“Começaste por dar um rico exemplo…”

Nos inícios de carreira, o meu pai, que partilhava um gabinete de arquitectura com outros colegas, decidiu forrar de novo a prancha do seu estirador, com o seu habitual meticuloso cuidado.

Dava gosto ver aquele forro liso, imaculado, de vincos e dobras perfeitos, a contrastar com os estiradores dos demais colegas, já cheios de esquissos, apontamentos, contas e outras anotações sarrabiscadas.

De modo a evitar que o mesmo se passasse naquele primor de forro acabado de fazer, colocou no canto superior direito o seguinte aviso: “É favor não escrever neste forro”.

No dia seguinte, quando se sentou frente ao trabalho, apercebeu-se do seguinte escrito, logo abaixo do predito aviso: “Começaste por dar um rico exemplo…”.

Lembrei-me deste episódio, que o meu pai contava com um sorriso próprio de quem aprecia o humor, mesmo quando se é o alvo, quando este fim-de-semana ouvi António Costa dizer que os políticos têm de respeitar a maioria absoluta conferida pelo povo ao PS.

Primeiro, achei interessante falar em “políticos”, como se ele não fosse um. À boa moda populista, que ele mesmo diz combater.

Depois, duvidei que ao falar em “políticos”, estivesse a referir-se a algum dos seus ministros ou até mesmo a ele próprio. Duvido, face ao tom altivo com que proferiu tal discurso. Mas, devia.

Devia, porque se há alguém que não tem mostrado respeito pela maioria dada pelo povo ao PS é o PS. Melhor ainda: é António Costa.

A começar pelas suas escolhas para ministros, como já está demonstrado à saciedade e por razões diferentes, pelos casos João Galamba ou Maria do Céu Antunes. Tanto mais que, com maioria absoluta, é sempre mais fácil cativar os melhores valores e competências, para os respectivos assuntos. Ao invés de, em pouco tempo, se afundar em “casos e casinhos”, “horas e horinhas”, e outros “inhos” deprimentes.

Ao longo deste mandato, António Costa devia ter começado por dar o exemplo de respeito pela maioria absoluta que o povo lhe conferiu.

Devia, porque a importância e complexidade do dossier TAP a isso obrigava. Ao invés do modo inábil e caótico como tem sido tratado, para além do desbaratar do dinheiro proveniente do erário público, em erráticas indemnizações e afins.

Devia, porque, por exemplo, professores, enfermeiros e funcionários judiciais, estão só reclamar um tratamento digno.

Devia, porque a sustentabilidade da Segurança Social, não pode ser usada de acordo com as circunstâncias do momento, para justificar opções de aumentar ou não pensões ou auxílios sociais ao sabor de índices de popularidade.

Devia, e não o fez, porque face à perda do poder de compra mercê, também, de uma inflação galopante, cedeu aos interesses do lucro da banca em detrimento do aforro do cidadão. Com o anúncio do fim dos certificados de aforro a uma sexta-feira ao fim do dia e a emissão de novo produto financeiro menos competitivo face à banca.

Devia, porque o problema da habitação e do alojamento de estudantes deslocados, carece de ser resolvido com urgência e eficácia. Ao invés de se diabolizar proprietários, AL`s, ou de se permitir a construção a bel-prazer (como se já muito disto não acontecesse…). E, pior, de se querer resolver tal matéria sem concertação prévia com as autarquias e sem qualquer intenção de implementar cooperativas de habitação.

Por tudo isto, e muito mais, António Costa devia e deve maior respeito pela maioria absoluta que lhe foi confiada. Devia dar o exemplo do que exige aos “políticos”. Até porque é político. Há muitos anos.

Comments

  1. João Mendes says:

    Excelente malha, camarada!

  2. Júlio Santos says:

    E então, não está de acordo com o dito?? Quem tem maioria parlamentar é que deve governar e o PS está a fazê-lo. Não gostam? Paciência, aguentem.

    • POIS! says:

      Pois sim senhor! Nem mais!

      É um programa político fenomenal: aguentem e não bufem, porque qualquer dia CHEGA qualquer coisa pior!

      Foi pena que não tivessem explorado melhor a coisa durante a campanha eleitoral. O Costa aparecia no púlpito e em holograma no país todo a pedir: portugueses, sede bonzinhos, dêem-nos uma maioria absolutamente absoluta. Com que objetivo? Aguentem aí que logo se vê!

      • Júlio Santos says:

        Os restantes partidos fazem o mesmo, prometem prometem, mas depois, acabam por nos roubar nos salários e nas reformas e vem o PS e devolve tudo o que nos foi roubado . Mas, como somos pobres e mal agradecidos, desvalorizamos isso. É pena.

        • Camarada says:

          sócrates és tú?

          • POIS! says:

            Pois e…

            luís burreiro, és tu?

            Está Vosselência muito bem disfarçado!

            Mas cuidado! Com essa pele às costas, aí no matadouro ainda o confundem com um novilho. Pode acabar desmanchado e embalado para fricassé e moelas.

        • POIS! says:

          Pois…”é pena”?

          Ora essa! Aguentem!

        • Paulo Marques says:

          Nem isso, além de ter sido empurrado para fazer alguma coisa, ainda estou à espera de uns ordenados e uns aumentos. E há muito, muito pior.
          Com papel assinado ainda foi obrigado a não voltar atrás, sozinhos é isto.

  3. Embrulha. says:

    Este queria que o Costa com maioria absoluta tivesse governo tipo “geringonça”

    • Paulo Marques says:

      Eu queria que, com maioria absoluta, governasse, resolvesse, e deixasse de ser calimero com quem não tem poder nenhum.
      Como qualquer outro conservador, são completamente incapazes porque não gostam dessa coisa que é o povo.


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  1. […] anda há imensos anos a alimentar, a comentar, a perder-se em (e a fazer-nos perder tempo com) «“casos e casinhos”, “horas e horinhas”, e outros “inhos” deprimentes», em vez […]

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