A história de um contador de histórias caloteiro e incompetente

N’Esta porra triste de país que alguns lunáticos entendem estar melhor, onde fanáticos extremistas aparentemente se deixam falecer em urgências de hospitais públicos, movidos por utopias gregas do campo ideológico da literatura infantil, houve um dia um contador de histórias que, perante uma clientela assembleia em profundo êxtase, afirmou o seguinte:

Há muitos que deviam pagar os seus impostos e não pagam. Porquê? Porque não declaram as suas actividades. Ora nós temos obrigação de corrigir estas injustiças. Não há nada mais social-democrata do que isso, porque aquilo que devia orientar um princípio de social-democracia é a igualdade de oportunidades. Não é o privilégio, mesmo o pequeno privilégio. Se há quem se ponha de fora das suas obrigações para com a sociedade, sendo muito ou pouco, esse alguém está a ser um ónus importante para todos os outros que têm um fardo maior.

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ocupam o passeio

O passeio é estreito. A mulher desce a rua com as crianças, três meninas. As crianças chalreiam, riem alto. A mulher não diz nada, tem os olhos postos nalgum ponto distante, no fim da rua. A mulher vai cansada. As crianças e a mulher ocupam o passeio todo. A rua é antiga, o passeio é estreito. A mulher e as três crianças são negras e ocupam o passeio.

O homem está parado à porta da mercearia. Tem à mão apoiada na parede e fala lá para dentro, para um merceeiro oculto nas sombras da mercearia antiga. Na outra mão leva um saco de plástico com uma lata de salsichas. O homem vira-se no pior momento e embate na mulher. A mulher espanta-se porque vai a pensar noutra coisa. O homem enfurece-se.

– Então, é assim?!

A mulher não diz nada, sustém-lhe o olhar. Ele repete, agora mais alto:

– É assim?! [Read more…]

Mal-entendidos

Quando cheguei, já tarde, contava-se a história de um homem cuja vida fora marcada por um episódio dramático, ocorrido no final da adolescência. O episódio, que, pelas razões que a seguir se explicarão, não vos posso contar, tinha tanto de torpe como de pungente e era fascinante do ponto de vista ficcional. E foi justamente isso que entendi, que se tratava do enredo de uma obra de ficção.  Um romance a que me apeteceu deitar mãos de imediato, diga-se. Mas a narração do episódio chegava ao fim, impunha-se avançar para outro tema, e eu já não encontrei espaço para esclarecer de que autor e de que obra se falava.

Nos dias seguintes, procurei no Google. Não era fácil, apenas com um excerto da trama, sem saber autor nem título, nem coisa nenhuma. A temática levava-me a supor que se trataria de uma obra relativamente recente, mas a busca revelou-se infrutífera. Não conseguia encontrar nenhum registo de uma obra com esse enredo. [Read more…]