Escritores latino-americanos e poucos europeus – 1ª parte

o recriador da escrita latinoamericana, Gabriel García Márquez, Prémio Nobel

Recebi um repto de um meu amigo sobre a literatura Universal. Perguntava quais eram os autores que eu gostava mais de entre todos os que alagam o campo das letras no nosso planeta. Respondi sem hesitar que os ingleses e os alemães. Como não vou comentar sobre nenhum deles, não é um ensaio, é apenas um depoimento. Se me apertam muito, eu diria que Victor Hugo –  Victor-Marie Hugo (Besançon, 26 de Fevereiro de 1802Paris, 22 de Maio de 1885) foi um escritor e poeta francês de grande actuação política em seu país. É autor de Les Misérables e de Notre-Dame de Paris, entre diversas outras obras. Livros que causaram o seu exílio às Ilhas de Jersey na Grã-Bretanha, por ser adepto à Comuna de París, o primeiro governo operário da história, fundado em 1871 na capital francesa por ocasião da resistência popular ante à invasão alemã.

O poder comunal manteve-se durante cerca de 40 dias. Seu esmagamento revestiu-se de extrema crueldade. De acordo com a Barsa mais de 20.000 communards foram executados pelas forças de Thiers, quem pretendia ver a Monarquia de Orleães outra vez no Governo. Perante tremenda afronta ao povo, Victor Hugo, fundador do socialismo na França, auto exilou-se nas Ilhas Jersey da Grã-bretanha, sítio onde escrevera as suas grandes obras Os miseráveis, que narra a reconstrução do criminoso Jean Valjean para ser um cidadão honrado, conforme os cânones desses tempos. Por outras palavras, ensina como um ser humano é obrigado a ser um criminoso, que a reabilitação existe, mas persegue-nos ao longo de muito tempo, até acabar essa forma de tratamento pela adesão de Jean Valjean à Comuna de Paris.

  • Stefan Zweig seroa um outro, por romancear a História de Europa e os seus cidadãos. Na minha mesa-de-cabeceira tenho sempre comigo Mary, Queen of Scotts. Stefan Zweig (Viena, 28 de Novembro de 1881Petrópolis, 23 de Fevereiro de 1942) foi um escritor austríaco de ascendência judaica. O seu valor para mim, são esses quatro livros antes mencionados, intitulados Maria Antonieta, Fouché, Maria Stuart e Fernão de Magalhães, história romanceada que me acompanharam desde a minha temprana infância e tornou-me um aficionado a História Material, especialmente a narrativa sobre Fouché: Joseph Fouché, duque de Otranto, (Pellerin, 21 de Maio de 1763Trieste, 25 de Dezembro de 1820) foi um político francês e ministro durante a era napoleónica. Era um homem pobre que, como Jean Valjean, sabe refazer a sua vida, especialmente Sua carreira política foi caracterizada por sua grande habilidade em assegurar sua sobrevivência e manter-se no poder a todo custo, independentemente de quem estivesse no comando. Tinha uma ambição desmedida e um senso de oportunidade fantástico. Não se destacava na vida pública, era discreto. Não ia a tribuna, não fazia discursos inflamados ou grandiosos, mas actuava habilmente nos bastidores. Ensinou-me o que era a traição e esse facto denominado virar de casaca conforme quem estivera no poder. Enriqueceu, passou a ser um aristocrata e serviu a Napoleão, ao Buorbon Louis XVIII, a Napoleão outra vez e as Duques de Orleães, já reis da França. Este texto ensinou-me o que era o arrivismo, a servidão e a traição. Agradeço a Stefan Zweig essas aulas em forma de livros, que ajudaram a formar o meu sentimento ético.

Se for por pensar em escritores, a Europa é um manancial de letras, todas elas premiadas e as não premiadas, são um exemplo do que é uma boa escrita. Boa escrita completamente transformada na América Latina pela cuidadosa escrita de , Gabriel García Márquez (Aracataca, 6 de Março de 1927[) é um escritor, jornalista, editor e activista político colombiano.

Recebeu o Nobel de Literatura de 1982, por sua obra, que entre outros livros inclui o aclamado Cem Anos de Solidão. Foi responsável por criar o realismo mágico na literatura latino-americana. Viajou muito pela Europa e vive actualmente em Cuba a lutar contra o câncer. É pai do realizador Rodrigo García. O grande Gabo e quem sabe fazer de um facto real, toda uma fantasia de imensas dimensões. O melhor exemplo e o seu livro de 1967, reeditado milhares de vezes na Editora Mondadori, Madrid. É a saga da família Buendia, que viveu mais de trezentos anos, sempre a repetir as mesmas histórias, a fazer amor com as mesmas senhoras que não parecem envelhecer através do tempo, excepto Rebeca Buendia, que perdeu o seu amor numa grande batalha, essas que apenas acontecem em América Latina. Penso eu que o texto não é um romance, mas mais bem uma narrativa da vida vagabunda ideológica da família do Coronel Aureliano Buendia e o seu amigo cigano Melquiades, quem tinha descoberto o segredo de viver eternamente nesta vida. Esse sonho dos ateus como os Buendia, que nem o sacerdote da aldeia, Macondo, conseguia converter. É um romance neo-realista que faz da escrita da América Latina uma narrativa entre a verdade e a ficção. Ou, por outras palavras, a realidade passa a ser ficção, com factos, pessoas e história retiradas da cidade de Aracataca, cidade em que Gabo passou a sua primeira juventude, para após dedicar-se ao jornalismo. Seu trabalho como jornalista foi para o jornal El Universal. Em 1949 vai para Barranquilha e trabalha como repórter para o jornal El Heraldo. Neste mesmo período participa de um grupo de escritores para estimular a literatura. Em 1954 passa a trabalhar no El Espectador como repórter e crítico.

Em 1958 trabalha como correspondente internacional na Europa, retorna a Barranquilha e casa-se com Mercedes Barcha com quem tem dois filhos, Rodrigo e Gonzalo. Em 1961 vai para Nova Iorque para trabalhar como correspondente internacional, mas suas críticas a exilados cubanos e suas ligações com Fidel Castro o fizeram ser perseguido pela CIA e com isso muda-se para o México. Em 1994 funda juntamente com seu irmão, Jaime Abello, a Fundação Neo Jornalismo Ibero-americano.

Foi o seu trabalho como jornalista e as suas leituras de dezenas de autores, e a histórias contadas a ele pelos seus Avôs maternos, o que influenciara quer as suas ideias, quer a sua escrita. Em Janeiro de 1929, seus pais se mudaram para Barranquilla, enquanto García Marquez permaneceu em Aracataca. Foi criado por seus avós maternos, Doña Tranquilina Iguarán e o coronel Nicolás Ricardo Márquez Mejía. Quando ele tinha oito anos, seu avô morreu, e ele se mudou para a casa de seus pais em Barranquilla, onde seu pai era proprietário de uma farmácia.

Seu avô materno Nicolás Márquez, que era um veterano da Guerra dos Mil Dias, cujas histórias encantavam o menino, e sua avó materna Tranquilina Iguarán, exerceram forte influência nas histórias do autor. Um exemplo é os personagens de Cem Anos de Solidão.

Gabriel estudou em Barranquilla e no Liceu Nacional de Zipaquirá. Passou a juventude ouvindo contos das Mil e Uma Noites; sua adolescência foi marcada por livros, em especial A Metamorfose, de Franz Kafka. Ao ler a primeira frase do livro, “Quando certa manhã Gregor Samsa acordou de sonhos intranquilos, encontrou-se em sua cama metamorfoseado num insecto monstruoso“, pensou “então eu posso fazer isso com as personagens? Criar situações impossíveis?“. Em 1947 muda-se para Bogotá para estudar direito e ciências políticas na universidade nacional da Colômbia, mas abandonou antes da graduação. Em 1948 vai para Cartagena das Índias, Colômbia, e começa seu trabalho como jornalista.

Teve como seu primeiro trabalho o romance “La Hojarasca” publicado em 1955. Em 1961 publica “Ninguém escreve ao coronel”. A obra Relato de um náufrago, muitas vezes apontada como seu primeiro romance, conta a história verídica do naufrágio de Luis Alejandro Velasco e foi publicado primeiramente no “El Espectador”, somente sendo publicada em formato de livro anos depois, sem que o autor soubesse. O escritor colombiano possui obras de ficção e não ficção, tais como Crónica de uma morte anunciada e El amor en los tiempos del cólera. Em 1967 publica Cem Anos de Solidão, livro que narra a história da família Buendía na cidade fictícia de Macondo, desde sua fundação até a sétima geração. Este livro foi considerado um marco da literatura latino-americana e exemplo único do estilo a partir de então denominado “Realismo Fantástico”. Suas novelas e histórias curtas – fusões entre a realidade e a fantasia – o levaram ao Nobel de Literatura em 1982. Em 2002 publicou sua autobiografia Viver para contar, logo após ter sido diagnosticado um câncer linfático.

Escrever sobre Gabriel García Márquez, é uma história de nunca acabar. Apenas o seu texto Crónica de uma morte anunciada, 1982, Bruquera, Madrid, dava para escrever páginas e páginas. Não é o simpático do romance o que atrai ao leitor, é o enredo dos irmãos Pedro e Pablo Vicario, o que faz da Crónica um livro, en conjunto com a personagem de Santiago Nasar, esse que todo o povo sabia que ao ser morto, e o único que não sabia era la vítima. Vítima porque? Porque Bayardo San Roman, o homem más rico do povo casa com Ángela Vicario, mas duas horas depois é devolvida à família porque não era virgem. Conforme factos e hábitos, ninguém e virgem mal chega a puberdade. É desse facto que o autor se baseia para organizar o encontro dos desencontros. O livro acaba com a morte de Santiago Nasar estripado, sem nunca ter feito nada, mas a personagem Vicario diz, no interrogatório, como contaria para sempre na sua vida, que Santiago Nasar tinha sido o seu autor.

Bem sabia ela que não era verdade, mas a fantasia a leva encontrar ao primeiro, o nome adequado para ser seu violador. Não tinha provas, as provas estão na vida real que a personagem usa.

(continua)

Comments

  1. graça dias says:

    li acerca de 5 anos, muitas obras de gabriel garcía m.
    Apreciei e escrita e o escritor. Agora com a descrição do prof, entendo melhor a obra e o homem

    • Raul Iturra says:

      Agradeço a Graça Dias as suas simpáticas palavras. Têm sido três dias para explicitae o que faz tempo, entendo. Agradeço também a sua paciência para lêr o texto!

  2. A Crónica de uma Morte Anunciada é um livro delicioso.

    • Raul Iturra says:

      Tão delicioso, que foi-me imposivel fechar o livro até o não acabar.
      Agradeço as suas palavras, jorge Fliscorno, e essa paciência para lêr o meu texto!

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