Crónicas do Rochedo XVIII – Incêndios, uma tragédia portuguesa

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No dia em que Portugal assistiu a uma das suas maiores tragédias colectivas escrevi, na minha página no facebook: “Nesta hora triste da nossa história colectiva aqueles que, como eu, não são “especialistas” devem remeter-se ao silêncio. E deixar quem sabe fazer o seu trabalho. É a melhor forma de respeitar quem está no terreno a trabalhar e quem está a ser vítima desta calamidade nacional“.

Já passou o tempo suficiente para o silêncio. Agora, mais a frio, vamos procurar uma análise política. Melhor dito, ao comportamento político dos agentes da dita.

Deve a Ministra demitir-se? O Governo de António Costa é culpado? De quem é, politicamente, a culpa?

Para a primeira pergunta penso que a resposta é óbvia mas por motivos diversos daqueles que tenho visto escritos. Sim, a ministra deve demitir-se. Porque é culpada da tragédia? Não. Porque é culpada pelas falhas durante todo este processo? Não. Deve demitir-se porque não soube estar à altura a situação. Exemplificando: aquele momento, quando o Presidente da República entra em directo nas televisões e se vê a senhora a “furar” por entre assessores e demais agentes para ficar no plano televisivo é mais do que suficiente para a sua demissão. Num momento como aquele que se estava a viver existir a vertigem do “estar no boneco” é vergonhoso e diz muito, mesmo muito. E eu conheço bem, muito bem, essa vertigem dos senhores políticos e estes seus momentos “animal” sempre que um operador de imagem surge por perto… E um outro motivo que justifica a sua demissão: todos assistimos, graças às televisões, na forma como a senhora ministra estava “perdida”, “nervosa”, “hesitante”  e “perturbada” ao longo de todo o processo. A quem dirige exige-se frieza, discernimento, sangue frio e confiança no que está a fazer. Era isso que os homens e as mulheres que combatiam a tragédia precisavam  – e tiveram um bom exemplo no Presidente da República.

Mas a senhora é culpada? E com ela este governo? É tão culpada como todos os ministros da mesma pasta desde 1986. Todos eles e os seus respectivos governos. Não existe, sobretudo a partir da nossa adesão à CEE, hoje UE, nenhuma desculpa para continuar este “deixa andar” no que toca à limpeza das florestas, no que toca aos meios ao dispor das forças de intervenção. Não há desculpa. Não há desculpa para a incúria e a incompetência de quem nos governa em especial desde 1996. E aqui não há inocentes. Muito menos na Assembleia da República. Os senhores deputados que andam agora excitados com este incêndio são os mesmos que no passado estiveram calados. E os calados de hoje são os excitados de ontem. É uma falta de vergonha na cara impressionante. Todos eles, sem excepção, estão hoje (como ontem) com as mãos manchadas de cinzas…

Porém, os proprietários dos respectivos terrenos não podem estar agora armados em “virgens ofendidas”. Quantos deles fizeram o seu trabalho, cumpriram as suas obrigações de limpeza dos seus terrenos? Quantos? Talvez os dedos das duas mãos cheguem para essa contabilidade. E não estou a falar apenas de Pedrogão, estou a falar de todo o país.

No meio de tudo isto ainda temos o tal “Sebastião” do jornal espanhol “El Mundo”. A coisa seria anedótica se não fosse o caso de estarmos perante uma tragédia. Aqui em Espanha, onde o jornalismo ideológico é publicamente assumido, temos o “El País” no centro esquerda e o “El Mundo” no lado oposto. Todos os meios de comunicação social em Espanha noticiaram este acontecimento. Alguns com jornalistas no terreno, outros usando os meios disponibilizados pela agência EFE (a Lusa cá do sítio). De repente, o El Mundo surge com umas peças de um tal “Sebastião”. Num jornal onde convivem alegremente alguns que ainda sonham com os “Filipes” – um sonho cada vez mais húmido alimentado por umas supostas sondagens/estudos que afirmam a nossa vontade maioritária em ser espanhóis, demonstrando que os nossos queridos vizinhos não nos conhecem – o tal “Sebastião” teve direito ao seu momento “Abrantes”. Se esta é a actual estratégia da nossa direita, está tudo dito quanto ao seu descontrolo mental e comunicacional: os portugueses valorizam muito o que sobre nós se diz lá fora mas reagem mal quando é um português e ainda por cima em Espanha, a dizer mal de nós independentemente de lhe assistir razão ou não. Andar a “plantar” um qualquer “Sebastião”, num jornal que dá voz e espaço aos saudosos dos “Filipes” para criticar o nosso país é um tiro, de bazuca, nos calcantes… Mas no meio de tanta coisa séria, estar a perder tempo com isto é….mea culpa.

E agora? Agora vamos esperar (sentados???) que os senhores deputados, que os partidos, o governo e demais forças políticas ganhem de vez vergonha e façam o que tem de ser feito. Demora uma década a dar os seus frutos? Seja. Vai colidir com interesses instalados? Temos pena. Os senhores do SIRESP vão todos ser responsabilizados pelas supostas falhas? É apurar tudo, mas mesmo tudo e podem começar por ver a peça da Ana Leal da TVI sobre o tema, ela já vos fez metade do trabalho. Tenham vergonha na cara e façam tudo o que tem de ser feito. Já basta. As vítimas do incêndio de Pedrogão merecem. Os portugueses exigem.

E Sr. Presidente da República, Prof. Marcelo Rebelo de Sousa, os portugueses esperam de si a força para que isto mude, a vigilância para que se faça o que tem de ser feito. Este é, a partir de agora, um dos maiores desafios do seu mandato. Não nos desiluda…

(a fotografia utilizada é de Daniel Rocha do Público)

 

Comments

  1. joão lopes says:

    pp coelho,o incendiário:parece que houve gente que se suicidou,por culpa do estado,ou seja,do actual PR e governo,diz o coelho…e que tal?este tipo,com esta conversa,ainda convence alguem para voltar a ser PM?

  2. Paulo Marques says:

    “E aqui não há inocentes. Muito menos na Assembleia da República.”

    Se é isso que precisa para se auto-justificar perante o seu voto, é consigo. Agora, se vem fazer a propaganda do são todos iguais para manter tudo como está, vá passear, há a quem nunca lhes falte a voz para a mudança, neste assunto como noutros.

  3. Ernesto Martins Vaz Ribeiro says:

    Embora subscreva a maior parte da sua redacção, surpreende-me a ligeireza como “branqueia” a actividade política do Presidente da República e ainda, como o coloca, como diz o padre na missa … “livre do pecado e preservado de toda a perturbação”…
    Mas não era este Sr. presidente que durante anos e anos comentava o que se passava na política e na sociedade portuguesa e que por vias disso, nem precisou de fazer campanha eleitoral?
    E no decurso de tanta nota e tanto floreado, nunca ele falou de incêndios, nem das medidas a preconizar, sobretudo no decurso das grandes crises, como foi a de 2013?
    Ouçam bem o que ele disse, no meio de tantas notas… que ia dando à classe política.
    Não foi este senhor presidente que no dia da catástrofe disse para toda a gente ouvir que… “foi feito tudo o que podia ter sido feito” …?
    Onde está a responsabilidade desta gente?
    Mais selfies, mais sorrisos e abraços? Ou apenas populismo?
    Não tem o Presidente da República responsabilidades pelo normal funcionamento da Assembleia? E acharemos nós que essa mesma Assembleia cumpriu o seu papel de legisladora? Ou vai fazer com o funcionamento da Assembleia o que faz com a Justiça onde ninguém actua, como se estivesse a funcionar? Nada… Assobiam para o lado, como o estão a fazer agora.
    BASTA!!! Esta gente que integra este Arco da Governação, são no mínimo, responsáveis políticos pela situação. TODOS os que nos governaram desde a nossa entrada na CEE, incluindo os que utilizaram o dinheiro que nos chegou da Europa para pagar o abandono dos campos, até aos que andam, há mais de trinta anos a dizer que legislam sobre a matéria e a pregar contra a não ordenamento do território. Esta gente, não pode continuar a governar, por incompetência, insensibilidade e inconsciência.
    A função de um Estado é assegurar a VIDA aos seus habitantes, exactamente o contrário do que, infelizmente, aconteceu.
    E quando as falhas atingem o estado que estamos todos a constatar, onde parecem existir interesses que metem os lavajões de sempre, verificamos que ao Governo deste País apenas interessa o défice e o POVO que se lixe .. excepto para pagar o que a nossa classe política e os amigos delapidaram. Perder a memória, é o pior que nos pode acontecer.

  4. Hélder P. says:

    A haver uma demissão, terá de ser a do líder da oposição, pelo que se veio a noticiar hoje.
    Parece que vale tudo, em política, até tirar olhos e inventar factos alternativos!

  5. Passos Coelho habituou-nos que o disparate é comum. Já nada surpreende, porque se pensarmos que isso nunca será dito, lá está Passos a provar o contrário. É a prova viva que nem sempre entra mosca na boca que diz disparates. Teria essa boca que dar folga ao disparate, para existir espaço para a mosca. Mas é incansável, o disparate e passos andam de braço dado. Volteiam, volteiam um enrolado no outro. E volta e meia lá sai o disparate. Meio Portugal fica chocado, outro meio de meio nem por isso. Já conhece a criatura e sabe, o que pode esperar. Sobra a chusma de Portugal, como quem diz, o grupo laranjinha. Uns que nem para patetas prestam, dizem Amem. Outros percebem a idiotice e correm que nem cães de fila a defender o querido líder. Que como todos os Queridos deixa muito a desejar. E que como os comuns dos Queridos Líder, deixa muito a desejar há inteligência e bom senso. Sobra a outra, os que se imolam na pira fúnebre onde passos coelho se queima e para onde tenta arrastar o país.

  6. A.Silva says:

    “Os senhores deputados que andam agora excitados com este incêndio são os mesmos que no passado estiveram calados.”

    Fernando Moreira de Sá ou é aldrabão ou é ignorante, em qualquer dos casos devia ser corrido, demitir-se, calar-se, deixar de poluir o ambiente!

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