O triunfo dos lobos

govNum país em que a corrupção ou está legalizada ou é ilegal porém sujeita a habilidades jurídicas que lhe permitem sobreviver, o dinheiro que tem passado pelos cofres públicos serve, há mais de trinta anos, para distribuir favores de modo mais ou menos directo, quando deveria ter servido para desenvolver o país. Em vez disso, passou para as mãos dos que souberam escolher a cor certa, a ponto de ser possível afirmar que um cartão partidário é, no fundo, um cartão de crédito.

Assim, o Estado, democraticamente usurpado por quem o tem roubado, depois de ter gasto o nosso dinheiro em putas e bebidas estrangeiras caríssimas (e não em vinho verde, que, pelo menos, traria receitas ao Minho), vem, agora, dizer que não há dinheiro para o Estado Social, para a Educação e para a Saúde, do mesmo modo que um pai alcoólico poderá queixar-se dos filhos cuja alimentação lhe retira os trocos necessários à bebedeira quotidiana. [Read more…]

Passos Coelho quer tornar o ensino inconstitucional

Conheço, pelo menos, uma pessoa que se preocupa em entender aquilo que Passos Coelho diz: essa pessoa sou eu. Em contrapartida, conheço outra pessoa que não se preocupa nada com aquilo que Passos Coelho diz: é o próprio Passos Coelho. Quando alguém se preocupa com aquilo que (se) diz, procura consistência, deseja coerência. O primeiro-ministro, desde que prometeu não subir impostos ou não retirar subsídios, não está preocupado com aquilo que diz. Ele saberá porquê.

Eu, pelo contrário, preocupo-me. É por isso que reflecti sobre o que li na notícia do Público, ao saber que Passos Coelho voltou a falar sobre ensino e respectivo financiamento.

Vejamos, então. Passos, pelos vistos, constatou que, “apesar do [sic] ensino obrigatório ser gratuito”, as famílias “fazem um esforço muito considerável”, reconhecendo, sem se aperceber, que o ensino, afinal, não é gratuito, mesmo quando é obrigatório. Seria, ainda assim, muito esperar que desenvolvesse um pouco mais esse raciocínio.

De seguida, estendeu a sua análise ao ensino secundário, procurando distingui-lo do obrigatório, e ao superior, voltando a reconhecer que existe, de facto, “aquilo a que se chama um co-financiamento assumido pelas famílias”. Já se sabe que as palavras, para Passos Coelho, não têm grande importância, mas até se poderia ficar com a impressão de que as famílias é que resolveram assumir o co-financiamento, quando, na realidade, foram obrigadas a fazê-lo, porque o Estado não lhes deixou outra saída. [Read more…]

A Educação, em Portugal, é gratuita?

As manobras e as contramanobras do governo à volta do tema da gratuitidade da Educação em Portugal servem para lançar uma cortina de fumo, com o objectivo declarado de vir a sobrecarregar os contribuintes com mais impostos disfarçados. A comunicação social, por desconhecimento ou colaboracionismo, vai ajudando o governo.

Numa reportagem de hoje, no Jornal de Notícias, várias pessoas chamaram a atenção para o facto de que, na verdade, a Educação já não é gratuita, em Portugal, há vários anos: para além dos impostos, a maioria dos encarregados de educação paga manuais, material escolar, transportes e refeições.

Limito-me a juntar algumas reflexões avulsas, só para lembrar que, entre outros problemas, e tendo em conta que as escolas têm ficado com cada vez menos tempo e com cada vez menos recursos, há crescentes dificuldades em proporcionar apoios mais individualizados aos alunos. Para além disso, verifica-se uma progressiva destruição das escolas como instituições que poderiam permitir a alunos mais desfavorecidos o contacto com determinados bens culturais, como a música, o teatro e outras artes e actividades fundamentais para o desenvolvimento harmonioso de qualquer jovem (o próprio desporto escolar sofreu cortes enormes).

Conclui-se, assim, que quem quer proporcionar aos filhos uma educação mais completa terá de pagar por isso. Tendo em conta o empobrecimento geral da população portuguesa e a ruína da Escola Pública, é fácil perceber que os jovens estão, na sua maioria, a ser afastados de uma educação com um mínimo de qualidade.

É claro que, entretanto, há entidades privadas a salivar por poderem deitar a mão à gestão das escolas, desde que o Estado as sustente: tendo em conta que, por exemplo, no sector privado, qualquer trabalhador está cada vez mais desprotegido, será fácil adivinhar que os professores poderão ser obrigados a dar ainda mais, continuando a receber cada vez menos, tal como acontece em muitos colégios, embora haja, sobre esse assunto, um muro de silêncio criado pela necessidade de sobreviver.

O ensino, em Portugal, num futuro próximo poderá ser gratuito para todos aqueles privados que passarem a receber do Estado e dos encarregados de educação.