Os portugueses estão a tomar banho acima das suas possibilidades

Detesto ser portador de más notícias, mas devo informar-vos que estamos a tomar banho acima das nossas possibilidades.

Significa isto que está na hora de começarmos a tomar banho dia sim, dia não, até porque o mercado livre precisa de água para os abacates. E sem abacates, como sabeis, a democracia está comprometida e este país não tem futuro.

Portanto, deixai-vos de pieguices e aprendei a viver com o aroma do sovaco do vosso semelhante. Ou então emigrai, mas emigrai para Ocidente, que para Leste o fedor só piora.

Putin e o mercado livre

O documentário que passou ontem na CNN, Putin: o Caminho da Guerra, não é apenas claro sobre a natureza totalitária e monstruosa de Vladimir Putin. É todo um tratado sobre a hipocrisia do Ocidente, que sempre soube quem ela era e quais eram os seus métodos, mas preferiu assobiar para o lado.

E porquê?

Para evitar a fuga dos rublos e, sobretudo, para garantir que a economia russa se mantinha perfeitamente integrada nessa ilusão predatória a que chamam “mercado livre”. Porque os interesses das grandes multinacionais europeias e americanas não poderiam ser afectados por temas menores, como os direitos humanos. [Read more…]

Propagar, enforcar, ressuscitar

A contradição do costume voltou em força: em Democracia todos os fascistas votam. E, se nem todos os que votam em neo-fascistas (dos Fratelli ao Lega, em Itália, do CHEGA, em Portugal, ao Vox, em Espanha, do Fidesz, na Hungria, ao PiS, na Polónia, passando pelo SD, na Suécia) são neo-fascistas, a verdade é que a “moderna” extrema-direita europeia se soube re-inventar e aproveitar os fracassos dos partidos democráticos, sobretudo de esquerda, catapultando-se para o poder.

O aproveitamento populista de certos temas, o cultivo do ódio e do ressentimento pelos próximos e por quem é pobre e/ou diferente, a cultura do “contra tudo-contra todos” não são factores novos nem foram inventados pelos que, agora, se chamam “iliberais”; ao invés, são fotocópias ajustadas aos tempos de hoje, daquilo que foi a estratégia dos – outrora – fascistas dos anos 20 em diante para tomar o poder. E é sabido que quando a coisa aperta, o fascismo aperta também. O povo vai atrás, porque se revê na ideia do “Salvador”, na imagem do deus supremo que tudo resolverá e, também, porque os partidos democráticos lhes falharam e continuam a falhar.

Dizia Pepe Mujica, antigo presidente do Uruguai, que o Ser Humano é provável que seja o único animal que é capaz de tropeçar vinte vezes na mesma pedra sem aprender a desviar-se dela. A onda fascista que ameaça, de novo, a Europa é prova dessa mesma incapacidade de nos tornarmos sagazes.

A Itália propagou o fascismo, enforcou-o e agora ressuscita-o. As melhoras, Itália.

Ah, só mais uma coisa: hoje, Vladimir Putin também ganhou.

Giorgia Meloni. Fotografia: Getty

Valores europeus

A União Europeia, depois de décadas a apertar a mão a Vladimir Putin porque lhe servia os interesses, decidiu agora apertar a mão a um Putin de marca branca e com bigode.

O que nos vale é que este Putin está do lado do Ocidente e só invade países irrelevantes como a Arménia.

Os tão aclamados “valores europeus” de alguns, são a machadada na soberania de outros.

Fotografia: AFP

União Europeia?

Orbán fala sobre “raças puras” e não quer que húngaros pertençam a uma raça mestiça.

Grato aos russos, aos ucranianos e a todos os soviéticos

Neste Dia da Europa, 9 de Maio, lembro sempre, gratamente, quem deu a vida para nos livrar do nazismo de Hitler, em particular os mais 22 milhões de soviéticos que pereceram, entre os quais os ucranianos. Se hoje vivemos sem o terror nacional-socialista em toda a Europa, não é aos europeus que o devemos, mas sim a quem nos veio resgatar: os soviéticos, em primeiro lugar, e os norte-americanos que, após Pearl Harbor, em boa hora decidiram tomar como deles as nossas dores.

Desde então a Europa tem sido o reflexo do poder dos vitoriosos, divididos entre pró-americanos e pró-russos, sem rumo certo, aos tropeções dos ventos políticos que foram soprando de ambos os lados, embora do lado do regime por nós fundado e erguido – a Democracia.
A Europa feneceu após a era colonial “gloriosa”, de seiscentos até ao dealbar do sec. XX, enquanto os novos imperialismos medraram, mas [Read more…]

A China e as matérias primas

É verdade que as fábricas estiveram paradas por causa da pandemia de Covid-19. É verdade que a guerra na Ucrânia está a trazer problemas nos fluxos comerciais e o acesso a determinadas matérias-primas. Tudo isto é verdade. O problema é que existe um outro motivo, um pormenor segundo alguns. Um “pormaior“, segundo outros. Chamado China.

E qual é o problema chamado China? Já em Julho do ano passado as sirenes tocavam: a China estava a comprar matérias-primas em vários sectores em quantidades astronómicas e nada comuns. Estavam a ser criadas as condições para uma tempestade perfeita, diziam em Julho os especialistas. E em Novembro de 2020, já se falava sobre esta política chinesa: “En las últimas semanas hemos visto como el Gobierno Chino ha empezado a estar muy activo en los mercados de carne y granos. Los contratos de futuros de Soja, Aceites y los futuros de Cerdos se han vuelto muy agresivos“. Ora, a escassez de matérias primas a que estamos a assistir é um problema anterior à invasão da Ucrânia e fruto da política seguida pela China. Obviamente, a guerra só está a piorar uma situação que já era grave.

Por sua vez, Pedro Guerreiro já o tinha sublinhado no Observador em Fevereiro deste ano:

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Como chegamos até aqui

A Abecásia e a Ossétia do Sul foram ocupadas pela Federação Russa em 2008. A península da Crimeia em 2014. Desde então, nunca foi segredo para ninguém que os separatistas do Donbass eram apoiados financeira e militarmente pelo Kremlin, que garantiu a subsistência dessa agressão à soberania ucraniana, no plano militar e financeiro, ao longo de oito anos.

Paralelamente, a oligarquia russa continuava a expansão dos tentáculos de Moscovo pelo continente europeu, de Bruxelas às sedes das principais organizações internacionais, sob tutela directa de Vladimir Putin, movimentando milhões de rublos e negociando diariamente nas principais praças financeiras do Ocidente, de Frankfurt a Wall Street, com escala em Amsterdão, Zurique e na City de Londres, ou Londongrado, alcunha que nos diz tudo o que precisamos de saber sobre a colonização levada a cabo pelo Kremlin.

Quando não estavam a transformar o produto do saque ao povo russo em dividendos e propriedades de impensável luxo, a corte de oligarcas russos ocupava os tempos livres em actividades como a compra e gestão de alguns dos principais clubes de futebol da Europa, fazia férias em Puerto Banús, no Mónaco e na Costa Esmeralda, licitava obras de arte na Christie’s, comprava diamantes em Antuérpia e fazia shopping em Paris e Milão, o que ajuda a explicar o lobby que grandes estadistas como Mario Draghi tentaram inicialmente fazer, para que as insígnias italianas e francesas de luxo, bem como a indústria belga de pedras preciosas, fossem poupadas à lista de sanções. Acabar com a guerra sim senhor, mas deixem o lifestyle dos senhores oligarcas em paz.

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Pequeno resumo da repetição das eleições no círculo da Europa

O PS tem mais do dobro dos votos do PSD.

  • O PS tem mais do dobro dos votos do PSD e fica com os dois deputados;
  • O PSD está mais próximo do CH que do PS e perde o deputado que tinha.
  • O CH, que não gosta de emigrantes é o que mais cresce entre os emigrantes;
  • O BE regista um desastre em linha com o desastre a nível nacional;
  • PAN completa o pódio dos desastres
  • IL ganha mais ou menos os mesmo que o PCP perde, revelando uma notória transição do comunismo para o neoliberalismo;
  • O Livre cresce poucochinho;
  • O CDS ficou fora do ecrã, o que diz tudo o que precisamos de saber sobre o resultado;
  • O MRPP tem 522 votos! São 522 emigrantes prontos para matar os traidores. Nem o CH tem tantos.

Vasco Pulido Valente, Mário Soares, Putin e os ensinamentos da História

Parte I

aqui escreveu o João Mendes sobre um antigo artigo de Vasco Pulido Valente e penso que foi o João Maio (não encontro) que escreveu sobre um outro antigo artigo, desta feita de Mário Soares. Em comum: uma previsão antecipada do que hoje está a acontecer. Mas existe outra coisa, mais importante, em comum. Cada um à sua medida sabiam da importância da História na explicação do presente e na previsão do que pode ser o futuro.

O desconhecimento da História explica muito do que está a acontecer. E essa ignorância, de boa parte da classe política europeia, é a causa de termos chegado aqui. Só uma absurda ignorância pode explicar a dependência de parte importante da Europa, com a Alemanha à cabeça, de energia fornecida pela Rússia. A ganância não justifica. Aliás, a ganância é, por si só, uma materialização dessa grave ignorância. A mesma falha de formação que levou a Europa a deixar morrer a sua indústria, a não apostar em ser, o mais possível, auto suficiente. A pequenez intelectual da nossa classe política é um reflexo do nosso desinteresse e da forma como, cada vez mais, preferimos políticos assépticos – aliás, sobre esta particularidade, aconselho este ARTIGO de 2004, escrito por Graça Franco no Público.

A mesma ignorância histórica leva muitos dos nossos mais jovens a não compreender o que está em causa. Quando muitos responsáveis políticos falam, e com razão, da “geração mais qualificada de sempre” esquecem que essa “qualificação” demasiadas vezes também é fruto de algum facilitismo. Que começou na minha geração, os que chegaram ao secundário e ao ensino universitário nos inícios dos anos 90 do século passado. Foi uma opção dos países ocidentais (com honrosas excepções). Um dos pilares do conhecimento, a História, passou a uma espécie de parente pobre do sistema. Eu sei que não foi o único. Aqui chegados, um ponto de ordem: estou a falar da maioria, como é obvio. Não vale a pena começarem já a preparar as espadas para a caixa de comentários…

Ora, uma sociedade menos preparada acaba por ter como consequência natural uma menor qualidade dos seus dirigentes políticos. Mesmo sabendo que Vasco Pulido Valente era genial, o facto de ter escrito, em 2015, isto: “A Crimeia foi o primeiro objetivo; e o segundo foi parte da bacia de Donetsk, porque a Crimeia não serve de nada sem uma ligação fácil e segura ao coração do Império, Não existe ponta de dúvida que Putim não recuará”, não faz dele um adivinho ou uma espécie de Zandinga. Não. Apenas se limitou a aplicar os seus vastos conhecimentos da História a uma realidade que estava a começar. Melhor dito, a recomeçar.

Porque a História, infelizmente, repete-se. Quando muito mudam os protagonistas. A repetição é causada pela ignorância. Sobretudo daqueles que tinham a obrigação de não serem ignorantes. A mesma ignorância daqueles que, não satisfeitos com os erros cometidos com a Rússia, continuam a cometer e de forma mais grave, um erro gigantesco na forma como nos estão a condenar a ficar na mão e sob a bota da China. Por ganância? Certamente. Por ignorância? Absolutamente.

Olaf Scholz e a opinião pública alemã

Foto: Michael Kappeler / dpa

The chancellor of Germany said that a military solution to the war in Ukraine “makes no sense” and urged for a diplomatic solution. I urge @OlafScholz to come to Mariupol and try his “diplomatic solutions” to stop Russian shelling.

O Chanceler alemão, Olaf Scholz (SPD) pode estar a ser o primeiro líder europeu a recuar por motivos económicos. Já sei que muitos dirão que se estava mesmo a ver e a célebre frase “É a Economia, estúpido” será a primeira a surgir. Só que o problema de Olaf é outro.

Obviamente, o preço do barril do petróleo, do gás ou dos cereais está a gerar pânico em muitas das grandes empresas alemãs e imagino a pressão que devem estar a exercer sobre o governo alemão. O problema do chanceler é outro. A sociedade alemã. Ou seja, os eleitores. No último estudo de opinião conhecido (Instituto FSB), 49% dos alemães eram favoráveis ao envio de tropas da NATO para a Ucrânia – e este estudo foi publicado na última semana de Janeiro, ainda antes da invasão e existe a noção que esta percentagem hoje é maior. Além disso, em Berlim, realizou-se uma das manifestações mais participadas na Europa a favor da Ucrânia. Ou seja, a opinião pública alemã está de um lado e os grandes interesses económicos alemães estão do outro.

Falta saber de que lado da barricada se vai posicionar Olaf Scholz. Sobretudo quando já se percebeu o lado que os Liberais e os Verdes, seus parceiros de coligação, escolheram. A opção que o Chanceler alemão tomar vai ser um importante indicador para o que podem vir a fazer os restantes líderes europeus. Esta pode mesmo ser a primeira grande batalha entre a opinião pública europeia e os seus lideres, depois de  boa parte dos especialistas terem afirmado que até agora foram os primeiros a impor aos segundos o caminho a seguir.

O Império (do mal?) contra-ataca

O meu camarada aventador, Fernando Moreira de Sá, escreveu aqui um texto interessante, sobre o qual me apraz deixar aqui sete notas, tipo sete pecados mortais. Aqui vão eles:

1) A discussão extremada que o Fernando refere é real, dura há anos, para não dizer décadas, e continuará bem viva, enquanto a dualidade de critérios imperar. Arrisco dizer para sempre. No caso presente, é interessante notar que há quem fique muito ofendido quando outro alguém ousa trazer para a discussão sobre a presente invasão os antecedentes que dela são indissociáveis, como se isso implicasse, necessariamente, legitimar a invasão ou defender Putin. Até porque, de uma maneira geral, as pessoas que recusam ouvir falar desses antecedentes, alguns dos quais bem presentes, são as mesmas que estão constantemente a falar – e bem – na barbárie estalinista, tendo Estaline morrido há mais de 60 anos.


2) Sobre a ideia do Império do Mal, importa referir que o Ocidente não é um império uno e indivisível. Os criminosos ocidentais estão bem identificados e não é a pertença à NATO que os define. É, por exemplo, invadir um país sem consultar todos os seus parceiros, e com base num pressuposto fabricado, como os EUA fizeram com a segunda invasão do Iraque. É, também, orquestrar um golpe de Estado contra um governo democraticamente eleito, pelo motivo de esse governo não ser favorável aos interesses de Washington. É, igualmente, nunca ter respeitado o plano de partilha da Palestina, aprovado por uma larga maioria dos membros de então da ONU, e continuar a construir colonatos ilegais na Cisjordânia, impondo uma verdadeira ditadura ao povo palestiniano. Dito isto, ninguém considera uma Noruega, uma Islândia ou Portugal como fazendo parte de um qualquer Império do Mal. Portanto não é de Ocidente que falamos, mas de agressores patológicos, como os EUA e Israel, que sim, devem ser criticados e moralmente condenados pelas suas acções, que alguns teimam em desculpar.

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O perigoso trilho da personificação do mal

É indubitável que Vladimir Putin é um déspota, sem escrúpulos. E a questão essencial não é se há outros ou não. Até porque sabemos que há.

A questão essencial é se só agora ele se revelou como tal.

Obviamente que não. E, no entanto, todo o chamado “Mundo Ocidental”, do qual fazemos parte, hoje chocado e revoltado com a sua ofensiva bélica sobre a Ucrânia, num conflito armado que dizima vidas inocentes, não se inibiu de fazer negócios, de engrossar fortunas, e até, ficar na sua dependência.

Já se sabia quem era Vladimir Putin quando a Europa – leia-se França e Alemanha -, aceitou ficar em grande parte dependente do gás russo. Ou quando Portugal foi à Rússia vender vistos gold. Ou quando a OTAN começou a expandir-se para o outrora Bloco de Leste, rumo à fronteira com a Rússia, em violação do compromisso por si assumido de não fazer tal.

Tudo isto foi acontecendo enquanto jornalistas, activistas e opositores a Putin, eram assassinados; enquanto os envenenamentos se tornavam uma espécie de instrumento de política internacional russa, etc.

Da mesma forma que o “Mundo Ocidental” sabe bem quem é e que é Xi Jiping e a China. E se a China resolver invadir a Ilha Formosa, ou Taiwan, ou que se lhe quiser chamar, o mesmo “Mundo Ocidental” que deslocou para a China a sua indústria, e que se tornou dependente dos seus fornecimentos de bens e capitais, vai bradar “Sacanas dos chineses! Maldito Xi Jiping!”. [Read more…]

Números do êxodo ucraniano

Ontem estávamos assim. Hoje, seguramente, já terão saído muitos milhares mais. As perspectivas são pessimistas e deixam antever que a fuga em massa continue a aumentar e a colocar uma pressão adicional sobre os Estados limítrofes e sobre a Europa em geral. Este desafio junta-se a todos os outros e transforma-se, ele próprio, numa frente de batalha. Putin conta com ela. Nada foi deixado ao acaso.

O Putin é mau, mas o gás dele é muito jeitoso

Não tinham passado 24 desde o reconhecimento da independência das repúblicas-fantoche de Lugansk e Donetsk. E, daí a outras 24, o exército de Putin atravessaria a fronteira da Ucrânia, dando início a invasão para a qual os membros da NATO estavam a alertar há vários dias. Tal não os impediu de comprar centenas de milhões de euros em gás, petróleo e outras commodities russos. Presumo que terá presidido à decisão o mesmo espírito que procurou excluir marcas de luxo do primeiro pacote de sanções. Ou abrir as comportas dos espaços aéreos, convictamente fechados à malvada Rússia, para que os pobres oligarcas pudessem entrar no seu playground. Ou, em geral, a mesma convicção democrática que nos leva a ter os chineses como principal parceiro de negócio. Os campos de concentração, perdão, de reeducação para Uigures não se vão pagar sozinhos, não é?

Ucrânia – Winter on Fire :: Crónicas do Rochedo 52

Para perceber o que se passa hoje na Ucrânia é importante, entre outras coisas, ver o documentário da Netflix sobre a Ucrânia e o seu desejo de pertencer à União Europeia. Chama-se “Winter on Fire”.

E pensar que, uma vez mais, não contam com a União Europeia. Que ficam sozinhos na luta contra a Rússia graças à nossa cobardia. Uma vergonha sem nome.

Deus perdoe a Rio….

 

150 mil votos de portugueses a viver na Europa foram para o lixo. Qualquer coisa como os votos de um concelho inteiro da Área Metropolitana do Porto ou de Lisboa. Foram só 80% dos votos. Só! Porquê?

A imprensa conta a coisa com detalhe. Primeiro o PSD aceitou que fossem validados os votos sem cópia do cartão do cidadão e depois voltou atrás com a sua decisão. O representante do PSD nesta brincadeira chama-se António Maló de Abreu, vice-presidente do partido. Certamente, confundiu as eleições para a sua concelhia com eleições legislativas. Que o senhor deputado esteja habituado a batotas nas eleições internas do seu partido, estou como o outro, quero lá saber. Agora que adopte o mesmo tipo de pensamento para umas eleições sérias e a sério, isso já é outra conversa. É que isto foi uma cuspida na cara aos portugueses que, vivendo fora do seu país de origem, entenderam exercer o seu DIREITO de voto. Um direito que foi conspurcado e violado pelo senhor Maló. No alto da sua arrogância e na sua pequenez mentalidade este vice-presidente do PSD desrespeitou os seus eleitores e a história do seu partido. Num partido decente e com liderança o senhor Maló já tinha ido borda fora. Num país a sério os senhores Maló não teriam este tipo de poder. 

Ora, António Costa, ainda tentou que Rio demovesse a figura. Não foi fácil. Até que o “sabidola” do Costa jogou a cartada essencial para convencer o contabilista que ainda lidera o PSD: anular 80% dos votos era um rombo considerável nas contas da subvenção dos partidos. Foi tiro e queda para Rio se mexer da cadeira. Mas foi tarde. Isto realmente não se inventa.

Em toda esta história fica uma conclusão: a liderança de Rio no PSD é absolutamente tóxica. Deus lhe perdoe. Eu não.

Super-Euros

Imagem retirada de Marca.com

Para quem tanto gosta do mercado livre, da mão invisível, do capitalismo como um todo, da ganância e do crescimento económico, esta ideia de “Super-liga Europeia” deve deixá-lo nos píncaros da felicidade.

Não me venham com “o futebol é do povo”; não, não é. Há muito deixou de o ser. Quando o que interessa no desporto são os financiadores, os patrocinadores, os empresários e os políticos, fica tudo dito sobre a “classe” a que hoje pertence o futebol.

Habituem-se, se já não estavam habituados: o futebol é de quem mais dólares tem na conta bancária, dos milionários das Gazproms e dos oligarcas espalhados por esse mundo fora. O futebol não é um desporto, há muito deixou de o ser; é uma plataforma de troca e venda de pessoas a custos irreais e um negócio rentável para quem mais tem. Enquanto isso, a pobreza grassa, a pandemia acentua a tendência e os mais ricos… bem, os mais ricos mais ricos ficam.

Dito isto, aproveitem bem os benefícios deste bom capitalismo.

Francisco Louçã: O 25 de Abril é uma nostalgia?

(Artigo de Opinião de Francisco Louçã, Conselheiro de Estado e Fundador do Bloco de Esquerda)

A forma mais simples de domesticar uma memória é retirar-lhe o presente e o futuro. É o que acontece com o 25 de Abril, quando é comemorado ritualmente como se fosse uma simples transição armada de cravos e a caminho da Europa, um destino mítico enfim reencontrado, uma espécie de Quinto Império renascido nos mercados. Ora, Portugal tem esta história atravessada: só a revolução instituiu a liberdade, deixando marcas na experiência coletiva, nas leis, nas relações de forças e até na esperança de um povo que se reconheceu nesse fulgor. “O melhor tempo da nossa vida”, dizia o José Afonso. Outro virá, sempre com a mesma entoação, liberdade.

Mesmo quando a pandemia instala o medo entre nós e nos aponta o próximo como o risco, nos diz que um beijo ou um abraço são a porta da doença, que o nosso corpo é o culpado, esta velha centelha de liberdade, que é responsabilidade pelos outros, abre as portas do presente à vida coletiva, não desiste de reconhecer o instinto da sociabilidade, a alegria da comunicação e a verdade das emoções. Assim será.

 

(foto retirada do site da Wook)

AstraZeneca – E uma vacina para esta loucura?

“Muitos milhares de pessoas desenvolvem coágulos sanguíneos anualmente na União Europeia por diferentes razões. O número total de episódios tromboembólicos em toda a população vacinada não parece ser mais elevado do que na população em geral”, acrescenta o comunicado. Até ao momento, “os benefícios da imunização com a vacina da AstraZeneca contra a covid-19, que tem riscos associados de hospitalização e morte, continuam a ultrapassar os riscos de efeitos secundários”, conclui a EMA -Agência Europeia do Medicamento.

 

Era o Vasco Pulido Valente que escrevia “O Mundo está a ficar perigoso” em inúmeros dos seus artigos de opinião. Imaginem o que diria hoje perante a novela da vacina da AstraZeneca.

Os jornais ingleses dizem que a UE está doida. A UE diz que a AstraZeneca está doida. Nós é que estamos a ficar doidos. Xalupas. Lélé da cuca. Nem meia dúzia de dias passaram sobre a esperança de uma abertura “quase plena” da economia no curto/medio prazo fruto das boas expectativas com as vacinas e os processos de vacinação. Nas notícias podíamos ler coisas como: “reservas de férias de verão do mercado alemão e britânico para Portugal, Espanha e Grécia sobem 600% com a perspectiva de vacinação em massa”. E nem dois dias passaram das notícias de aviões cheios de alemães rumo a Maiorca para a semana santa. E de repente…

De repente começam vários países europeus a suspender a vacina da AstraZeneca. Um a um. Só ontem: Portugal, Alemanha, França, Espanha, Países Baixos e Chipre. E porquê? Segundo o Público, “suspeita por estar relacionada com casos de formação de vários tipos de coágulos sanguíneos, com alguns casos de morte”. Quantos casos no todo? 30 em 5 milhões. Está montado o circo. E que circo. Numa altura em que Portugal se preparava para vacinar professores e assim abrir as escolas. Em que inúmeras companhias aéreas começavam a ter os seus voos cheios para a semana santa. E vários países a reabrir a economia. Ok, é favor desmontar as mesas e as cadeiras, recolher as camas de praia e regressar para dentro de casa.

Olhando para a bela relação entre a UE e a AstraZeneca e agora esta suspensão só posso finalizar com: Que comecem as teorias da conspiração.

Recessão democrática

No take introdutório do GPS emitido na passada semana na RTP3, Fareed Zakaria apresentou a sua visão sobre aquela que deve ser a prioridade das prioridades da Administração Biden: conter a pandemia. Conter a pandemia, salvar pessoas, vacinar mais e mais rápido, recuperar a economia e mostrar ao mundo que os EUA podem liderar no combate à pandemia e à crise económica, e voltar a ocupar a posição de farol das democracias liberais, reconstruindo alianças estilhaçadas por quatro anos de governação destrutiva, recuperando a credibilidade perdida, redefinindo prioridades diplomáticas, estratégicas e geopolíticas, reafirmando o papel dos EUA no mundo e recolocando o país no centro da política internacional. Uma missão quase-impossível, pelo menos no curto prazo, depois dos estragos causados pelo furacão Trump.

No mesmo programa, David Miliband usou um termo que ouvi pela primeira vez, “democratic recession”, associado não só à governação Trump, mas a toda a onda de populismo oportunista, mais ou menos autoritária, sempre grosseira e arrogante, ideologicamente vazia, no sentido filosófico da palavra, e cuja artilharia pesada consiste na divisão, exacerbada pela construção artificial de um (ou mais) inimigo comum, pela transformação de minorias em bodes expiatórios, para efeitos de distracção, e numa profunda instrumentalização do medo, de feridas mal saradas, do ressentimento e do ódio, como catalisador da violência miliciana.

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2020: o ano de todas as pandemias

2020 foi um ano difícil, que pode ser resumido em poucas palavras: vírus, epidemia, pandemia, medo, confinamento, distanciamento social, máscara, álcool-gel, negacionismo, contágio, zaragatoa, teste, ventilador, profissionais de saúde, SNS, layoff, crise económica, vacina e morte. Talvez pudessem ser acrescentadas mais algumas, que nem me ocorrem nem me apetece procurar, porque não pretendo fazer disto uma obra científica, mas este foi o léxico dominante, durante os nove últimos meses. E, não nos iludamos, continuará a sê-lo.

Muito foi dito e escrito sobre a pandemia. Da “gripezinha” à falsa sensação de segurança, passando pelas habituais conspirações, amplificadas pela ignorância militante, de repente éramos 7,8 mil milhões de especialistas em saúde pública, virologia e gestão de crises. Por cá fomos bestiais, depois bestas, e, quer-me agora parecer, terminamos o ano como culpados pelo agravar dos números. E não, não saíamos mais unidos, mais conscientes ou mais humanos de tudo isto. Saímos como entramos, com as nossas virtudes e defeitos, adaptados ao novo normal que, esperamos, já seja uma recordação distante daqui por um ano. [Read more…]

O Index e a nova Inquisição

Quem nunca ouviu aquela boa velha linha, que vai mais ou menos assim: “só dás valor às coisas quando já não as tens”? Eu já ouvi, várias vezes, em vários contextos e por vários motivos. A propósito dela, da boa velha linha, há algo que, em certos países, se está a perder. Um algo ao qual talvez não estejamos a dar o devido valor, e que, suspeito, estamos em risco de perder. E não é um algo qualquer. É o jornalismo, um dos pilares que sustenta o edifício das sociedades democráticas. Mais ou menos independente, a morte do jornalismo profissional é uma tragédia para a democracia. E está a acontecer. Aqui e agora, na União Europeia dos direitos humanos e da liberdade de expressão.

O jornalismo pode morrer de muitas maneiras. A mais comum e eficaz é a morte por autoritarismo. Chame-se o que se lhe quiser chamar: autoritarismo, nacionalismo, democracia iliberal ou totalitarismo. Ou o bolsoliberalismo evangélico, subespécie alternativa e ainda pouco estudada, que destrói o jornalismo ao mesmo tempo que cria páginas no Facebook e no Twitter, com pastores evangélicos que pregam o criacionismo e a teologia da prosperidade, através da qual burlam a ignorância e compram bons helicópteros. Com mais ou menos porrada, mais ou menos exploração, vai tudo dar – literalmente – ao mesmo. [Read more…]

Privilégio Branco?

Há umas quantas coisas de que me orgulho. Sou português, portuense, portista, liberal e gosto bastante de salmão. Sou sincero, nunca senti muito orgulho em ser branco, porque nunca pensei nisso sequer. No máximo, posso dizer que me orgulho de ser europeu.

No sábado, realizou-se, por toda a Europa, o protesto contra o racismo. Tudo isto começou pelo assassinato bárbaro numa cena de abuso policial, nos EUA. Tudo isto originou uma enorme revolta e que se baseou em chavões como “privilégio branco”. Lamento informar os mais ativos nesta luta, mas esse tal privilégio branco não existe. E também lamento informar que não existe racismo estrutural em países como Portugal ou os EUA.

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A pandemia neofascista

JB

Cartoon: Carlos Latuff

Nelson Teich, apesar do apelido que rima com Reich, não sobreviveu um mês no Ministério da Saúde de Bolsonaro. Entrou a 17 de Abril, para substituir Luiz Henrique Mandetta, demitiu-se a 15 de Maio, para ser substituído por (mais) um militar. O anterior foi corrido por insistir na importância do distanciamento social. Este demitiu-se por se recusar a recomendar a cloroquina, e por discordar da equiparação de salões de beleza e ginásios a serviços essenciais. Pobre Ministério da Saúde brasileiro, onde o conhecimento científico é enxovalhado e espezinhado, e o autoritarismo ignorante de Bolsonaro é quem mais ordena.

O senhor que se segue é o general Eduardo Pazuello, um militar de carreira sem qualquer tipo de formação na área da saúde. Contudo, Pazuello é detentor da melhor das qualidade para integrar o actual governo brasileiro: é amigo pessoal de Bolsonaro. Tão amigo que afirmou mesmo estar disponível para acatar qualquer medida imposta directamente pela presidente para a área da saúde. Com obediência cega e sem levantar questões. [Read more…]

Não peças a quem pediu, nem sirvas a quem serviu

Apesar da vontade e determinação de Ursula von der Leyen (por quem me é impossível não deixar de sentir simpatia), todos os dias somos confrontados por uma evidência que de tão óbvia se torna inegável e que tem de começar a ser assumidamente considerada em todas estas equações: a Europa não existe. Ponto.

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Crónicas do Rochedo 38 – Tempos de Excepção, medidas de Excepção

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O que acontece se o sector da Restauração e similares (restaurantes, bares, cafés, confeitarias, etc) não recupera rapidamente?

Nenhum problema, eu sou agricultor e produtor de fruta e legumes, continuo a plantar e a mãe natureza encarrega-se do resto”. Errado: o sector da Restauração e Similares é o principal consumidor de frutas e legumes. Sem ele o agricultor terá de fazer como já se vê em muitos dos países atingidos pela pandemia: deixar na terra a maioria da sua produção por não ter quem compre. O mesmo no caso dos produtores de gado.

Nenhum problema, eu sou produtor de vinhos e as uvas continuam a nascer e o vinho a produzir-se”. Errado: o sector da Restauração e Similares é o principal comprador de vinhos a nível mundial. Sem restaurantes e bares bem que os produtores de vinho terão de reduzir em 75% a sua produção.

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Embargar a China? Why not?

CH

Não querendo entrar em teorias rebuscadas sobre a origem do novo coronavirus, de natureza conspirativa, parece-me inegável que a China foi desonesta com o resto do mundo, ao ocultar, deliberadamente e durante várias semanas, a gravidade do problema que tinha em mãos.

Vai daí, é meu entendimento que o mundo deve exigir à China compensações financeiras pelo caos que a sua opacidade aprofundou. Vou ainda mais longe: parte significativa do Plano Marshall que a Europa e o mundo vão precisar, quando a crise económica que já se sente ocupar o primeiro plano das nossas preocupações, deve ser assumido por Pequim.

Caso a China decida não colaborar, defendo que deve haver coragem, pelo menos do mundo democrático, em impor sanções pesadas, e, eventualmente, um embargo total. De caminho, e pensando apenas no espaço europeu do qual faço parte, parece-me que estamos perante o momento ideal para um plano ambicioso de reindustrialização da Europa, capaz de, simultaneamente, gerar emprego e acabar com a dependência das importações chinesas. Isto será absolutamente crítico em sectores como o têxtil ou o automóvel, apenas para citar dois exemplos.

Naturalmente, tal intenção enfrentará poderosas forças de bloqueio, não só da própria China, como do sector financeiro e da grandes multinacionais ocidentais, cujos lucros, estratosfericos, dependem dos baixos custos de produção e de matérias-primas que a grande fábrica do totalitarismo chinês lhes proporciona. Mantendo o actual status quo comercial, é praticamente impossível ao Ocidente competir com um regime que explora a mão-de-obra, ignora direitos laborais e não respeita direitos humanos.

Ainda no campo dos interesses do modelo económico ocidental, importa realçar que a China é hoje um dos maiores mercados de consumo a nível mundial e um dos maiores clientes de produtos de luxo produzidos pela Europa e pelos EUA. Um embargo total à China resultaria numa perda significativa de vendas para inúmeras marcas, do sector da moda ao automóvel entre muitos outros. E o capitalismo, que não se deixa abalar por contradições éticas ou morais, dificilmente cederá. É o lucro que importa, não os direitos humanos. Muito menos a democracia.

Assim, encontramo-nos numa encruzilhada. Por um lado, estamos reféns de um regime comunista totalitário, que controla e comanda parte significativa da economia mundial, incluindo empresas estratégicas na Europa e EUA. Por outro, estamos nas mãos de multinacionais e instituições financeiras, que se deitam com qualquer oligarca ou autocrata que lhes pague o preço certo em euros. Ou dólares. Ou yuans. Talvez precisemos de uma revolução. E os ares de Abril costumam ser propícios para derrubar ditaduras. Why not?

O choque de ventiladores

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Primeiro foram os chineses, que, “tendo o problema controlado” (so they say), começaram a enviar ajuda para países europeus. Depois vieram os cubanos, com os seus médicos comunistas, infectados até ao tutano de perigosíssimo marxismo cultural, seguindo-se os russos, que enviaram ajuda médica para Itália.

Perante a multiplicação dos gestos de “solidariedade”, que se estenderam também aos EUA, pela mão do amigo Vladimir, Donald Trump ter-se-á apercebido do seu atraso na corrida pela instrumentalização oportunista da solidariedade da treta, e lá foi ele, esbaforido, a correr atrás do prejuízo. [Read more…]

Crónica do Rochedo 33º – A pandemia europeia

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Quando Portugal procurou a ajuda dos seus parceiros europeus para a questão da violação dos direitos humanos em Timor, boa parte da Europa assobiou para o lado (então a Holanda…). Quando os países do sul da Europa precisaram de ajuda no combate à crise provocada pelo colapso financeiro de 2008/9, boa parte da Europa balançou entre o assobiar para o lado e o castigar esses “bebedolas”. Quando a Grécia se viu a braços (e continua) com o problema dos refugiados, boa parte da Europa fez de conta. Quando, hoje, perante uma pandemia sem precedentes a Itália pediu ajuda, parte substancial da Europa disse não ou, no melhor dos casos, nim.
A Europa está refém de uma doença infecciosa que se espalha entre parte substancial dos seus países, sobretudo a norte e centro, um vírus que se pode descrever como uma espécie de “eu quero lá saber dos outros países, do bem comum, o que importa é o meu interesse: o meu país, a minha economia, os meus problemas”. É uma pandemia europeia.

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