Nas últimas duas semanas tenho acompanhado com alguma atenção dentro das minhas possibilidades o Australian Open. A eliminação precoce dos principais favoritos à vitória na prova pelos lugares cimeiros que ocupam no ranking mundial de Novak Djokovic e Andy Murray (apesar de estarmos no início da nova temporada e do Open Australiano ser a primeira confirmação do estado de forma dos tenistas para a presente temporada e do facto de alguns dos tenistas se darem algo mal com o caloroso e húmido clima austral) e as dúvidas existentes quanto ao estado de forma de Rafael Nadal e Roger Federer, este último regressado depois de meio ano de paragem que o impediram de prosseguir por exemplo o seu sonho olímpico no Rio, suscitam a possibilidade, pelas excelentes exibições que foi fazendo ao longo do seu percurso na prova, de termos em Grigor Dimitrov o habitual outsider ou até mesmo underdog que costuma marcar historicamente o grand slam australiano.
Ontem na Rod Laver Arena, o tenista búlgaro (actualmente radicado em Espanha, onde treina) voltou a provar o porquê de ter sido a sensação do torneio e de ter eliminado as duas grandes sensações da prova nas últimas duas rondas (o casaque Istomin e o belga David Goffin; Istomin eliminou Djokovic na 2ª ronda e encontrava-se numa brutal forma física) ao obrigar Rafa Nadal a horas extraordinárias para chegar a um mais uma final de um Grand Slam. Apesar de ter ficado de fora, o tenista búlgaro provou ontem que depois das tormentas que passou nos últimos 2 anos, aos 25 anos, encontra-se finalmente na pista certa para obter resultados mais positivos e mais de acordo para com o enorme potencial que apresenta para a prática profissional da modalidade e para com as expectativas que sempre lhe foram apontadas e que de resto levaram a imprensa da modalidade a equipará-lo a Roger Federer. A verdade é que a longa pancada de direita forehand inside out e a esquerda a uma mão cortada e agressiva vencedora que é imagem de marca do deus do ténis estão lá no jogo do tenista búlgaro, bem como um hábil jogo de pés no fundo do corte e uma qualidade ímpar de serviço de braço articularmente bem esticado para granjear a esse mesmo serviço um dote de profundidade que obriga os adversários automaticamente a terem que recuar e a terem posteriormente, com rápidas e profundas passas de esquerda e de direita aberta, dificuldades para sair do fundo do corte ou para tomar a iniciativa de jogo.
Arrisco-me a dizer que o búlgaro tem a melhor esquerda (a uma mão) do circuito, facto que não foi suficiente para contrariar a fantástica direita a uma mão que Nadal exibiu ontem.
Noutro prisma, 2017 parece-me ser o ano em que Dimitrov poderá finalmente entrar na elite do ténis mundial. Aos 25 anos, o actual nº 15 mundial (já conseguiu em 2014 entrar no top mundial por algumas semanas), vencedor de dois grand slams na categoria juvenil (Wimbledon e US Open em 2008), apesar de já levar no seu saco 5 títulos em torneios ATP não tem confirmado estar à altura das expectativas que o elevavam há uns anos atrás a um possível candidato a nº1 mundial (para não dizer dominador). Com uma carreira cheia de altos e baixos pela qual já passaram (6) treinadores reputadíssimos (um deles Franco Davin, o treinador que elevou Juan Martin del Potro) e cheia de momentos muito pouco positivos como por exemplo foram os anos em que namorou com Maria Shaparova (anos de estado regressivo em que o búlgaro foi eclipsado à sombra da tenista russa e esqueceu-se que tinha uma carreira para construir) o búlgaro, agora orientado pelo antigo treinador de Andy Murray, o venezuelano Daniel Vallverdu, um antigo aspirante a profissional que cresceu na escola de Emílio Sanchez, tem absorvido do seu técnico o principal lema que guia o ténis espanhol: para vencer tens de sofrer muito. Vallverdu tem obrigado o búlgaro a melhorar os seus índices físicos e nota-se que conseguiu porque o búlgaro reaparece agora em 2017 com mais massa muscular e com uma maior rapidez e resistência, características que lhe permitem controlar melhor as jogadas, bater os forehands, as esquerdas e os passing shots com uma potência superior e servir com mais velocidade, e acima de tudo, tem desenvolvido finalmente o quadro mental do jogador, tornando-o muito mais frio, mais calculista e menos susceptível à quebra mental quando o seu jogo não está a fluir como pretende.
As finais
Esta madrugada, mais propriamente dentro de algumas horas e na próxima madrugada de sábado para domingo teremos as finais feminina e masculina da prova. Serão dois grandes clássicos do antigamente no presente com as irmãs Williams a disputar novamente uma contra a outra um título do grand slam, facto que já não ocorria desde 2009 quando a mais nova das Williams conseguiu atingir o seu 3º torneio de Wimbledon (a Living Room das Williams, com 11 títulos em conjunto na prova britânica nos últimos 18 anos) e que até há poucos meses era impensável dado que Venus para além de estar na fase descendente da carreira há alguns anos esteve praticamente todo o 2016 lesionada. Na final masculina, teremos uma re-edição dos brutais confrontos entre Rafa Nadal e Roger Federer, facto que também não acontece em grand slams desde a final que o suiço perdeu para o espanhol em Junho de 2011 em Rolland Garros.
O expresso Suiço demonstrou no torneio australiano que não só recuperou bem da lesão que o atormentou em 2016 e que o obrigou a parar por 6 meses como realizou uma excelente pré-temporada, aparecendo no certame australiano numa forma física tremenda e com uma atitude dominadora ímpar que faz lembrar o mítico Federer da primeira década deste século. Já o espanhol também parece em franca recuperação da forma, com um jogo francamente positivo, menos atacante que o seu normal mas com melhores pormenores técnicos no serviço e na direita de recurso a uma mão, um dos capítulos onde tem falhado nos últimos anos.
Duarte Vale: o ténis português tem uma nova promessa
O torneio australiano revelou que o futuro do ténis português poderá estar assegurado na próxima década com o jovem Duarte Vale. O jovem português, nº16 do ranking júnior, conseguiu chegar à final de pares do torneio júnior juntamente com o seu colega neo-zelandês Fynn Reynolds, claudicando apenas contra a dupla formada por um atleta de Taiwan e outro da China. Excelente resultado dadas as condicionantes que marcaram a prestação da prova de pares, em que o português não conhecia o seu colega neo-zelandês. No torneio de individuais masculinos, Vale, conseguiu chegar aos oitavos-de-final da prova júnior. Mais uma vez nada mau para um produto 100% genuíno da formação nacional visto que o atleta ainda não teve que sair do país para poder subir um degrau na sua formação.
Final feminina com as irmãs Williams, masculina Federer vs. Nadal, até parece que estamos a assistir ao Australia open na tv memória… ou então chegaremos à conclusão que a modalidade se renovou pouco…
No topo da cadeia, sim, António!