é reparar que isto não é motivo de revolta. Enche-me de vergonha que até uma facha como a Le Pen afaste o próprio pai do partido por causa de declarações chalupas (é o termo técnico) sobre o Holocausto, mas que no meu país ninguém se questione sobre as declarações de Francisco Louçã.

 

Provavelmente, Francisco Louçã não teve intenção de negar coisíssima nenhuma, mas o escrutínio é necessário. Por menos do que isto, na minha humilde opinião, José Rodrigues dos Santos foi crucificado por dizer aquilo que ele acha que estava na cabeça dos Nazis, nem sequer era uma opinião.

 

Resta-me orgulhar-me de me identificar com a única família política que ataca todo e qualquer totalitarismo. Não é preciso fazer equivalências sequer, basta serem suficiente maus para reprovar ambos sem um passo atrás!

 

 

Comments

  1. POIS! says:

    Pois tá bem!

    Não consegui ver muito bem o que V. Exa. veio aqui vender, mas reserve-me duas caixas, pelo sim pelo não.

    Será que foi a esta citação de Hayeck (Entrevista ao jornal “Mercurio”, 1981) a que se referiu como “fora do contexto”?

    PERGUNTA: What opinion, in your view, should we have of dictatorships?

    HAYECK: Well, I would say that, as long-term institutions, I am totally against dictatorships. But a dictatorship may be a necessary system for a transitional period. At times it is necessary for a country to have, for a time, some form or other of dictatorial power. As you will understand, it is possible for a dictator to govern in a liberal way. And it is also possible for a democracy to govern with a total lack of liberalism. Personally I prefer a liberal dictator to democratic government lacking liberalism. My personal impression — and this is valid for South America – is that in Chile, for example, we will witness a transition from a dictatorial government to a liberal government. And during this transition it may be necessary to maintain certain dictatorial powers, not as something permanent, but as a temporary arrangement”.

    Isto passou-se em 1981, no Chile. O “temporary arrangement” já durava desde 1973. E durou ainda mais nove anos.

    A falta de contexto sofreram-no os torturados do Estádio Nacional (alguns salvos “in extremis” pelos esforços dos embaixadores da Suécia e da Finlândia) e das masmorras dos quartéis.

    Deve ter também sido a falta de contexto que levou Hayeck a viver grande parte da vida encostado o Estado de diversos países.

    • Francisco Figueiredo says:

      Já que gosta de inglês, aí vai. E parabéns, que o dia de hoje também é sei.
      https://mises.org/wire/no-hayek-didnt-support-pinochet-regime

      • Filipe Bastos says:

        Sobre o seu caro Hayek, jovem Francisco, outra história.

        O ‘índice da liberdade económica’, tão acarinhado por todos os direitalhas, nasceu em 1984 num clube fundado por Hayek. Friedman e a esposa, outros dos seus heróis, eram membros do clube e decidiram criar o tal índice.

        Quando saiu o 1º ranking, surpresa: entre as economias mais livres do mundo estavam as Honduras e a Guatemala, então duas ditaduras. Porquê? Porque a sua definição de liberdade excluía a democracia; os impostos eram vistos como roubo; a austeridade era o único caminho para o topo.

        Como o índice e a citação do POIS comprovam, os seus heróis definem qualquer aspiração de justiça social como ilegítima, e tornam os estados meros guardiões do poder económico. Stephen Moore, um compincha do Trampa, disse-o de forma cristalina: “o capitalismo é mais importante que a democracia”.

        Para eles, a economia tem de ser protegida da política – a ponto de um governo autoritário que protege os mercados ser preferível a um democrático que os queira alterar.

        • Francisco Figueiredo says:

          Não me admira haja quem ache que um modelo económico é mais importante do que a democracia. Simplesmente, não é liberal. A liberdade económica é necessária, mas não é suficiente. Parabéns a si também!

      • POIS! says:

        Pois tá bem!

        Um artigo do “Mises Institute”? Ahhhh! Ahhhh! Ai que o Figueiredo é tão cómico! Ah! Ahhhhh! Ahhhh! Ai que nem posso! Já não me ria tanto desde que ouvi o Pinto da Costa a dissertar sobre a fruta, fora do contexto! Ahhhh!

        Pois é Sr. Figueiredo. O problema deve ser mesmo a falta de contexto.

        Em 1977 Hayeck foi ao Chile, esteve à conversa com Pinochet. Em 1981 voltou lá e deu aquela entrevista ao jornal “Mercurio”. Depois voou…para a Argentina, assim para mudar de ares ditatoriais.

        Se o contexto não estava, é porque terá “desaparecido”. Talvez estivesse mesmo a praticar desportos radicais a partir de alguma aeronave militar, o chamado “Plane Diving”.

        • POIS! says:

          Uma precisão: voou para a Argentina em 1977. E daí para o Brasil, onde o “temporary arrangement” durava desde 1964 e continuou até 1985. Foi um fartote de faltas de contexto.

    • remember... says:

      Pois meu caro, V. demonstra uma grande ignorância. Eu explico: há uma grande diferença (e V. faz uma grande confusão) entre os dois conceitos Ditadura e Tirania, diabolizando a primeira. Só prova que não aprendeu História. Comece por estudar sobre Roma. Acontece muito as pessoas fazerem uma amálgama
      Por isso, claro está que não percebeu o que disse Hayek nem podia perceber, pois não tem os conhecimentos básicos necessários. Em linhas gerais explico-lhe que um Ditador é legitimado pelo povo e colocado no poder pelo próprio povo por um período de tempo determinado pela necessidade e pela urgência que o momento político exigir. É uma escolha deliberada pelo povo e portanto aceite. A Ditadura será sempre temporária, como vê, mas legítima e aceite. Quando termina o período de necessidade e de emergência por motivos circunstanciais, o período de Ditadura cessa funções. A Ditadura é um “intervalo” no regime, como vê. Corresponde, portanto, a um período transitório e de suspensão temporária até que tudo se normalize de novo. Percebe agora o HayeK?
      Já a Tirania (conceito que V. confunde com Ditadura) é ilegítima, pois o tirano “assalta” o poder, não é escolhido pelo povo, eterniza-se no poder sem qualquer mandato legal nem legítimo e suspende autoritariamente as Leis em vigor no país e subvertendo o regime vigente até então. Como se depreende é um regime ferozmente autoritário e autocrático, com um poder ilimitado e sem prazo. Aprofunde se quiser e assim o entender.
      R.

      • Filipe Bastos says:

        Pois está a ver, POIS?

        Há ditaduras boas, ditadores bons: são aqueles “legitimados pelo povo”, apenas temporários, como um canalizador que é chamado quando um cano rebenta.

        Reparado o cano – coisa de uns mesitos ou anitos – e metida a populaça na ordem, o ditador mete a ferramenta no saco e vai-se embora. Tudo volta à feliz normalidade.

        Não confundir isto com tiranos: estes são canalizadores que ninguém chamou e que não arrumam a ferramenta. São, note bem, ditadores que o povo não escolheu.

        Percebe agora o Hayek? Olhe que o R não dura para sempre.

      • Paulo Marques says:

        Sim, pá, é uma pena que ninguém perceba porque não se usa uma definição ultrapassada em 1900 anos para contextualizar um crápula.

  2. Paulo Marques says:

    As voltas à realidade que os librefachos têm que dar para fazer de contas que têm argumentos. Tal como os proletários a usar garrafas nos armazéns, os outros proletários a contaminarem-se de Covid para que se produzam salsichas, os pobres esturricados pelo mercado em Grenfell, ou os congelados o mês passado no Texas são fruto da mesma “lei natural” que armou Pinochet e o Apartheid, versão recauchutada do que nos levou até ao incêndio do Triangle Shirtwaist Factory onde se aprendeu a dizer chega.
    Podem modernizar o memorando Powell o quanto quiserem, a realidade continua a não concordar. Mas dos anos 30 já sabemos que vivem bem com isso.

  3. Rui Naldinho says:

    Dizer que os comunistas provocaram o canibalismo na Ucrânia durante uma parte do período estalinista que precede a II Guerra Mundial, mesmo em sentido figurado, é apesar de tudo menos verdade, do que aquilo que os europeus fizeram ao colonizaram o continente Americano, nomeadamente a parte norte do continente, exterminando as tribos nativas, conhecidas por índios, como os Sioux, Comanches, Apaches, Navajos etc, etc. Mas podia vir por aí abaixo até ao Chile, que também não faltam exemplos reveladores da forma como os nativos foram tratados de forma bárbara pelos seus dominadores.
    Nunca ninguém se preocupou em contabilizar o número de mortos provocado ao longo de cinco séculos pelo colonialismo europeu, nomeadamente no período esclavagista e depois disso, mas seguramente seria muito superior aos mortos do Holodomor.
    A única coisa que eu vejo fazer é insinuarem que negros e árabes foram ambos contribuintes dessa exportação de escravos, como se não soubéssemos todos como os impérios se moviam no plano regional, para alcançarem os seus objectivos.
    O Mundo sempre esteve recheado de ditadores, fossem eles de que etnia, religião ou ideologia política fossem.
    Jamais avaliarei um político ou um regime apenas porque no ranking da barbarie o Estaline matou mais um opositor do que o Hitler.
    Agora que me dá gozo ver o PCP, o PSD e o CDS a defenderem com unhas e dentes o regime ditatorial Angolano ou Chinês, apenas e só por causa das negociatas engendradas por certas corporações que lhe são próximas, ai sido dá!

    • Rui Castro says:

      Comparar factos semelhantes com 300 a 500 anos de diferença sem contextualizar, vale zero.
      A igreja católica promoveu a inquisição há umas centenas de anos atrás; acha que o Papa Francisco iria mandar empalar Judeus nos tempos de hoje?
      O Henrique viii mandou cortar cabeças às suas variadas mulheres; imagina o Putin, ou o Boris Johnoson a mandar cortar a cabeça às deles?
      Ah… e também gostava de ver neonazis a serem queimados vivos como fizeram com Joana D’Arc?
      Só faltava agora vislumbrarmos agentes da GNR vestidos com armaduras do séc xvi…. Lol

      • Rui Naldinho says:

        Lá está, o velho hábito de alguns puristas relativizarem as coisas no tempo para diminuírem o valor simbólico, histórico e até dramático que determinados fenómenos tiveram nos povos, em determinada época, onde populações inteiras foram extremidades em nome do progresso.
        Toda a História foi construída desta maneira. Uns dominam outros são subjugados. Sempre foi assim e dificilmente mudará, sem se mudar o paradigma do desenvolvimento humano e social.
        Acresce que o extermínio dos índios e a escravatura, mesmo começando no século XVII, só acabou no século XIX, depois de uma guerra civil. E digamos que acabou no papel, porque na realidade no início do século XX ainda eram bem visíveis fenómenos de escravatura em África.
        A colonização das grandes potências ultramarinas durou até ao último quartel do século XX, e no período do Holodomor 1929-1933, segundo rezam os livros de história, a África estava toda colonizada pelas grandes potências europeias. As independências começaram depois de final da II Guerra, em meados dos anos 50.
        O valor político das coisas não se altera pelo facto de ser mais ou menos remoto. Aliás, o fenómeno independentista da Catalunha tem séculos de história. Começou no dia a seguir à unificação de Espanha até aos dias de hoje.
        Se Dom Afonso Henriques não tivesse mandado “foder a mãe”, e declarado a independência de Portugal, face à Castela, ainda hoje estávamos sob o domínio deles.
        Quanto à inquisição, vindo igreja, a entidade mais culta e erudita à época, falando em nome de um Deus que promovia a paz e a concórdia, torna tudo ainda mais abjecto.

        • Filipe Bastos says:

          O valor político das coisas não se altera pelo facto de ser mais ou menos remoto.

          Estranha afirmação. Aceitar a escravatura era tão grave há 500 anos como seria hoje? Um massacre ocorrido na Idade Média pode ser visto à mesma luz que um nazi ocorrido há 80 anos ou um jugoslavo há 30?

          Pode-se afirmar que algo era tão moralmente errado então quanto hoje, o que em si já é discutível, mas não vejo como se possa analisar histórica ou politicamente algo fora do contexto da época.

          Quanto à colonização, é justamente criticada, mas os críticos raramente ou nunca reconhecem culpas aos africanos pelo desastre que África era e continua a ser.

          • Rui Naldinho says:

            Leopoldo II da Bélgica morreu em 1908, vinte anos antes do holodomor. À conta do seu legado terá mutilado e morto milhões de Congoleses. Podia falar dos Holandeses, na Indonésia, ou dos Espanhóis, n’as Filipinas.
            A Rainha Vitória fou monarca do Reino Unido de 1937 a 1901.
            A Independência da Índia foi em 1947. A Guerra Civil nos EUA que pôs fim ao esclavagismo foi em meados do Século XIX, 1864-1865.
            Fingir que estou a falar do Século XV ou XVI é no mínimo fingir-se de ignorante, de forma propositada.
            Estou a falar do Século XIX e XX, já muito depois da Revolução Francesa.
            Eu também não estou a justificar o Estalinismo, muito menos o Holodomor, por causa de uma Revolução Bolchevique, da colectivização dos campos agrícolas, ou pelo facto dos russos estarem envolvidos na II Guerra Mundial, o que de facto aconteceu.
            Sejamos intelectualmente honestos.
            O chamado Holodomor foi mau. Muito mau, mesmo. Mas esse evento durou no máximo 4 anos. A escravatura durou mais do que três séculos, e em 1865 ainda se lutava nos EUA pela abolição da escravatura.
            A colonização mais de 4 séculos. Os Índios foram praticamente exterminados no continente Americano.

          • Filipe Bastos says:

            Entendo o que diz, mas até o mundo de há cem anos não é comparável ao de hoje. As mudanças culturais, sociais, etc. do último século não têm precedente. Tudo acelerou a uma velocidade nunca vista.

            Quando o meu avô nasceu mal havia carros, e nos EUA negros eram linchados todos os dias. Quando morreu já havia internet, globalização, paradas gay e linchado era quem ousasse dizer ‘nigger’ em público.

            Até os anos 60-70 parecem já remotos: que tem o país de hoje a ver com o pré-25 Abril?

            Nada disto justifica atrocidades passadas, mas estas também não podem servir para branquear pulhas e corruptos de hoje – como a nossa classe pulhítica, os chulecos índios ou os líderes africanos de hoje.

          • Rui Naldinho says:

            Sim, o Holodomor foi entre 1931-1933. Cerca de 90 anos, aproximadamente.
            Depois disso, já tivemos a II Guerra Mundial, a guerra da Coreia, o Vietname, dezenas de golpes de Estado na Ásia, África e América do Sul, com um rasto de genocídios; Camboja, Ruanda, Etiópia, por exemplo, dignos da idade média.
            Ver e ouvir alguém simpatizante da monarquia a falar do Holodonor é sempre irónico.

      • Paulo Marques says:

        Não é preciso ir à 300 anos, o genocídio dos nativos americanos continuava bem vivo no século XX, e os trabalhos forçados continuam o legado da escravatura.
        E também é preciso não esquecer a fome Indiana e quem a causou, e não só para dizer que as fotos são da Ucrânia.

  4. lucklucky says:

    “A escravatura durou mais do que três séculos”

    Isto é gozar… A Escravatura durou centenas, dezenas de milhares de anos e foram os brancos, capitalistas, que acabaram com ela. Em África existiam vários estados esclavagistas( Reino de Dahomey por exemplo) e o comerciante de escravos com sucesso era admirado.

    “E também é preciso não esquecer a fome Indiana e quem a causou”
    Sim os Japoneses com a invasão da Birmânia até às fronteiras da Índia.

    “rasto de genocídios; Camboja (Comunistas), Ruanda, Etiópia(Comunistas)”

    São as consequências lógicas do Supremacismo Social da ideia Comunista. Poder primitivo pois querem poder absoluto.
    E os resultados são consistentes em culturas de base muito diferentes: desde a Europa, à Ásia, a África.

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