Francisco Louçã: O 25 de Abril é uma nostalgia?

(Artigo de Opinião de Francisco Louçã, Conselheiro de Estado e Fundador do Bloco de Esquerda)

A forma mais simples de domesticar uma memória é retirar-lhe o presente e o futuro. É o que acontece com o 25 de Abril, quando é comemorado ritualmente como se fosse uma simples transição armada de cravos e a caminho da Europa, um destino mítico enfim reencontrado, uma espécie de Quinto Império renascido nos mercados. Ora, Portugal tem esta história atravessada: só a revolução instituiu a liberdade, deixando marcas na experiência coletiva, nas leis, nas relações de forças e até na esperança de um povo que se reconheceu nesse fulgor. “O melhor tempo da nossa vida”, dizia o José Afonso. Outro virá, sempre com a mesma entoação, liberdade.

Mesmo quando a pandemia instala o medo entre nós e nos aponta o próximo como o risco, nos diz que um beijo ou um abraço são a porta da doença, que o nosso corpo é o culpado, esta velha centelha de liberdade, que é responsabilidade pelos outros, abre as portas do presente à vida coletiva, não desiste de reconhecer o instinto da sociabilidade, a alegria da comunicação e a verdade das emoções. Assim será.

 

(foto retirada do site da Wook)

Cristina Rodrigues: Com sabor a Abril e cheiro a Cravos

(Por Cristina Rodrigues, Deputada à Assembleia da República)

Não vivi as inúmeras limitações impostas aos cidadãos – e sobretudo às mulheres – durante as décadas do Estado Novo. Não vivi o 25 de Abril de 1974, nem o Verão Quente de 1975. Os momentos atribulados do PREC – Processo Revolucionário em Curso conheço-os do que leio e oiço falar. Mas sei bem o que é viver ao abrigo das liberdades que foram conquistadas graças à Revolução dos Cravos e, nos últimos tempos, sei também o que é ter um vislumbre de as perder, devido à crise pandémica que vivemos.

Foi há pouco mais de um ano – no dia 18 de Março – decretado o primeiro Estado de Emergência e no momento em que escrevo estas linhas vivemos o 15.º. Cada um dos decretos que os regulamentam têm vindo a apresentar diferentes graus de limitações às nossas liberdades mais básicas, limitações que vamos entendendo como necessárias mas, não podemos esquecer, passíveis de dar origem a episódios alarmantes.

Por outro lado, e reconhecendo o desafio que constitui a gestão de uma crise sanitária com a garantia (possível) dos direitos e liberdades dos cidadãos de um país democrático, importa considerar fragilidades que, pré-existentes à Covid-19, se agravaram, nomeadamente a situação das mulheres e das raparigas e as questões ligadas à igualdade de género. E sem uma verdadeira igualdade podemos falar legitimamente em direitos e liberdade?

É factual que, nós, mulheres, temos sido o alvo de discriminação e que os homens têm usado a sua força ou poder com vista a dominar e constranger e, em pleno século XXI, a desigualdade de géneros continua a ser uma realidade no nosso país.

Basta conhecer o número de vítimas de femicídio e violência doméstica – sendo que durante o confinamento muitas vítimas o foram pela primeira vez. A instabilidade provocada pela Covid-19 tem tido particular impacto nas mulheres que, por medo de expor os filhos ao vírus, medo do desemprego, ou da crise económica, ficam especialmente vulneráveis perante cenários de violência doméstica.

Vejam-se também as significativas assimetrias salariais entre mulheres e homens que ocupam os mesmos cargos e executam as mesmas funções. E falando em cenário laboral, somos nós quem mais sofre assédio sexual. Também na grande generalidade dos lares, continua a existir uma divisão das próprias tarefas em casa e dos cuidados com a família que peca por continuar a sobrecarregar as mulheres.

Uma nota de esperança, contudo, surge no Gender Equality Index 2019, que classifica o nosso país como o que maior progressão conheceu em matéria de igualdade de género na União Europeia. Ora esta conquista, com um sabor a Abril e cheiro a Cravos, não admite retrocessos, nem mesmo devido à pandemia. 

 

(fotografia do jornal Rostos)

 

O Aventar vem de longe

[Paulo Guinote, O Meu Quintal]

O Aventar faz doze anos, o que em idade de blogues é certamente uma idade de respeito. O Aventar é dos tempos em que os blogues serviam para  comunicar algo de diferente, informar mais, esclarecer o que se sentia que não tinha lugar nos meios de comunicação tradicionais e não apenas para vender fraldas, cosméticos ou cera para a ponta dos bigodes. É do tempo – e assim se mantém – em que não se entrava numa página tão carregada de publicidade que dá vontade logo de sair, tamanha a dor nos olhos e na alma.

Apesar do aspecto que não hesito em classificar como “clássico” (partilho o gosto por aquele fundo branco), soube adaptar-se aos tempos, espalhando-se pelas redes sociais e até tendo agora – o tempora, o mores! – um podcast de sucesso. Ao contrário de umas teses peregrinas que por aí andam, o Aventar está muito vivo e recomenda-se. Ao contrário de outros blogues que se limitam a sobreviver para dar visibilidade a uns quantos aspirantes a assessores de grupos parlamentares ou governantes, o Aventar existe porque faz sentido em si mesmo. [Read more…]

Obrigado! Obrigado! Obrigado!

Sim, estamos entre o estado de euforia e o de espanto. E graças a todos vocês! Sim, são vocês, os nossos leitores e ouvintes os responsáveis por semelhante feito. O Aventar está a poucos dias de celebrar mais um aniversário, o 12º ano consecutivo sempre online. Nos períodos áureos da blogosfera fomos crescendo em leitores diários. Fomos marcando presença nas redes sociais (Twitter e Facebook) onde fomos amealhando audiência mas sempre com a escrita no blogue como único meio de comunicação convosco. Fomos subindo nas audiências e a partir de certa altura fomos liderando nos chamados blogues de Política (sendo o Aventar bem mais do que isso). Depois a blogosfera foi definhando mas nós seguimos o nosso caminho, um caminho das pedras por onde fomos caminhando graças a vocês. Aliás, internamente, sempre foi dito que enquanto tivermos leitores, vamos continuar. Persistir. Resistir. E vocês foram o nosso oxigénio. Nos últimos meses os leitores foram crescendo. E o Aventar respondeu com a chegada de novos aventadores, de uma nova geração (não digam a ninguém mas temos aqui na casa, de entre os mais recentes, aventadores com vinte e poucos anos de idade). Até que, em Fevereiro após muita discussão ficou tomada a decisão: avançar com o PodAventar, o podcast do Aventar que serve de complemento ao blogue.

O PodAventar não é um podcast, é o podcast do blogue. Porque o Aventar será sempre um blogue e o PodAventar será apenas mais uma plataforma do blogue, tal como o WordPress é apenas a plataforma da nossa escrita. O Aventar, como os nosso leitores sabem, é um blog colectivo e as decisões são tomadas em grupo. Demoram. São meditadas. Por isso o podcast não nasceu de um dia para o outro. Nem é uma coisa profissional: é gravado via zoom mas só aproveitando o áudio (ainda estamos na fase de ter algum pudor) e gravado onde calha, na varanda de casa, no escritório, na esplanada do café ou em locais ainda mais esconsos. E, de repente, como quem não quer a coisa e estando o blogue apenas alojado na plataforma do blog (WordPress) verificamos que eram muitos, mesmo muitos os que nos ouviam. Até perguntarem no nosso fórum interno: “Será que alguém nos ouve?”. Ao que o WordPress respondeu assim: Só ontem foram 2.514 almas. E as audiências continuaram a subir. E o nosso cepticismo com os números da WordPress também. Até hoje.

Quando hoje recebemos os dados da Apple (só estamos na Apple desde o início desta semana) ficamos sem palavras. E por isso queremos partilhar convosco. São vocês, como atrás se escreveu, o oxigénio que permitiu manter o blogue vivo mesmo quando alguns repetem aos fiéis que a blogosfera morreu. Até escrevem uns livritos sobre isso. Só que existem por aí uns teimosos a contradizer, com factos. Um deles dá pelo nome de Aventar e se as audiências do blogue estavam a subir, agora com o PodAventar triplicaram. Pelos vistos, só somos batidos (na categoria daily news e na Apple) pelos pesos pesados internacionais. Quem são estes gajos do New York Times? Ou aqueles ali do The Economist ou da CNN? Estamos em sétimo lugar, logo acima do segundo português na lista, a Antena 1 – Notícias. Ou seja, estamos em boa companhia. Como sempre. Na sua companhia.

Por isso, OBRIGADO! Muito Obrigado a si. E sigam as gravações que isto ainda agora começou.