O roto, o nu e o bloco central

Fotografia via TVI24

No debate quinzenal da passada semana na Assembleia da República, Fernando Negrão questionou o governo e o grupo parlamentar do PS sobre o porquê de demorar três anos a demarcar-se de José Sócrates. É uma pergunta legítima, ainda que pouco ou nada contribua para o trabalho parlamentar, mas é, acima de tudo, a expressão máxima daquela mania dos políticos chicos-espertos que nos tomam a todos por parvos. O velho hábito do roto apontar o dedo ao nu. O bloco central em todo o seu esplendor.

É evidente que o assunto é incómodo para o PS. E é altamente provável que exista quem, no executivo Costa, tenha feito umas marotices com o enfant terrible do PS que fez escola na JSD. Mas já que estamos nisto, seria interessante perceber quanto tempo mais irá o PSD demorar a demarcar-se do Dias Loureiro. É que, não só nunca se demarcou, como não tenho memória de qualquer dirigente do PSD manifestar embaraço por essa grande figura da hecatombe financeira que foi o antigo ministro de Cavaco.

Tenho, contudo, memórias muito frescas dos rasgados elogios tecidos por Pedro Passos Coelho ao antigo administrador do BPN, esse mini-banco que nos custou um mega-resgate, que não perdeu a oportunidade de cumprimentar Dias Loureiro de forma “muita amiga e especial”. Agora imaginem que era António Costa, no exercício das suas funções, quem cumprimentava José Sócrates de forma “muito amiga e especial”. Havia de ser bonito, mas não tão bonito quanto Dias Loureiro a emocionar-se durante a apresentação do livro “Sócrates – o menino de ouro do PS”, durante a qual discursou, depois de se multiplicar em elogios ao então primeiro-ministro, referindo-se a Sócrates como “homem trabalhador” e de “detalhes”: “Só quem está atento aos detalhes pode fazer grandes coisas. Essa é uma característica dos grandes homens”, afirmou, perante uma plateia de socráticos convictos. O bloco central de interesses, rotos e nus, a ser igual a si próprio. Ao mais ínfimo detalhe. Sem vergonha na cara.

Comments

  1. Rui Naldinho says:

    O velho PSD sempre se conspurcou com o velho PS. Não foi por acaso que assistimos durante anos a um desfile de vaidades, com casamentos à mistura, entre os filhos, irmãos, primos, etc, de uns e outros.
    Mário Soares a defender Leonor Beleza, no caso dos hemofílicos, João Soares a defender Horácio Roque, o defunto fundador do BANIF, Dias Loureiro e Ferro Rodrigues com os filhos casados ainda que a união fosse efémera.
    Os donos desde país sempre se pavonearam décadas a fio, sem que a justiça triasse os seus negócios, as suas relações profissionais, ou de onde lhes vinhas tantos proventos, mesmo que já tivessem património.
    Era o tempo em que os ricos por estatuto eram intocáveis.
    Depois veio Cavaco, Dias Loureiro, Isaltino Morais, Valentim Loureiro, José Sócrates, Vara, e muitos outros. Vindos da província sabiam que seriam sempre objecto de chacota, mas acima de tudo de desconfiança. Ainda assim acharam que o Poder e muito populismo à mistura lhes garantiria um futuro risonho. Doesse a quem doesse. Quem pudesse que se salvasse.
    Puseram-se a jeito, e deu no que deu. Achavam que a melhor forma de também eles terem estatuto, não era pela via curricular ou académica, por exemplo, mas sim pelo Poder em si mesmo.
    Se houvesse arrependimento, Portugal ficaria entregue a uma minoria de intelectuais, alguns porventura políticos ocasionais, que escapam a esta teia de mafiosos, que se foi construindo ao longo de 44 anos.
    Mas para isso nunca haverá coragem. Até porque a essência do regime é infelizmente essa mesmo. Troca de favores e promiscuidade entre o Estado e o Privado.

  2. Regina Afonso says:

    Estas partidos de direita (PS+CDS+PSD)levam-nos a esta situação.
    O Povo tem que abrir os olhos. Quem tinha razão era o nosso querido e saudoso Cunhal, que como genuíno Homem de esquerda sabia que as eleições ( esse ardil burguês) não servem senão para subjugar o Povo. As eleições devem ser abolidas e substituidas pelo processo revolucionário.
    Para quando uma revolução que nos traga os deleites de uma sociedade igualitária como a China de MAO ou o Vietnam de Ho Chi Minh ou até a da Venezuela de Chavez,
    para quando… ?
    Bem haja João Mendes continue com a sua abnegada luta , só podemos contar com pessoas como você, incansável na sua justa luta, continue camarada pode ser que o Povo acorde

    Regina Afonso