O interesse público primeiro

Uma boa notícia vinda do Tribunal da União Europeia: A Agência de Segurança Alimentar é obrigada a dar acesso a estudos sobre a toxicidade do glifosato.

Arrogantemente, a Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar (EFSA) tinha recusado o acesso a estudos científicos sobre a toxicidade do glifosato – argumentando que a sua disponibilização poderia prejudicar os interesses comerciais e financeiros das empresas Monsanto (entretanto Bayer) e Cheminova, elas próprias autoras dos estudos.

Foi com base nesses estudos e contra a opinião do Centro Internacional para a Investigação do Cancro (IARC, na sigla em inglês) da Organização Mundial da Saúde – o qual, em 2015, tinha classificado o glifosato como “provavelmente cancerígeno” – que a EFSA concluiu que o glifosato não apresentava riscos cancerígenos, o que por sua vez levou, em Novembro de 2017, à aprovação pela UE do contestado herbicida até 2022.

Quatro eurodeputados dos Verdes decidiram recorrer ao Tribunal Europeu para exigir o acesso aos estudos, nomeadamente aos capítulos sobre “Materiais, condições e métodos experimentais” e “Resultados e análise”.

Na sentença agora emitida (sujeita a recurso no prazo de dois meses), o Tribunal deu razão aos eurodeputados, considerando que o público tem direito a conhecer os detalhes da pesquisa e que o interesse público está acima do interesse empresarial.

Seria preciso explicar isto a muita gente.

Comments

  1. Fernando says:

    As farmacêuticas também fazem os estudos aos seus próprios produtos, não é verdade?

    Mas o que se pode esperar de organizações – intencionalmente – opacas como a EFSA ou a Comissão Europeia?

  2. Luís Lavoura says:

    Há aqui uma coisa que não entendo.
    Então a Bayer é que fez o estudo, e agora é forçada a revelá-lo?
    Então o que aconteceria se a Bayer não tivesse feito o estudo?
    Eu diria que, se a Bayer foi quem, por sua alta recreação, decidiu fazer o estudo, então esse estudo pertence-lhe e ela não deve ser forçada a revelá-lo.
    Mas talvez eu não esteja a ver bem a história.

    • Ana Moreno says:

      Olá Luís, os estudos foram produzidos pela Monsanto (antes de ser assimilada pela Bayer) e pela Cheminova; O que está em causa é que a EFSA, que recusou o acesso aos estudos, se fundamenta nesses estudos para emitir o seu parecer, que teve como consequência a aprovação do glifosato na UE por mais 5 anos (a partir da decisão, no final de 2017); Ora se essa é a fundamentação, com tão vastas consequências, tem de ser possível o acesso aos próprios estudos e não apenas aos resultados, como pretende a EFSA.
      De resto, o conluio da UE com esses lobbys já tinha vindo a lume aqui:
      “O relatório encomendado pela União Europeia que avaliou os riscos da utilização de glifosato, um químico suspeito de causar cancro, foi copiado de um documento que a Monsanto e os seus parceiros industriais, produtores da substância, entregaram às autoridades europeias.
      Foi com base no relatório preliminar redigido pelo Bundesinstitut für Risikobewertung (BfR), um instituto alemão de avaliação de riscos, que a Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA) e os peritos dos Estados-Membros concluíram que o glifosato não apresentava riscos cancerígeno e aprovaram a sua utilização na Europa até 2022.”
      https://www.publico.pt/2019/01/15/ciencia/noticia/glifosato-relatorio-encomendado-ue-plagiou-documento-produtora-monsanto-1858036
      Foi escandalosa a forma como o Ministério da Agricultura alemão, em 2017, à revelia do Ministério do Ambiente, votou na UE a favor do prolongamento da autorização, quando, em caso de divergência entre ministérios, teria de se abster. O seu voto a favor foi decisivo para a aprovação.


  3. …”o tribunal deu razão aos eurodeputados, considerando que o público tem direito a conhecer os detalhes da pesquisa e que o interesse público está acima do interesse empresarial.”

    ….será que vão ser coerentes assim ?

    E os processos já acontecidos contra a Monsanto de pessoas
    atingidas seriamente na saúde pelo glifosato, será verdade ou será que é só fogo de vista para nos irem entretendo ?

    ….é já tão difícil e desanimador acreditar !