O fanatismo wahhabita e o paradoxo saudita

Radical Islam

O fundamentalismo islâmico é-nos muitas vezes vendido como um fenómeno circunscrito a meia dúzia de organizações, das quais a Al-Qaeda e mais recentemente o Estado Islâmico parecem ser as principais embaixadas onde tudo começa e acaba. Por várias vezes, o João José Cardoso chamou neste espaço a atenção para diferença entre a generalização que se faz do radicalismo islâmico e o wahhabismo, a interpretação mais radical e opressiva do fanatismo religioso que tem na acção das organizações referidas a sua máxima expressão. O financiamento, esse, chega em quantidades industriais da Arábia Saudita, destacado parceiro comercial do Ocidente moralista repleto de Charlies que gostam de aparecer mas que na realidade se estão nas tintas para o alto patrocínio que o regime de Riade disponibiliza para os criminosos que erguem o Corão em nome da destruição arbitrária.

Vem isto a propósito do recente atentado terrorista que culminou na destruição da cidade milenar de Nimrud, no Iraque, que muitos historiadores defendem ser o berço do primeiro Estado da humanidade, o império Assírio. As imagens chocam e à primeira vista parece-se tratar-se de barbárie gratuita. Nada disso: é o wahhabismo em todo o seu esplendor. É que para além da estratégia de marketing dos vermes do Estado Islâmico, que procura chocar e despertar o medo por via da violência e da destruição com requintes de malvadez, existe a questão religiosa, e os radicais wahhabitas não toleram a possibilidade de existência de outros deuses ou objectos de culto. Daí a necessidade imperiosa de arrasar toda e qualquer referência a outras entidades divinas que não a sua. Tal como fizeram os talibãs com os Budas gigantes de Bamiyan. O objectivo é reescrever a história e destruir a identidade dos hereges.

É no entanto interessante verificar a contradição apontada por Diogo Vaz Pinto no jornal I, quando refere que o mesmo Estado de onde jorra financiamento para a escumalha fanática tem vindo a arrasar locais históricos e sagrados nas cidades de Meca e Medina, regra geral para alimentar a grande máquina da construção civil saudita. Onde outrora existiam locais de culto existem hoje hotéis e centros comerciais. Pior que esse monte de esterco que é o Estado Islâmico só mesmo regime saudita que queima bruxas na fogueira, apedreja bloggers, financia fanáticos e ainda consegue a proeza sacrificar lugares sagrados para construções “profanas” sem que tal provoque a irá dos fanáticos que financia. Tudo isto perante a passividade do moralismo hipócrita do Ocidente.

Comments

  1. Ernesto Martins Vaz Ribeiro says:

    Crónica muito clara e circunstanciada.
    Contudo, discordo em absoluto da última frase : “Tudo isto perante a passividade do moralismo hipócrita do Ocidente”.
    De facto meu caro João Mendes o ocidente está metido nesta história sem qualquer tipo de passividade e ligado aos interesses do petróleo que o fazem aparentemente “assobiar para o lado”. A ajuda americana à Al Qaeda de Bin Laden na luta contra os Russos e o proteccionismo que os mesmos americanos executam com tanto velo à Arábia Saudita, é a prova em como uma parte do Ocidente, está metida até ao pescoço nesta andança criminosa.
    A parte Ocidental que assiste com passividade é a Europa, mas isso é porque os seus políticos não têm coluna vertebral, nem princípios, nem valores.

    • Não me recordo de qualquer repreensão por parte dos EUA aos fanáticos sauditas. Pelo contrário, trata-se de uma amizade de longa data…

      • Ernesto Martins Vaz Ribeiro says:

        Pois. Nem eu e por isso é que postura ocidental e mais concretamente a dos EUA vai muito para além da passividade a que João Mendes alude.
        Estes actos que tão bem relata, indicam-nos que estamos perante um conluio criminoso (porque falamos de crimes contra a Humanidade). Se quiser, como se diz em português … “Tão bom é o que rouba como o que fica à porta”.
        A passividade, quanto a mim, é outra coisa, bem mais “soft”.
        Cumprimentos.

        • Tem razão Ernesto. O termo passividade peca por ser demasiado simpático para com a situação. Cumplicidade talvez seja mais objectivo.

          um abraço

  2. “Se estão nas tintas para o financiamento”? a ideia não é contar a historia do capuchinho vermelho espero. Traga para o post os conselheiros, analistas, consultores, etc ingleses e americanos que dominam as “monarquias” do golfo e enriquece o seu post com substancia que se veja.

    • Não Cristo9, não é essa a minha intenção. A minha intenção é efectivamente afirmar que o ocidente moralista se está mesmo nas tintas para o facto dos amigos sauditas financiarem alguns destes monstros. Aliás, os próprios moralistas já financiaram alguns, veja-se o caso da Al-Qaeda.

  3. O vídeo foi eliminado.

Trackbacks

  1. […] Rei Salman baralha e volta a dar. Preço do barril de crude reage com subida de 2,23%. Não se perspectiva qualquer impacto negativo no financiamento aos terroristas sunitas/wahhabitas. […]

  2. […] No país do wahhabismo e dos financiadores do terrorismo islâmico, o blogger Raif Badawi ficou ontem a saber que a pena de 1000 chicotadas e 10 anos de prisão por alegados “crimes” de insulto e renúncia ao Islão é mesmo para cumprir. Outra coisa não seria de esperar de uma nação governada por fundamentalistas sedentos de sangue que condenam cidadãos à morte por bruxaria. […]

  3. […] dias financia terroristas, noutros prende-os. Nem os restantes fanáticos os […]

  4. […] religioso proveniente da Arábia Saudita, o seu entreposto comercial, dirige-se a partir de Raide um dos regimes mais totalitários e violentos do planeta, ao nível da Coreia do Norte. A arbitrariedade e a repressão são o prato do dia por aquelas […]

  5. […] piada, ver Riade fazer acusações desta natureza, mesmo quando se referem a outros radicais, quando a Arábia Saudita é um dos maiores financiadores e promotores mundiais do extremismo. Do extremismo, da ignorância e da violência. Mais piada só mesmo Trump, que apoiou e não se […]

  6. […] Os gajos são árabes, logo radicais, e os nossos amigos da Arábia Saudita, que são árabes mas não são radicais, mais os israelitas, ficam mais descansados e compram-nos mais […]

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