Inquietações ortográficas

On est encore libre de ses lectures.
Nicolas Sarkozy

Barney Fein: Who are these savages?
David Mamet

Ça commence à devenir, effectivement, très inquiétant.
Dominique Rizet

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Recentemente, consultei a versão electrónica do Expresso e o aspecto era este:

Havia sector e setor, na mesma página: tudo isto é um espectáculo e uma alegria, efectivamente, tudo isto é um forrobodó.

Provavelmente por andar a ler o Diário Oficial da União (para quem não souber, o homólogo brasileiro do Diário da República), o Expresso também transmitiu uns fatos que andam por aí:

No sítio do costume, a festa continua:

Eis, de novo, os factos esquecidos e os fatos novos, mas inadequados. É o tal grão de areia, há muito conhecido em S. Bento, a fazer das suas na engrenagem.

Bem-vindos à adopção do Acordo Ortográfico de 1990.

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O fato da ata

einstein malk

© Arthur Sasse/ AFP (http://bit.ly/1nr6nXc)/© Sandro Miller courtesy Catherine Edelman Gallery, Chicago (http://bit.ly/1C21BaE)

O Dario Silva decidiu trazer-nos o Guevara/Malkovich. Por razões óbvias, prefiro a do Einstein. Graças ao fotógrafo Sandro Miller, o Malkovich e o Einstein regressam ao Aventar, num dia sem grandes surpresas, no sítio do costume:

De tudo o que ocorrer nas reuniões será lavrada ata que contenha um resumo do que de essencial nela se tiver passado, indicando, designadamente, a hora, a data e o local da reunião, os membros presentes e ausentes, os assuntos apreciados, as decisões e deliberações tomadas e a forma e o resultado das respetivas votações, bem assim, o fato da ata ter sido lida e aprovada.

(…)

A Câmara Municipal de Porto Moniz em colaboração com a Escola Básica e Secundária do Porto Moniz, promoverá o apuramento de todos e quaisquer fatos que requeiram esclarecimento no ato de análise das candidaturas.

 

Pare, veja e…leia

Este título não é original: surge no Público de 25 de Julho de 2000 e é um dos vários exemplos de que Dinis Manuel Alves se mune no capítulo 8 (E pontos!…) do livro Foi Você que Pediu um Bom Título? (Coimbra: Quarteto Editora, 2003, p. 160) . É também um dos conselhos a dar àqueles que lêem títulos como O Expresso deixou de adoptar o acordo ortográfico… ou  O Jogo e o Expresso abandonam o acordo ortográfico… e por aí se ficamNão se fiquem pelas reticências do título. Há sempre a probabilidade de, a seguir às reticências, outras reticências surgirem e, depois delas, finalmente, uma explicação. Assim, evitam-se alguns comentários em redes sociais como “boa!”, “Grandes Jornais!“, “Parabéns aos dois jornais”, “Um exemplo a seguir”, etc.

Já sabemos que os fundamentalistas do contexto nunca prestam muita atenção aos títulos. Já discuti esse tema, a propósito do AO90 (lamento o aspecto, mas não tenho culpa). Recentemente, em fugaz ida a Portugal, no regresso de uma visita ao  Castro de Vila Nova de São Pedro, entrei num café e o dono, depois de me entregar o troco, pediu a um cliente embasbacado, como ele, a olhar para o Cyrus ‘The Vyrus no televisor, que lhe desse o Correio da Manhã, “para ler ‘as gordas’”. Não recomendo. Lembrei-me imediatamente do Empson e de Ângelo Correia, que não dispensa a leitura dos jornais ao chegar de manhã ao escritório, contudo, «não os leio completamente, mas fico a conhecer pelo menos os títulos». A ambiguidade é, efectivamente, terrível.

Pronto. Agora, regresso ao P.H. Matthews.