Repensar as regras da globalização?

Há uns dias, dizia António Costa, em relação à chegada da China de 4 milhões de máscaras de protecção, que não é possível estarmos nesta dependência de uma coisa que é produzida na China, que é transportada pela Ethiopian Airlines para finalmente chegar ao Porto – não passando de uma reserva que dá para uma semana.

Levará esta catástrofe que desabou sobre a humanidade a um tão necessário ajustamento dos princípios e regras que vêm regendo a economia global nas últimas décadas?

Parece muito duvidoso.

O jornal alemão TAZ publicou ontem uma notícia sobre prioridades da Alemanha durante a Presidência do Conselho da União Europeia, que o país irá assumir a partir do dia 1 de Julho. Na política externa e comercial, Berlim pretende não só finalizar o acordo de comércio EU-Mercosul como “retomar um amplo diálogo político de alto nível (…) e desenvolver e implementar uma agenda comercial transatlântica positiva”. Ou seja, repescar o TTIP (acordo EU-EUA), mesmo que numa forma “light”.

Os receios de Berlim em relação às ameaças de tarifas punitivas dos EUA sobre as exportações alemãs de carros têm a maior potência para alavancar a agenda de liberalização abrangente, a favor da indústria de exportação.

As controvérsias sobre o acordo EU-Mercosul são conhecidas; inclusivamente, já em meados de Março o Conselho Federal da Áustria decidiu “assegurar que a Áustria se pronuncie nos órgãos da UE contra a conclusão do acordo comercial com os Estados do Mercosul”. Segundo declarações feitas em Bruxelas, isso significaria que o acordo EU- Mercosul estaria morto, já que, para entrar em vigor, teria de ser ratificado pelos 27 países da UE. A França e a Irlanda também manifestaram grandes reservas quanto a este acordo, acusando os países do Mercosul – sobretudo o Brasil – de violarem o Acordo de Paris e ameaçarem o meio ambiente. A Áustria e a França estão preocupadas com a segurança alimentar e a concorrência com a carne barata produzida nas mega-explorações sul-americanas, com normas menos exigentes.

Estas prioridades do governo alemão, que coincidem com as dos governos da maioria dos países europeus (Portugal é um dos grandes promotores do acordo EU-Mercosul) foram delineadas antes do início da actual crise da Covid-19.

Aposto que não haverá alterações.

Comments

  1. Rosa Ribeiro says:

    E se a UE promovesse uma nova industrialização nos países-membros que permitiria reactivar a economia?

    • POIS! says:

      Pois está para breve!

      Para a semana vai haver uma cimeira entre o Miterrand e o Helmut Khol, mediada por Aníbal Cavaco Silva para se tomarem decisões sobre assunto. Aguarde, portanto.

    • Paulo Marques says:

      E se ignorasse os tratados todos? A diferença não é muita.


  2. Será, Ana Moreno, que se vai ganhar algo de positivo com o lado bom desta calamidade mundial ?
    Que se vão tirar e praticar as devidas lições e alterações prementes e urgentes que serão evidentes sob o olhar atento e supostamente inteligente e honesto e competente dos líderes, políticos e pessoal da UE ? !

    Esta mais uma preocupação que nos consome nesta inédita situação já tão aflita em que nos encontramos !

    Abraço solidário, companheira e amiga !

    • Ana Moreno says:

      Olá amiga Isabela, eu bem gostava de perder a aposta que consta no final do post, mas não acredito. À revelia de toda a evidência, os dogamas neoliberais demonstram-se inabaláveis. Não fora servirem aos mais poderosos.
      Grande abraço e muita força, maior ainda nesta travessia do deserto!

  3. José Dimas says:

    O que custa a entender é que tanta «inteligência» que viu na globalização o paraíso na Terra, não tenha entrevisto os problemas que ela iria criar. Os políticos querem é desenrascar-se enquanto estão no poleiro; e o cidadão comum, bruto que nem uma porta, alambaza-se com o que lhe dão a comer e exulta.

    • abaixoapadralhada says:

      “o cidadão comum, bruto que nem uma porta”

      Bruto não. Tem conta no fakebook do Isaac e a cabecinha pára

  4. Rui Naldinho says:

    Para mim infelizmente nada mudará. Alguém está disposto a retroceder um bom par de décadas. Porventura ao período antes da nossa entrada na CEE?
    Nunca, por nunca!
    Após a descoberta da cura médica para este fenómeno viral, com mais ou menos mossa, a economia seguirá o seu rumo.
    “O automóvel da globalização, da desregulação financeira, dos atentados ao clima, seguirão de novo o seu caminho, até um novo estrondo”.

    Daniel Oliveira caracterizou muito bem esta crise, no que concerne à economia da União Europeia, mas ela poder-se-ia replicar à escala global.
    Diz ele:
    “Os europeístas dos países periféricos parecem aquelas pessoas amarradas a relações tóxicas: sempre a anunciar o risco do fim da relação para depois aceitar que tudo fique na mesma porque a solidão é bem pior. Ou acreditando que o parceiro, desta vez, vai perceber que errou e vai mudar. O euro que temos depende desta relação assimétrica. Não morrerá por ela se revelar de novo assimétrica. Se a Europa falhar agora não vai morrer. Vai viver como vive há 20 anos. E isso é pior do que morrer.”

    • Carlos Almeida says:

      Muito obrigado Rui Naldinho, por nos trazer mais um acertado comentário do Daniel Oliveira

    • Fernando says:

      Há vinte anos, antes do Euro, Portugal tinha uma economia que crescia, não tinha desemprego de 20% (coisa que ultrapassou no pico da crise intencionalmente provocada pelos europeístas) e não exportava centenas de milhar.

      O que o Rui Naldinho fez foi um exercício de propaganda, talvez não intencional…

      Não me leve a mal, mas recomendo-lhe menos emoção no que diz respeito à União Europeia, uma organização que muito mal tem feito a muitos milhões do continente europeu, especialmente os do sul.

      • Carlos Almeida says:

        “Há vinte anos, antes do Euro, Portugal tinha uma economia que crescia, não tinha desemprego de 20% ”

        Frases assim tiradas do contexto, poderiam ser usadas pelos defensores do Estado Novo, que ainda os há, substituindo a palavra vinte por cinquenta e antes do Euro por antes do 25 de Abril de 74

        “Há cinquenta anos, antes do 25 de Abril de 74, Portugal tinha uma economia que crescia, não tinha desemprego de 20% ”

        Só que isso não chega, são apenas frases de panfleto político, que não se referindo ao contexto das épocas analisadas, valem o que valem, isto é muito pouco

        Repare como o JgMenos, aproveitou logo.

        • Fernando says:

          Frases tiradas de contexto uma ova!

          Portugal antes do Euro crescia 3%, não condenava centenas de milhar à emigração, não havia problema de divida descontrolada (que começou depois da entrada para o Euro).

          Os europeístas ficam incomodados ao serem confrontados com a degradação que a inclusão de Portugal na zona Euro trouxe.

          Mas têm mesmo que ser confrontados, até porque a actual situação (o é há pelo menos 10 anos) da União Europeia é manifestamente insustentável.

          E esse comentário do Estado Novo quer dizer o quê?
          Portugal antes do Euro não era uma democracia?

  5. JgMenos says:

    No conforto pobrezinho do meu lar,
    há fartura de carinho.
    e a cortina da janela é o luar,
    mais o sol que bate nela…
    Basta pouco, poucochinho p’ra alegrar
    uma existência singela…
    É só amor, pão e vinho
    e um caldo verde, verdinho
    a fumegar na tigela.

    É uma casa portuguesa com certeza
    É com certeza uma casa portuguesa…

    • POIS! says:

      Pois tá bem!

      Até que enfim que a elevada criatividade literária de JgMenos chega à poesia em verso! Não são só o Espadachim Zarolho e o Cachaceiro da Brasileira (que de cada vez que apanhava uma bebedeira dizia que era outro…) que merecem ser tratados pela populaça como génios!

      Nada melhor que uma canção salazaresca fortemente anti-globalesca para alegrar estes dias de confinamento de JgMenos e de todos os portugueses de Bem.

      A propósito: os meus parabéns pela sua denodada luta em defesa da pureza do caldo verde, conta a invasão de espécies culinárias estranhas como os rebentos de soja, a moamba, a farofa e a tora transformada em torah de borrego (esta obra de sinistros chefes culinários judaicos). Ou, por cá, a adição de tomate e beterraba para o transformar em caldo vermelho como pretendem os dirigentes do Glorioso ( o que está a deixar o Pinto da Costa azul de raiva).

      Ficamos ansiosamente à espera da próxima obra poética. Não tem lá nada sobre o tema “nubentes” e “campas”? Ficava muito bem nestes tempos de pandemia. Pense nisso e, se resolver dar uma festa lá em casa, cuidado com os covidados.

  6. Luís Lavoura says:

    Portanto: a Alemanha quer o acordo com o Mercosul para poder exportar os seus carros para a América Latina; a Áustria não quer o acordo com o Mercosul porque não quer importar carne de vaca barata da América Latina (prefere que os austríacos sejam forçados a comer carne de vaca cara criada nos Alpes).

    No fundo, no fundo, cada país está somente a defender os seus interesses meramente comerciais. Nada mais que isso.

    Não entendo por que motivo a Ana Moreno prefere os interesses comerciais da Áustria aos interesses comerciais da Alemanha.

    • abaixoapadralhada says:

      A Austria é um apêndice da Alemanha

    • POIS! says:

      Pois, mas parece que não é assim!

      O que os austríacos pretendem é proteger a valsa, que têm medo que seja fortemente atacada pelo Tango e até pelo Samba. Os argentinos já produziram um tango intitulado “O Paraná Azul às Riscas” e os brasileiros responderam com o samba “Azul é o Amazonas e Nada Mais” que vai a concurso para o ano no desfile da Escola de Samba “Wursts Vienenses”.

      Os austriacos estão desesperados! Nos salões já se dança a valsa em saias de racha e “top less”, mas não sei se aguentam a concorrência.

      • abaixoapadralhada says:

        Será que os “corvos” não têm que estar em confinamento.Aproveitam para vir o seu produto nas ruas de Oeiras.

        https://www.cm-tv.pt/atualidade/detalhe/padre-celebra-missa-em-carro-descapotavel-pelas-ruas-de-oeiras-veja-as-imagens?ref=HP_MaisVistos

        Será que têm licença de feirante

        • POIS! says:

          Pois, e a desenvolver-se esta nova modalidade de missa, há que colocar algumas interrogações a quem de direito! (Talvez já amanhã, na conferência de imprensa da DGS).

          Questão nº 1:O regime do “take-away” também se aplica às hóstias?

          Questão 2: Se uma hóstia voar há o risco de ficar contaminada?

          Questão nº 3: Há alguma exceção á proibição das atividades de cabeleireiro se for destinada a padres e santas? (O penteado da Santa estava impecável! Quem o terá feito?).

          Questão nº 4: o condutor do automóvel pode ajoelhar-se?

          Questão nº 5: A viajar assim a Santa não corre sérios riscos de apanhar uma pneumonia?

          Questão nº 6: O cortejo não deveria ser escoltado pelas autoridades por razões de segurança (consta que Satanás foi visto nas imediações a acelerar de Porsche)?

          Ficamos ansiosamente à espera de tão importantes e decisivas respostas. É o combate à pandemia que está em causa.

    • Ana Moreno says:

      Ah, Luís Lavoura, ando há anos a escrever posts sobre problemas da actual globalização… o que eu prefiro é que as externalidades sejam devidamente contabilizadas para os preços serem reais, o que eu prefiro é que o princípio da precaução seja respeitado, o que eu prefiro é que as normas europeias sejam respeitadas também naqueles produtos que importamos, o que eu prefiro é que o Amazonas não seja destruído para produzir carne ainda mais barata, o que eu prefiro é que o ISDS não seja incluído nesses acordos, o que eu prefiro é que não sejam criadas comissões regulatórias com participação dos grandes lobbys e que vão influenciar leis europeias e nacionais ainda antes de chegarem aos parlamentos, etc.
      O que eu não percebo é essa sua frase final, mas pelos vistos falamos línguas diferentes.

      • Luís Lavoura says:

        Eu acho muito bem que a Ana prefira isso tudo, mas então não fale da posição da Áustria, porque essa posição nada tem a ver com a da Ana.
        Se a Áustria é contra o acordo com o Mercosul, isso deve-se aos interesses comerciais da Áustria, que nada têm a ver com os interesses da Ana. Pelo que, a Ana faria melhor em não referir essa posição da Áustria.

        • Ana Moreno says:

          ” mas então não fale da posição da Áustria, porque essa posição nada tem a ver com a da Ana.”; essa posição tem tudo a ver com a da Ana, porque o que interessa à Ana, é que o acordo UE-Mercosul não avance nos actuais moldes, o que seria viabilizado caso a Áustria não ratificasse o Mercosul, pois, conforme consta no post, “isso significaria que o acordo EU- Mercosul estaria morto, já que, para entrar em vigor, teria de ser ratificado pelos 27 países da UE. – à semalhança do que aconteceu em relação ao CETA quando a Valónia se recusou a dar o sim durante uns dias, paralizando o acordo. Até que as imensas pressões acabaram por fazê-la ceder, tendo ao menos conseguido algumas concessões – embora não significativas porque juridicamente os termos do acordo se lhe sobrepõem.
          Sendo a política comercial da competência da UE, tudo o que se passa nos outros países-membros nos interessa. E onde países-membros se posicionam, por exemplo, em favor de uma agricultara menos intensiva, contra OGMs, contra pesticidas ou hormanas na carne, isso interessa-me sobremaneira – tanto mais que é uma brutal incoerência e injustiça andar a exigir aos agricultores europeus a redução do uso de pesticidadas (como acaba de acontecer na Alemanha) e depois importar produtos “baratos” que estão infestados.

        • anticarneiros says:

          E “Nacionalista” é o outro !

          Ha por aí muitos escondidos

    • Paulo Marques says:

      O proteccionismo é para quem pode, não para quem quer. Ou o meu proteccionismo é melhor que o teu.
      (Mas como a autora respondeu, é outra questão)