
© Sofia Martins, Praia da Granja, Dezembro de 2006
Sempre que um colega estrangeiro me pergunta o que é a saudade, recordo-me de Sophia e do rapaz da Menina do Mar:
A Menina pôs a sua cabeça dentro do cálice da rosa e respirou longamente.
Depois levantou a cabeça e disse suspirando:
– É um perfume maravilhoso. No mar não há nenhum perfume assim. Mas estou tonta e um bocadinho triste. As coisas da terra são esquisitas. São diferentes das coisas do mar. No mar há monstros e perigos, mas as coisas bonitas são alegres. Na terra há tristeza dentro das coisas bonitas.
– Isso é por causa da saudade – disse o rapaz.
– Mas o que é a saudade? – perguntou a Menina do Mar.
– A saudade é a tristeza que fica em nós quando as coisas de que gostamos se vão embora.
Lembrei-me da saudade, ao ler, no Público de hoje, a crónica de Esteves Cardoso acerca da tradução inglesa (2014) do Vocabulaire Européen des Philosophies, Dictionnaire des intraduisibles (2004), organizado por Barbara Cassin.
A parca presença da língua portuguesa no Vocabulaire, com quatro verbetes, da responsabilidade de Fernando Santoro, foi objecto de umas “breves e despretensiosas nótulas” de Marisa das Neves Henriques (2010) e o próprio Vocabulaire mereceu uns interessantes parágrafos de Mario Perniola (2006: 115-8).
Apesar da parca presença, assinalada por Neves Henriques, pelo menos dois dos quatro verbetes portugueses não passarão certamente despercebidos ao público em geral: ‘ficar’, como indicado por Esteves Cardoso, distinguido por Michael Wood, na Publishers Weekly; ‘saudade’, aquele que me trouxe a este breve texto dominical, apontado pela própria Princeton University Press.
Salvo eventual distracção da minha parte, ‘fairness’ e ‘shallow’ continuam a não constar de qualquer Wörterbuch des Unübersetzbaren / Dictionnaire des Intraduisibles / Dictionary of Unstranslatables / Dicionário dos Intraduzíveis: nem deste, nem de qualquer outro.
Continuação de um óptimo fim-de-semana.
Comentários Recentes